TCU: relator condenará pedaladas no parecer sobre contas de Dilma

 

As pedaladas fiscais vão constar como uma irregularidade no relatório do Tribunal de Contas da União sobre as contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff. O voto está sendo preparado pelo ministro relator, Augusto Nardes, e vai a julgamento no TCU na próxima quarta- feira. Nardes confirmará a interpretação de que as pedaladas infringiram a Lei de Responsabilidade Fiscal ( LRF) — em abril, os ministros do tribunal concluíram, em votação, que a manobra desrespeitou a LRF. Eles convocaram 17 autoridades econômicas com atuação nos últimos dois anos para dar explicações.

GIVALDO BARBOSA/ 13- 8- 2014Nardes. Ministro não concorda com comparação com práticas do TCU

Dilma não foi mencionada na votação de abril, mas o relatório sobre suas contas em 2014 deve trazer o registro das pedaladas. Nardes ainda não se sabe se a manobra fiscal fará com que ele peça a rejeição das contas em seu relatório, ou que apenas proponha uma ressalva em caso de aprovação das contas de Dilma.

EMPRÉSTIMOS IRREGULARES

A decisão final do TCU é enviada ao Congresso, a quem cabe fazer a análise definitiva sobre as contas da presidente. Uma eventual sugestão de rejeição seria inédita na História do tribunal. A prática comum é a aprovação com ressalvas.

As pedaladas consistiram em segurar repasses do Tesouro Nacional aos bancos oficiais como forma de melhorar artificialmente as contas públicas, em 2013 e em 2014. A Caixa Econômica Federal, por exemplo, teve de assumir pagamentos do Bolsa Família e do seguro- desemprego, diante do represamento dos recursos da União.

No julgamento em plenário em abril, os ministros do TCU concordaram, na discussão de mérito, que as operações se enquadram como empréstimos, com infração à LRF.

A uma semana do julgamento das contas de 2014, ministros do TCU dizem estar convencidos de que as pedaladas ocorreram, e rejeitam o principal argumento apresentado até agora pelo advogado- geral da União, Luís Inácio Adams: o de que essa prática é comum em contratos de prestação de serviço em diferentes órgãos, inclusive no próprio TCU.

NARDES REJEITA COMPARAÇÃO

O próprio ministro Nardes, em conversas com colegas do tribunal, vem manifestando o entendimento de que não é possível comparar um atraso de repasses do governo a bancos públicos ao longo de dois anos com uma demora de repasses por poucos dias.

Além disso, ministros entendem que a posição do tribunal sobre as pedaladas já é definitiva, diferentemente do que argumenta Adams, para quem ainda cabe uma mudança de entendimento a partir das explicações dos citados. A AdvocaciaGeral da União vem agindo para evitar a rejeição das contas por conta das pedaladas, o que agravaria a situação política de Dilma. No fim de maio, líderes de oposição ingressaram com ação na ProcuradoriaGeral da República ( PGR) contra a presidente por conta das pedaladas. Adams fez contato com o gabinete de Nardes esta semana.

Ao GLOBO, Adams confirmou ao GLOBO que, em manifestação entregue ao TCU para contestar que tenham ocorrido as pedaladas, detalhou o caso de um contrato entre o tribunal e uma prestadora de serviço em que teria havido atraso no repasse de recursos públicos. O ministro disse ser comum nesses contratos — tanto no Executivo quanto no Legislativo e no próprio TCU — a existência de cláusula estabelecendo que, diante da ausência de repasse, a empresa contratada faz o pagamento, para que o serviço continue a ser prestado. Depois, o órgão público faz uma compensação financeira à contratada.

— A relação com a Caixa também é de prestação de serviço. Os pagamentos sempre foram tratados como prestação de serviço, isso aconteceu sempre. Se algo está errado, então que todos mudem, que se impeça essa cláusula e que se proíbam pagamentos a descoberto. A prática é antiga, da época da inflação alta — disse Adams, que confirmou a intenção de procurar Nardes para tentar evitar que as pedaladas motivem a rejeição das contas da presidente.

A ofensiva de Adams de apontar pedaladas no TCU irritou integrantes do tribunal. Reservadamente, ministros comentam que a comparação é desproporcional, pois a prática do Tesouro Nacional foi sistemática, bem diferente de casos de pagamentos a descoberto.