PMDB prepara o desembarque

04/07/2015 
PAULO DE TARSO LYRA E JULIA CHAIB
 
Amparada na frágil relação entre PT, PMDB e governo, a permanência do vice-presidente da República, Michel Temer, na articulação política do governo está por um fio, e começa a dar sinais de que o rompimento é iminente. Os peemedebistas elevaram o tom e ecoaram as palavras do presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de que Temer deve deixar o cargo de coordenador da relação política do Planalto com o Congresso. Apesar do afago que partiu da Casa Civil, o PT submergiu. Ainda assim, considera um desastre se o vice-presidente, de fato, abandonar a função estratégica de tentar conter os insatisfeitos da base. “Será um carimbo de que o nosso governo naufragou de vez”, resumiu um cacique petista, sob condição de anonimato. Independentemente da movimentação de Temer, o partido tem dito que deixará o governo após as eleições municipais do próximo ano, com a possibilidade de lançar candidatura presidencial própria em 2018.

A nota oficial emitida pelo chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, na quinta-feira à tarde, quando elogiou o trabalho de Temer, foi insuficiente para diminuir a fogueira de vaidades que arde na Esplanada. “O PMDB não vai permitir que o vice-presidente fique sujeito aos constrangimentos impostos pelo PT. Se alguma coisa funcionou nos últimos meses nessa relação entre o Planalto e o Congresso, isso se deve ao Temer”, afirmou o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ).
Para Picciani, a base aliada no Congresso está novamente fragmentada. O peemedebista fluminense concorda que existe um processo de sabotagem ao PMDB imposto pelos petistas próximos à presidente Dilma Rousseff. “O governo terá muitas dificuldades nas próximas votações no Congresso”, previu o líder da legenda na Câmara. Um dos entraves é a análise dos vetos presidenciais, marcada para 14 de julho, como a rejeição à nova fórmula do fator previdenciário. “Com esse clima ruim, fica difícil prever os ânimos dos partidos da base aliada”, completou Picciani.

O cacique do PT ouvido pela reportagem está tenso com a possibilidade de os peemedebistas cumprirem a ameaça de sair da articulação política do governo. “Se não for agora, será mais para a frente. Eles vão manter essa crise permanente como uma estratégia: o PMDB está dando um prazo para nós”, afirmou o senador. Ele reconhece que Temer tem sido essencial para os êxitos do governo, sobretudo nas votações do ajuste fiscal. “Ele é um homem do diálogo, do bom senso, algo que falta em muitas lideranças petistas. E também nas peemedebistas”, provocou.

Mas, para esse petista, a tática do PMDB é bem mais elaborada. O temor do impeachment que ronda o Palácio do Planalto estaria atiçando os movimentos de descolamento do governo, defendido por Eduardo Cunha e seus aliados. “Eles desembarcam e ficam livres para assumir o governo mais à frente, sem constrangimentos”, declarou o senador.

Alvo preferencial
Neste momento, no entanto, as metralhadoras do PMDB se voltam, sobretudo, contra o chefe da Casa Civil. “Ele (Mercadante) tem embarreirado todos os acordos que o Michel Temer e o Eliseu Padilha (ministro da Secretaria de Aviação Civil) têm fechado com os demais partidos da base”, reclama o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA). Padilha demonstrou um pouco mais de otimismo e assegurou que, pelo menos do ponto de vista dos cargos, a situação está praticamente equalizada. “Dos grandes cargos do segundo escalão, falta pouca coisa para ser definida. Menos de 100. Nos estados, temos 12 ou 13 fechados, inclusive em Minas Gerais. Pendentes, de fato, estão São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul”, disse o ministro ao Correio.

Cauteloso, Padilha não quis, como seus correligionários, comprar uma briga com o PT. “O PT já fez concessões em muitos dos estados que estão fechados. O PT sabe que nós precisamos de painel (referência aos votos necessários expostos no painel eletrônico para aprovar matérias de interesse do governo, especialmente o ajuste fiscal). Se ele não tivesse feito concessões, não teríamos acordo até hoje”, ponderou.

O ministro, no entanto, não assumiu para si a maior derrota do governo na semana que passou: a aprovação, no Senado, do reajuste de quase 60% para os servidores do Judiciário, projetando um rombo de quase R$ 26 bilhões, em quatro anos, para os cofres públicos. “Eu devo dizer que essa afirmação (falha na articulação) é risível, porque numa votação em que houve 62 (votos favoráveis) a 0 (votos contrários), não tem cochilo de articulação política. Houve, de parte dos senadores, uma aquiescência, uma concordância em dar uma satisfação maior aos servidores, um pacto para aprovar. Não tem articulação que resista à unanimidade”, disse Padilha, incendiando o debate.

Um aliado petista do Planalto que estava no plenário do Senado e foi atropelado pela pressão dos servidores do Judiciário também se eximiu de responsabilidade, mostrando que, de fato, a parceria PT-PMDB na articulação passa por um momento de descompasso. Para esse senador, o placar de 62 a 0 foi uma ficção, já que, como a maioria dos líderes partidários encaminhou voto favorável à aprovação do reajuste, o único trabalho feito foi contar, como voto sim, o total de presentes no plenário. “Foi nítido que houve um movimento planejado pela direção da Casa, em tempos de Operação Lava-Jato, para prestigiar os servidores do Judiciário”, reclamou o petista.

“O PMDB não vai permitir que o vice-presidente fique sujeito aos constrangimentos impostos pelo PT. Se alguma coisa funcionou nos últimos meses nessa relação entre o Planalto e o Congresso, isso se deve ao Temer”
Leonardo Picciani, líder do PMDB na Câmara.