Encontro também discutiu divisão de receitas e ações integradas na segurança e contra violência no trânsito

AILTON DE FREITASJuntos. Dilma, ministros e governadores reunidos no Palácio da Alvorada: consenso sobre medidas que preservam as contas públicas e ajudem o país a retomar crescimento econômico, mas discordâncias sobre questões políticas

A quatro dias do fim do recesso do Congresso, a presidente Dilma conseguiu ontem apoio de todos os estados contra o aumento de gastos públicos. Com a expectativa de votação de projetos que elevam despesas, o Planalto obteve de 26 governadores e um vice- governador o compromisso de mobilizar as bancadas estaduais para aprovar o ajuste fiscal e derrubar a chamada pauta- bomba. Três governadores chegaram a propor a defesa do mandato de Dilma, mas não conseguiram dar prosseguimento ao debate. Geraldo Alckmin ( PSDB), de São Paulo, afirmou que o tema não foi discutido e que o que ele defende é “investigação e investigação”.

- BRASÍLIA-

Após cerca de quatro horas de reunião, a presidente Dilma Rousseff conseguiu fechar ontem um pacto pela contenção de gastos públicos. Os governadores presentes no Palácio da Alvorada, inclusive os de oposição, se comprometeram a trabalhar junto às bancadas de seus estados no Congresso Nacional para que sejam rejeitadas propostas que aumentem as despesas do governo federal, e também dos estaduais. Eles concordaram em preservar essa parte do ajuste fiscal, como forma de retomar o crescimento econômico o quanto antes.

Nos últimos meses, o Congresso aprovou uma série de medidas com impactos bilionários nas contas públicas, como o reajuste para os servidores do Judiciário e o das aposentadorias acima da inflação.

— ( Promoveremos) um combate à pautabomba, que incluiu a derrubada do fator previdenciário; a correção da Previdência ( acima da inflação), que é grave para os estados; o aumento do Judiciário. Isso contamina o custo do setor público no país, que já é excessivo — afirmou o governador Raimundo Colombo ( PSD- SC).

— Vamos pedir ( aos parlamentares) que se tenha responsabilidade. O PSDB quer voltar a ser governo, vai voltar a ser, e precisa pensar nisso — completou o governador Marconi Perillo ( PSDB- GO).

ALCKMIN DIZ QUE É PRECISO INVESTIGAR

Apesar de obter apoio no combate à crise econômica, Dilma não conseguiu o aval de todos pela manutenção de seu mandato. Na parte do encontro fechado à imprensa, sem que a presidente pedisse ou abordasse o tema, os governadores do Maranhão, Flávio Dino ( PCdoB), de Sergipe, Jakson Barreto ( PMDB), e da Paraíba, Ricardo Coutinho ( PSB) defenderam a preservação do mandato de Dilma, mas os demais não deram seguimento a esse debate. No fim do encontro, Dino e Coutinho voltaram a citar o assunto publicamente. No entanto, o principal governador de oposição, Geraldo Alckmin ( PSDB), de São Paulo, expôs a falta de unidade.

— Isso ( mandato da presidente) não foi tema da reunião nem está em discussão. Não há nenhuma discussão em relação a isso. Nós defendemos o quê? Investigação, investigação, investigação e cumprir a Constituição. Nosso dever é cumprir a Constituição — disse Alckmin.

Poucos minutos antes, ao lado de Alckmin, Dino, dissera que os governadores trataram da crise política:

— Uma síntese do que foi tratado por nós lá, a preocupação com a agenda política. A defesa clara e inequívoca da estabilidade institucional, da ordem democrática, do estado de direito e contra qualquer tipo de interrupção das regras constitucionais vigentes. Portanto, a manutenção do mandato legítimo da presidente Dilma Rousseff que foi eleita para cumpri- lo — afirmou o governador do Maranhão, que falou em nome dos governadores da Amazônia Legal.

Durante o encontro, Dilma fez um apelo pela cooperação dos 26 governadores presentes na manutenção da estabilidade econômica. Ela recebeu a pauta de reivindicações dos governadores e pediu que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tentasse resolvê- las. A presidente tentou convencer os governadores de que era preciso que todos agissem para que o país saia da crise. Segundo um dos presentes, a palavra mais repetida por Dilma foi cooperação. No final, ela repetiu uma frase dita por Alckmin, sobre a necessidade de se recorrer à política para que a crise econômica seja superada.

— Como disse o governador Alckmin, a política depende da economia e a economia também depende da política. Por isso, temos que atuar em cooperação para sair dessa crise. A instabilidade econômica gera a instabilidade política — apelou Dilma.

A presidente, porém, evitou pedir diretamente apoio contra impeachment ou à votação de suas contas no Congresso. No entanto, segundo relato de governadores, Dilma fez referência ao trauma que seria uma ruptura institucional.

— Ninguém ganha com rupturas institucionais. Vamos cooperar e sair juntos disso — apelou Dilma.

Uma das principais reivindicações dos governadores — um acordo sobre a reforma do ICMS —, entretanto, terminou em impasse. Os governadores queriam a garantia de que os dois fundos, de compensação e desenvolvimento ( previstos para compensar perdas dos estados) sejam incluídos na Constituição, mas não tiveram essa garantia.

A presidente, porém, atendeu a outro pleito dos governadores. Ela determinou publicamente que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, dê aval aos empréstimos do BNDES para que os estados invistam em logística. O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão ( PMDB), considerou a reunião proveitosa. Ele citou dois avanços para os estados: promessa de liberação de crédito e a unificação das alíquotas do ICMS, com a criação de um fundo de compensação.

— Achei a reunião boa. Ela pediu que os governadores sejam solidários com o superávit primário, porque ela vai abrir crédito para os governadores, principalmente para os que já estavam com operação contratada. Todos os governadores estão preocupados com o aumento do Judiciário, da Previdência. Impacta diretamente no caixa de todo mundo.

DILMA DIZ QUE CENÁRIO NA CAMPANHA ERA OUTRO

Ao abrir a reunião, a presidente se defendeu das críticas: disse que foi eleita para cumprir suas promessas em quatro anos e que o país passa por um período de transição, mas traçou um cenário de retomada do crescimento. Afirmou que as promessas de campanha foram feitas em outro cenário econômico e que fatores como a crise internacional, a queda nos preços das commodities e a desvalorização do real frente ao dólar ajudaram a aumentar a inflação, levaram à situação atual:

— Todos temos o dever em relação à democracia e ao voto democrático popular. Nessas eleições, assumimos compromissos com o país e perante os nossos eleitores, e esses compromissos expressos no plano de governo dão um quadro que temos de desenvolver, com ações, iniciativas, projetos, enfim, realizando esses compromissos no horizonte e ao longo do nosso período de governo de quatro anos. Portanto, até 2018 — afirmou.

Segundo Dilma, a expectativa é que a inflação comece a cair a partir de 2016. Para ela, a redução de inflação e o equilíbrio fiscal criarão as bases para um novo ciclo positivo na economia. ( Luiza Damé, Eduardo Bresciani, Eliane Oliveira, Fernanda Krakovics, Maria Lima e Mônica Tavares)

 

A busca da ‘ governabilidade
econômica’

Oapelo de Dilma por um apoio expressivo contra um Congresso beligerante encontrou eco entre governadores, mas cientistas políticos destacam que as necessidades estaduais contaram a favor da decisão. Há um temor coletivo de que a “irresponsabilidade” da Câmara crie problemas locais. Na avaliação de Oscar Vilhena ( FGVSP), no entanto, os governadores se preocupam com a “governabilidade econômica” do país.

— É importantíssimo estabilizar o país. Mas os governadores apoiam os vetos por saberem que a irresponsabilidade da Câmara pode inviabilizar os governos. A ação, então, não é só de apoio à presidente, ainda que ela seja beneficiada. A questão é que se a União se torna inviável, se um efeito cascata chega aos estados e se a reforma econômica não avança, eles sofrem a consequência. É o risco à governabilidade econômica que pode fragilizar o Eduardo Cunha ( presidente da Câmara) — disse Oscar Vilhena, da FGV- SP.

Para Ricardo Ismael, da PUC- Rio, o encontro foi um “gesto importante do ponto de vista das relações federativas”, mas os governadores não terão peso para influenciar a pauta no Congresso. Segundo ele, Cunha se enfraquece se a Lava- Jato avançar:

— Temem um efeito cascata, mas o isolamento de Cunha se dará se a Lava- Jato avançar e ele for indiciado, o instinto de sobrevivência do PMDB deve prevalecer.