Valor econômico, v. 16, n. 3773, 10/06/2015. Opinião, p. A12

 

Trajetória da taxa de juros faz estragos na dívida pública

 

A nova elevação da taxa básica de juros (Selic) de 13,25% para 13,75% ao ano, anunciada na semana passada pelo Comitê de Política Monetária (Copom), reavivou as críticas à política monetária. O receio é que a elevação dos juros só tenha algum efeito positivo sobre a inflação após um longo e doloroso período de retração da atividade, marcado pela recessão e aumento do desemprego, e potencialize o impacto do ajuste na economia, com grave efeito colateral sobre a dívida pública e, portanto, sobre o próprio ajuste fiscal. Foi a sexta elevação da Selic desde outubro, mas a nova trajetória começou há dois anos, em abril de 2013, quando a taxa estava em 7,25%.

Os dados mais recentes da dívida mobiliária federal interna mostram que atingiu R$ 2,333 trilhões em abril, crescimento de 19% em 12 meses e 26% em dois anos, desde abril de 2013. O custo acumulado em 12 meses subiu 0,10 ponto percentual, para 12,42% ao ano. Antes do movimento de elevação da Selic, o custo médio era um pouco menor, de 11,42%.

Não escaparam da tendência de alta nem os papéis corrigidos pela inflação medida pelo IPCA, as NTN-Bs, cujo custo médio chegou a 14,28% em abril e o das novas colocações a 14,66%, o maior da série histórica iniciada em dezembro de 2010. No fim de 2014, as NTN-Bs pagavam mais de um ponto percentual a menos, 13,27%. A taxa rompeu o patamar de 14% em março, em parte por causa da resistência da inflação, mas também pela exigência de prêmio de risco cada vez mais alto pelos investidores, dadas as incertezas que vislumbram no panorama econômico.

Oferecendo taxas tão atraentes, não era de se estranhar a crescente participação do capital estrangeiro entre os investidores de títulos públicos brasileiros, com 20,5% do estoque total, logo após os bancos e à frente dos fundos de investimento.

O crescente volume de operações compromissadas é outro sinal de anormalidade. Essas operações aumentaram até compreensivelmente no período eleitoral. Mas não dão sinais de recuo e rondam persistentemente a casa do R$ 1 trilhão, espelhando a significativa parcela de capital ainda arisco, que prefere se refugiar no curtíssimo prazo.

O aperto monetário tem impacto direto na elevação dos gastos com juros, que atingiram R$ 311 bilhões em 2014, o equivalente a 6,1% do PIB, e podem chegar a R$ 400 bilhões neste ano. Em artigo publicado ontem no Valor, o economista Yoshiaki Nakano estimou que a elevação de cada ponto percentual na Selic aumenta em pelo menos R$ 30 bilhões os custos da dívida pública, mais de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Nas suas contas, as recentes elevações da taxa têm impacto maior do que o ajuste fiscal de 1,2% do PIB prometido pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Já o governo confia que esse superávit, equivalente a R$ 66 bilhões, estabilize a dívida bruta. Espera ainda o aumento do superávit para 2% no próximo ano de modo a produzir uma pequena queda na dívida, que estava em 61,7% do PIB em abril. Nem todos compartilham desse otimismo. Recentemente, a agência Moody's pôs em dúvida a concretização desses superávits e chamou a atenção para o fato de que a elevação da Selic fará com que os gastos com juros sigam elevados, em um momento em que a economia fraca reduz as receitas fiscais. Para a agência, a dívida bruta pode chegar a 66% do PIB no próximo ano e manter-se acima de 60% até o fim do mandato da presidente Dilma Rousseff.

Para complicar, as perspectivas de aumento dos juros não pararam no ajuste da semana passada. Pesquisa feita pelo Valor junto a 35 economistas do mercado financeiro (1/6) indica que a maioria prevê que a Selic vai chegar a 14% no fim do ciclo do aperto monetário, atingindo o maior patamar desde agosto de 2006. Talvez pior do que isso seja a expectativa de que a taxa básica continuará nesse patamar ao longo de 2016, postergando a recuperação da economia e engordando a conta de juros.

Apesar da queda de 0,2% do PIB já registrada no primeiro trimestre e da expectativa de mais contração no segundo trimestre, especialistas ouvidos pelo Valor constatam, até agora, pouco impacto do aperto monetário na inflação, puxada pelo aumento dos preços causados pela elevação do câmbio e pela correção dos preços da energia e dos combustíveis. Para eles, mesmo com a atividade econômica fraca e com o aumento do desemprego, vai levar tempo para a inflação convergir para o centro da meta, como quer o Banco Central.