Valor econômico, v. 16, n. 3772, 09/06/2015. Brasil, p. A2

 

Brics têm ciclo de crescimento comum, aponta estudo da FGV

 

Por Cristian Klein | Do Rio

O que ocorre nos Brics - grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul - afeta mais estes próprios países do que o que acontece nas economias desenvolvidas. A existência de um ciclo comum entre os cinco países é a conclusão que os economistas Roberto Castello Branco e João Victor Issler apresentam hoje na abertura do seminário internacional "Brics: desafios e oportunidades", na Fundação Getulio Vargas (FGV) no Rio.

No trabalho, Castello Branco e Issler analisam a correlação do Produto Interno Bruto (PIB) e da produção industrial dos integrantes do Brics. Desde 2000, as taxas de crescimento do PIB trimestral destes países apresentam similaridade. Quando alguma economia cresce ou se retrai, a outra vai na mesma direção, ainda que em patamares diferentes. Quanto à produção industrial, a correlação entre Brasil e Rússia tem coeficiente 0,604, e com a África do Sul é de 0,625. "Um traço comum entre eles é que são três produtores de commodities", aponta Issler.

 

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China e Índia, por sua vez, são grandes consumidores de commodities, cuja queda de demanda impacta os outros três países. A sincronia dos Brics, afirmam os pesquisadores, é um movimento que até agora era desconhecido, mas vai ao encontro do trabalho do indiano Eswar Prasad, da Universidade de Cornell e pesquisador associado do centro de estudos FGV Crescimento & Desenvolvimento, organizador do seminário. Prasad fará uma apresentação sobre a Índia amanhã e é autor de um livro no qual identifica as similaridades entre as economias desenvolvidas e entre as emergentes, o que cria dois grupos bem distintos, apesar da globalização.

Entre os Brics, é justamente a Índia, país natal de Prasad, que apresenta o comportamento mais aleatório. Castello Branco e Issler atribuem o desvio ao peso que a agricultura ainda tem na economia indiana - 17% do PIB, enquanto no Brasil é de 5%.

Apesar das semelhanças no ciclo de crescimento, os dois pesquisadores destacam grandes diferenças de políticas públicas que vêm sendo promovidas pelos Brics, que representam 28% do PIB e 42% da população mundiais.

China e Índia puseram em andamento um extenso programa de reformas. "Nos outros países, não há nada. No Brasil, só temos ajuste fiscal", diz Castello Branco, ex-executivo da Vale. O Brasil, lembra, já executou a passagem de um país rural para o atual, urbano, o que ainda está sendo feito por China e Índia. "A diferença é que eles aprenderam com a gente, com nossos erros, e estão investindo em infraestrutura, educação e habitação. Na China, por exemplo, não há favelização como aqui", afirma.

O diretor do FGV Crescimento & Desenvolvimento cita reformas chinesas que buscam desburocratizar a economia, tornar menos rígidas as regras de migração do campo para as zonas urbanas e equacionar as dívidas das estatais e das províncias, sem falar na tentativa de se tornar o primeiro país emergente a ter uma moeda global. A Índia tem feito investimentos em infraestrutura e em um sistema de biometria que já identificou 600 milhões de pessoas pelas íris e impressões digitais.

O seminário contará, entre outros pesquisadores, com Jean-François Brun (que falará sobre África do Sul), Yang Yao (China) e Octavio Amorim, sobre as perspectivas geopolíticas do bloco. Amanhã, o presidente da Vale, Murilo Ferreira, tratará das relações econômicas entre China e América Latina.