Valor econômico, v. 16, n. 3782, 23/06/2015. Brasil, p. A2

 

Grécia faz concessões e acordo fica mais perto

 

Por Peter Spiegel, Anne-Sylvaine Chassany e Claire Jones | Financial Times, de Bruxelas e Londres

A Grécia manteve viva a esperança de firmar um acordo de última hora com seus credores para evitar um calote. O governo grego apresentou ontem suas primeiras concessões significativas após meses de negociações infrutíferas.

As propostas do governo surgiram tarde demais, e destituídas de detalhamento suficiente, para permitir que se chegasse a um acordo definitivo na reunião de cúpula emergencial de líderes da União Europeia, realizada na noite de ontem. Mas os líderes comemoraram a sua formulação como base para novas conversações, marcadas para esta semana, em torno de um acordo destinado a liberar € 7,2 bilhões em recursos de socorro financeiro à Grécia, desesperadamente necessários.

Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, disse que Atenas concebeu "suas primeiras propostas verdadeiras em muitas semanas", enquanto Jeroen Dijsselbloem, que chefia o grupo de ministros das Finanças da zona do euro, qualificou o gesto da Grécia como "passo positivo".

As bolsas subiram em meio a esperanças de um avanço radical. O principal índice de ações de Atenas fechou com alta de 9%, e os papéis dos bancos gregos dispararam 20%. O índice pan-europeu FTSE Eurofist 300 subiu 2,4%, enquanto os juros implícitos cobrados da Grécia por empréstimos de dez anos caíram 150 pontos-base, para 10,6%. Os rendimentos sobre títulos de dez anos portugueses e espanhóis, que variam em sentido inverso ao dos preços, também diminuíram.

As propostas apresentadas pela Grécia chegaram na manhã de ontem, após Atenas ter enviado, inadvertidamente, a minuta errada na noite de domingo. Dijsselbloem disse que elas chegaram tarde demais para serem plenamente avaliadas pelos três monitores da operação de socorro financeiro, o que impediu que se aventasse a um acordo ainda ontem. Será necessário um novo encontro do eurogrupo para concluir qualquer pacto.

Alguns membros da zona do euro continuam profundamente céticos sobre as chances de um acordo. Segundo três autoridades, os ministros das Finanças mantiveram uma discussão intensa sobre a imposição ou não dos controles de capital na Grécia.

Wolfgang Schäuble, da Alemanha, e Michael Noonan, da Irlanda, pressionaram pela redução da liquidez emergencial para os bancos gregos caso não haja imposição de controles de capital, disse uma das autoridades.

Pessoas que tiveram acesso ao mais recente plano da Grécia disseram que o país propôs novos cortes no gasto do sistema de aposentadorias - o maior motivo de impasse - que alcançarão cerca de 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano e pouco mais de 1% no ano que vem. Mas essas economias ficam aquém da poupança de 1% para este ano e para o ano que vem exigida pelos credores.

Essas economias dependem também do aumento da contribuição dos empregadores, um fator que, juntamente com as pretendidas alterações dos impostos incidentes sobre os lucros das empresas, poderá comprometer o crescimento da economia, segundo temem algumas autoridades ligadas aos credores.

As duas partes, além disso, continuam discordando com relação às alíquotas do imposto sobre valor agregado que incidirão sobre a energia elétrica e os alimentos processados.

Segundo autoridades presentes à reunião do eurogrupo, Christine Lagarde, a presidente do Fundo Monetário Internacional (FMI), mostrou-se especialmente inflexível.

 

Executivos temem que crise freie economia da UE

 

Por Alex Webb, Mathieu Rosemain e Flavia Rotondi | Bloomberg

Executivos da zona do euro, da Siemens à PSA Peugeot Citroën, dizem que uma saída da Grécia do bloco comunitário poderia ameaçar a recuperação econômica justo num momento em que a região vêm recuperando sua força.

Embora o impacto direto uma saída da Grécia do euro (que vem sendo chamada de "Grexit", mistura em inglês de "Grécia" e "saída") possa ser pequeno fora do país, os efeitos secundários poderiam propagar-se para toda a economia da região na forma de queda na confiança e nos investimentos. Essa propagação não seria boa para os lucros, segundo o executivo-chefe da Peugeot, Carlos Tavares.

"Qualquer coisa que possa desestabilizar a frágil economia europeia, é ruim para nossos negócios", disse. "Os europeus vêm reconquistando lentamente certa confiança, o que vem levando a uma melhora nos gastos e, portanto, no mercado automotivo."

Após patinar por anos, a economia da região beneficia-se de uma confluência de circunstâncias favoráveis. O crescimento vem sendo estimulado pela desvalorização do euro, pela queda dos preços do petróleo e pelo programa do Banco Central Europeu (BCE) de compra de € 1,1 trilhão em títulos de dívidas. O PIB da zona do euro cresceu 0,4% no primeiro trimestre.

Depois de terem caído para o menor patamar histórico neste ano, os rendimentos dos títulos soberanos de dez anos da Espanha e Itália subiram mais de 1 ponto percentual, diante do impasse nas negociações na Grécia e da expectativa de alta nos juros nos EUA. Isso se traduz numa elevação do custo de empréstimos para as empresas.

Uma saída da Grécia poderia prejudicar o "humor geral das bolsas e mercados financeiros", disse o executivo-chefe da Salvatore Ferragamo, fabricante de artigos de luxo, Michele Norsa. Ele acrescentou que o mercado grego não tem tamanho suficiente para ter grande impacto nas vendas. Ele disse acreditar que se evitará a saída da Grécia. "Isso não significa que a solução será imediata. Talvez vejamos meses de turbulência", afirmou.

O executivo-chefe da Siemens, Joe Kaeser, disse que a crise grega é uma de suas principais preocupações. "Há receio principalmente pelo aspecto econômico da Europa", disse Kaeser. Sua empresa vende cerca de € 30 bilhões na UE.

A falta de solução para os problemas da Grécia, após cinco anos, é fonte de frustração para o executivo-chefe da empresa de roupas de inverno Moncler, Remo Ruffini. "Temos de achar uma solução o mais breve possível e não continuar com pequenas soluções", disse Ruffini. "Para o nosso setor, [a Grécia] não é um grande mercado, mas poderia haver um forte impacto caso a Grécia saia do euro."

Há sinais de que o impasse na Grécia vem afetando a confiança. Em maio, o índice de confiança dos investidores na Alemanha caiu. O indicador de expectativas de analistas e investidores que tenta prever o desempenho da economia com seis meses de antecedência recuou em junho para o menor patamar desde novembro.

Algumas empresas podem sentir um impacto mais direto de uma saída da Grécia. A Deutsche Telekom poderia se ver forçada a dar baixa contábil no valor de sua participação de 40% na Hellenic, operadora de telefonia da Grécia, segundo a "Bloomberg Intelligence". Em 2014, essa operação gerou cerca de 6,4% do lucro (Ebtida) da maior operadora da Europa.

O investimentos em infraestrutura e na indústria poderia ser o mais afetado pela redução nos gastos decorrente de uma saída da Grécia, diz o analista Volker Stoll, do Landesbank Baden-Wuerttemberg, em Stuttgart.