Delações em série

 

Nomes de cinco testemunhas são mantidos em sigilo pela Justiça no Paraná

A Lava- Jato formalizou seis novos acordos de delação premiada nos últimos dias, cinco deles mantidos em sigilo. O consultor Mário Goes, intermediário de pagamento de propinas da corrupção na Petrobras, foi o primeiro desse novo grupo a ser ouvido. Ele confessou que repassava dinheiro de empreiteiras para ex- diretores da estatal por meio de contas na Suíça. O PT seria beneficiário do esquema. Ontem, o juiz Sérgio Moro aceitou a denúncia do Ministério Público contra o presidente da Andrade Gutierrez, Otávio Marques de Azevedo, e mais 12 acusados pelos crimes de corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro. - SÃO PAULO- A Operação Lava- Jato ganhou seis novos delatores nos últimos dias, aumentando para 22 o número de investigados que colaboram com a Justiça em troca de redução de pena. O primeiro do grupo a falar foi o operador Mário Goes, que prestou depoimento anteontem à Polícia Federal e começou a revelar detalhes de sua atuação como intermediário do pagamento de propinas no esquema de corrupção investigado na Petrobras. Ele afirmou que repassava dinheiro de empreiteiras para funcionários da estatal por meio de contas na Suíça e que o PT era beneficiário da divisão da propina na diretoria de Serviços da estatal. Segundo Goes, o ex- gerente executivo de Engenharia e Serviços Pedro Barusco pediu para que ele destruísse documentos que citariam a existência de contas no exterior usadas no esquema.

Os nomes dos outros cinco delatores são mantidos em sigilo pelo Ministério Público Federal ( MPF), mas a expectativa é que eles forneçam informações sobre o envolvimento de outros agentes públicos no esquema e a relação de mais contratos em que ocorria o pagamento de propina.

Em seu primeiro depoimento, Goes, dono da Riomarine, disse que fez repasses a Barusco por meio de suas contas Maranelle e Phad, no Banco Safra da Suíça. O dinheiro era desviado de contratos da Petrobras com empreiteiras como a Andrade Gutierrez. As comissões pagas a Barusco por Mário Goes eram divididas com o ex- diretor de Serviços da estatal Renato Duque e com o PT, segundo revelou Goes à força- tarefa da Lava- Jato.

— Barusco me disse que Duque gostava mais de jantares, cabendo a ele resolver as coisas ( divisão de propinas). Ele disse isso na presença do ( empresário) Ricardo Pessoa, da UTC. E me tranquilizou dizendo que haveria outras pessoas envolvidas no esquema e que o Partido dos Trabalhadores estaria dando algum tipo de suporte a essa atividade — disse Mário Goes.

O dinheiro que entrava na conta Maranelle, segundo Goes, era dividido em seis ou sete partes. Quando eram seis, duas iam para Duque, duas para Barusco e uma parte para ele próprio. A sexta parte era repartida no percentual de 60% para Barusco e 40% para Goes. Quando havia uma sétima parte, disse que não sabia a quem se destinava. Quanto ao dinheiro para o PT, responsável pela indicação de Duque para a diretoria da Petrobras, Goes disse que “Barusco dizia que era outra parte” e que “preferia nem saber do assunto”.

A relação de Barusco e Goes começou no início dos anos 2000, quando o ex- gerente trabalhava na área de Produção da Petrobras. Ele procurou o operador para propor a divisão de propinas, mas o primeiro negócio não deu certo. A parceria se efetivou nos anos de 2003 e 2004, quando Barusco passou a atuar como gerente executivo da diretoria de Serviços, dirigida por Duque.

DETALHES DA OPERAÇÃO NA SUÍÇA

Na delação, Goes detalhou informações sobre operações na Suíça em que intermediava pagamentos a executivos da Petrobras para disfarçar propinas de empreiteiras. A primeira feita por ele para Barusco foi ligada ao Consórcio PRA- 1, contratado pela Petrobras e integrado por Odebrecht e UTC. Cerca de R$ 1,4 milhão desse consórcio foi repassado para a Riomarine, de Mário Goes, que transferiu o dinheiro para a conta Maranelle, que o operador controlava na Suíça. Dessa conta, os valores iam ara Barusco e Duque, contou.

A conta Maranelle foi aberta no Banco Safra da Suíça por Denise Kos, uma brasileira que morava naquele país europeu. Denise controlava os depósitos na conta e destruía os extratos. A conta, de acordo com Goes, recebeu recursos da Andrade Gutierrez, por meio da Zagope, uma das empresas mantidas pela construtora em Portugal.

A Zagope enviou US$ 6,4 milhões para outra empresa offshore controlada por Goes, a Phad Corporation. O operador confirmou que “os serviços no contrato com a Zagope eram simulados”. Esse montante também foi repassado para Barusco. A investigação da Lava- Jato mostrou que o ex- gerente da Petrobras recebeu da Andrade Gutierrez um total de US$ 9,9 milhões de dólares, 2,6 milhões de francos suíços e 2,1 milhões de euros. As operações também envolviam outros operadores, como Fernando Soares, o Baiano, e Alberto Youssef.

Também em delação, Mário Goes disse que Pedro Barusco fazia um controle minucioso das propinas que deveria receber das obras que gerenciava. Os documentos foram destruídos no ano passado, quando começaram as investigações de contratos de navios da holandesa SBM com a Petrobras na Europa. Segundo o delator, Barusco “estava preocupado com o fato de a investigação sobre a SBM ampliar- se para o Brasil e vir a atingir outras operações realizadas por ele.”

Goes afirmou aos investigadores que teve seu primeiro contato com executivos da Andrade Gutierrez em 2006, quando Barusco pediu para cobrar uma propina atrasada. Ele disse que chegou a receber dinheiro vivo em casa de executivos da empreiteira. O novo delator diz que a decisão de pagar propina “se tratava de uma decisão empresarial”. A parceria terminou em 2010 porque Goes, em suas palavras “estava cansado dessa atividade de ficar cobrando dívidas de Pedro Barusco”.

No depoimento, Goes diz que era amigo de Barusco. A dupla comprou dois aviões em sociedade. Goes contou ter oferecido um jantar para a atual mulher de Barusco em sua casa.

Preso no Paraná desde fevereiro deste ano, Goes vinha dando sinais de que estava disposto a colaborar com as investigações. Além de reclamar de problemas na coluna e no intestino, chorou duas vezes em depoimentos ao juiz Sérgio Moro.

Ontem à noite, a revista “Época” publicou em seu site o nome que seria de um novo delator da Lava- Jato. Apontado pela publicação como o “maior lobista da Petrobras”, Hamylon Padilha disse que fez depósitos em contas secretas no exterior para Nestor Cerveró e Jorge Zelada, ex- diretores da área internacional, Renato Duque e operadores políticos do PMDB. Ele cita o nome do empresário Raul Schmidt, sócio de Zelada, como responsável por recolher propinas em contratos de sondas.

 

Preso, presidente da Andrade Gutierrez vira réu

 

O juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos da Lava- Jato na Justiça federal do Paraná, aceitou ontem a denúncia do Ministério Público Federal ( MPF) contra o presidente da Andrade Gutierrez, Otávio Marques de Azevedo, e outros executivos da empreiteira, como Elton Negrão e os ex- funcionários Antônio Pedro Campelo de Souza, Flávio Gomes Machado Filho e Paulo Roberto Dalmazzo. Eles haviam sido denunciados pelos procuradores na sexta- feira passada pelos crimes de organização criminosa, corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro. No total, Moro aceitou a denúncia contra 13 pessoas.

No despacho em que aceita a denúncia, Moro cita depoimentos do mais novo delator da Lava- Jato, o empresário Mário Goes. Apontado como um dos operadores do esquema de corrupção na Petrobras desvendado pela investigação, ele fechou acordo de delação premiada e revelou 15 novas operações de lavagem de dinheiro que envolvem a Andrade Gutierrez.

Goes afirmou que utilizou duas contas no exterior para transferir dinheiro da empreiteira para o exgerente de Serviços da Petrobras Pedro Barusco.

Na decisão, Moro afirma que há evidências de que a Andrade Gutierrez pagou propina a dirigentes da Petrobras em dez contratos assinados com a estatal diretamente ou por meio de consórcios.

Diz o juiz que “os recursos obtidos através desses contratos, que têm sua origem em crimes de cartel e ajuste fraudulento de licitação, foram utilizados, após a sua submissão a condutas de ocultação e dissimulação, para pagamento das propinas.”

Segundo a Andrade Gutierrez, “as respectivas defesas serão feitas nos autos da ação penal, fórum adequado para tratar o assunto”. Os advogados da companhia disseram “que não discutirão o tema pela mídia”. Além de Otávio de Azevedo e os quatro executivos ligados à Andrade Gutierrez, também viraram réus neste caso três ex- funcionários da Petrobras acusados de receber propina da construtora em troca de vantagens em contratos com a estatal. Foram denunciados Paulo Roberto Costa ( ex- diretor de Abastecimento e Refino), Pedro Barusco ( ex- gerente de Engenharia e Serviços) e Renato Duque ( ex- diretor de Serviços). Os dois primeiros confessaram os crimes em delação, em troca de redução de pena. Duque nega as acusações.

Também passaram a ser acusadas formalmente cinco pessoas acusadas de fazer a propina da construtora chegar aos dirigentes da Petrobras: o doleiro Alberto Youssef e os operadores Fernando Soares, o Baiano, Armando Furlan Júnior, Lucélio Goes e Mário Goes. As acusações estão ligadas à 14 ª fase da Lava- Jato, desencadeada em junho com a prisão de gestores da Andrade Gutierrez e da Odebrecht. Na terçafeira, Sérgio Moro já havia aceito denúncia contra o empreiteiro Marcelo Odebrecth e outras 12 pessoas, incluindo executivos e ex- executivos da empresa, intermediários de pagamentos e funcionários da Petrobras.