O aplicativo da transparência

25/06/2015
MATHEUS TEIXEIRA
 
Foi o principal anúncio dos seis primeiros meses da gestão do governador Rodrigo Rollemberg (PSB). Com pompa e circunstância, o GDF lançou o aplicativo Siga Brasília, que visa dar mais transparência às atividades do Executivo local. Nele, estão detalhados os gastos do governo, os salários dos servidores distritais e as escalas de trabalho dos profissionais de todas unidades públicas de saúde do Distrito Federal (veja quadro). Apesar de viver um momento político delicado, criticado até por aliados pelo vazamento de gravações de reuniões com parlamentares em seu gabinete, o socialista não parecia preocupado com a relação com a Câmara Legislativa.

O ritual comum de todas coletivas do GDF desde o início do ano não foi repetido. Diferentemente das demais entrevistas, tudo foi pensado para Rollemberg ser a estrela da festa. Ele não estava sentado ao lado de outros secretários, como de costume. Sozinho no palco do Cine Brasília, onde ocorreu a solenidade, caminhou de um lado para o outro enquanto apresentava com desenvoltura a nova ferramenta. Mostrou detalhadamente o funcionamento do aplicativo e se mostrou otimista. “Na campanha, prometemos abrir o Sistema Integrado de Gestão Governamental (Siggo) para toda população. Hoje, realizamos mais uma promessa eleitoral. Todos os dados do Siggo estão no Siga Brasília. O cidadão poderá acompanhar todos os gastos do governo, sem exceção”, afirmou.

Em uma das opções da ferramenta, aparece os gastos de cada órgão do GDF. Este ano, por exemplo, as administrações regionais desembolsaram R$ 63 milhões. O tamanho da arrecadação do GDF também está no aplicativo. No ano passado, o governo local recolheu, ao todo, R$ 19,3 bilhões: R$ 12,6 bilhões em arrecadação de impostos, R$ 171 milhões em cobrança de taxas, R$ 161 milhões com multas de trânsito e R$ 6,6 bilhões enquadrados como “outras receitas” — aí estão incluídas transferências voluntárias do governo federal, como o Fundo de Participação dos Municípios.

Este ano, em menos de um semestre, de acordo com a ferramenta, o DF já teve acesso a R$ 13 bilhões. Rollemberg explicou o motivo do crescimento da receita em relação ao ano passado. Segundo ele, a partir de 2015 os recursos do Fundo Constitucional do DF que servem para pagar servidores da saúde e da educação passaram a ser administrados pelo governo local. É possível encontrar a remuneração de todos os funcionários públicos do GDF na ferramenta digital. Para comprovar a eficiência do aplicativo, Rollemberg mostrou o próprio salário: ele recebe R$ 23 mil mensais. Com desconto de impostos, entra na conta do governador R$ 18 mil todos os meses.

Fácil entendimento
A opção do aplicativo que pode dar maior repercussão é a que mostra as escalas dos profissionais da saúde pública em todos hospitais, postos de saúde e UPAs do DF. Na fila de espera nas unidades, por exemplo, o cidadão saberá quantos e quais médicos estão de plantão. O aplicativo foi idealizado pela Controladoria-Geral do DF. Desde o início do governo, a equipe do órgão trabalha no projeto. A principal dificuldade era passar os dados do orçamento do DF de forma que a população conseguisse entendê-lo. O desafio era traduzir de maneira fácil a burocracia de pagamentos, ordens bancárias, empenhos e outros mecanismos de gestão do GDF.

O controlador-geral, Djacyr Arruda, destacou que Brasília é a primeira unidade da Federação a fazer um aplicativo de acompanhamento governamental. “Nenhum outro estado escancarou seus gastos de maneira tão clara. Com certeza, estamos na vanguarda”, afirmou. Rollemberg ressaltou que o DF está em terceiro no ranking nacional de transparência, mas afirmou que quer mais. “Vamos chegar à primeira colocação. Tenho certeza que, com muito trabalho, vamos conseguir.”

A cerimônia foi prestigiada por vários integrantes do primeiro escalão do governo e pelo deputado distrital Joe Valle (PDT). O companheiro de partido de Rollemberg, o senador João Capibeirbe (PSB-AP), autor da Lei da Transparência, também esteve presente.
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Um canal com a sociedade

Para representantes da sociedade, o aplicativo será uma forma de dissipar a neblina que existe nas contas do governo. De acordo com o presidente da Federação do Comércio do DF (Fecomércio), Adelmir Santana, o aplicativo faz parte de um projeto de transparência que beneficiará, também, o empresariado da capital. "É um aplicativo importante. A nós, no entanto, não interessa saber a escala do médico, quanto ganha um determinado servidor, mas, sim, os grandes números. Por exemplo, até hoje, não tivemos nenhuma informação clara sobre a situação financeira do DF. A oposição de ontem, governo de hoje, disse que tinha um valor, mas os contribuintes até hoje não sabem, de fato, como ficou o orçamento com a transferência de poder", comentou Adelmir.

Até ontem, um dos principais meios de o governo manter os interessados nas contas públicas e no funcionamento do Estado informados era o Portal da Transparência - uma ferramenta de participação da sociedade no controle das ações do governo. No entanto, não tão completa e eficiente como promete o aplicativo. No ano passado, inclusive, o site foi avaliado pela ONG Contas Abertas, que debate sobre a qualidade e a legalidade dos gastos públicos. A nota dada ao portal foi menor que 7, numa avaliação de 0 a 10. "Havia muito a melhorar. Não tinha, por exemplo, um glossário interativo, o que prejudica o entendimento da população, já que o vocabulário orçamentário é complexo", explicou o presidente da Contas Abertas, Gil Castelo Branco.

Para ele, o aplicativo não substitui o portal, mas é uma iniciativa mais moderna do governo para manter a população informada e conseguir uma interação mais efetiva. Gil lembra que em estados como Paraná e São Paulo, há aplicativos semelhantes que informam até sobre podas de árvore e operações tapa- buraco. "É um sistema que tem duas vias. De um lado, o Estado prestando as informações e, do outro, o cidadão participando da administração. Em Curitiba, conseguiram monitorar uma empresa e ver que ela não estava fazendo o serviço para qual foi contratada. Denunciaram, e a prefeitura foi atrás. Então, pode dar certo, na medida em que a população se torna um fiscal do governo.