Dilma vira plebeia onde reinou nas eleições

12 jul 2015

ELVIRA LOBATO

Eleitores de municípios maranhenses que deram mais de 80% dos votos à presidente hoje se dizem arrependidos

-PINDARÉ-MIRIM, IGARAPÉ DO MEIO, OLHO D’ÁGUA DAS CUNHÃS, ROSÁRIO E ALTO ALEGRE DO MARANHÃO (MA)- A popularidade da presidente Dilma Rousseff despencou em povoados pobres do Maranhão, onde, há apenas oito meses, ela obteve mais de 80% dos votos válidos no segundo turno da eleição. A crise econômica, o descumprimento de promessas de campanha e a corrupção na Petrobras revelada pela Operação Lava-Jato são criticados por moradores em conversas em frente a casebres de barro e telhados de palha.

ELVIRA LOBATOCrítica. Manoel, que recebe R$ 15 por saco produzido em fábrica de farinha, desabafa: “Quem trabalha não tem valor”

O descontentamento é explicitado também nas casas de produção artesanal de farinha, onde famílias e pequenos produtores tiram da mandioca seu alimento básico.

PRODUTOR SE DIZ ARRASADO

Reações de decepção e revolta foram registradas em cinco municípios: Igarapé do Meio, Pindaré-Mirim, Alto Alegre do Maranhão, Rosário e Olho D’Agua das Cunhãs. Em todos, Dilma obteve votação avassaladora no segundo turno: 89,06%, 87,22%, 85,44%, 87,58% e 88,23%, respectivamente.

Basta abordar os moradores para ouvir as críticas. Jerônimo Nogueira, de 53 anos, pequeno produtor rural de Alto Alegre do Maranhão, a 250 quilômetros de São Luís, diz-se “arrasado” com a situação do país. Em sua propriedade de 50 hectares, ele produz mandioca, milho, feijão e arroz e tem um pequeno rebanho de 15 vacas.

— A situação está muito difícil. A gente produz e não consegue vender. A presidente poderia cuidar da população, mas fica brigando por poder — afirmou Jerônimo.

O GLOBO localizou dois empregados diaristas na casa de farinha do agricultor Luiz Pinto, de 68 anos. Todos os elos da cadeia produtiva reclamavam da situação do país. Um dos empregados, Manoel Rodrigo do Nascimento, de 32, que recebe R$ 15 por saco produzido, queixou- se da conta de luz. Disse que tem uma geladeira pequena, uma TV “que só pega na pancada” e ventilador, e que pagou R$ 88 este mês:

— Quem trabalha não tem valor — deduziu.

O dono da casa de farinha, que fica com 10% da produção, afirmou ter mais de 20 sacos estocados sem comprador.

Raimundo Alves, de 64, tem uma casa de farinha em Igarapé do Meio (a 162 quilômetros de São Luís) também usada por pequenos produtores locais. Ao mostrar seu estoque de farinha sem comprador, disse que começou a vender fiado. Em relação à presidente avalia que ela “se perdeu” e que a corrupção é a principal causa dos problemas.

No pequeno povoado de Telêmaco, no município de Olho Dágua das Cunhãs, a 287 quilômetros de São Luís, o vaqueiro Raimundo Nonato Rodrigues, de 42 anos, acompanha as notícias pela TV. Ele disse que não entende por que tudo desandou de repente:

— Eu me sinto traído. Dilma apontou um rumo durante a campanha e mudou tudo depois que ganhou a eleição. (...) Se a presidente se candidatar outra vez vai sofrer uma derrota muito grande no Maranhão.

Segundo o vaqueiro, Dilma é vista no povoado como corresponsável pelo desvio de dinheiro da Petrobras, por não ter impedido o desvio.

— O roubo na Petrobras foi uma falta de vergonha dos políticos. Sou pai de família e meus filhos ficariam envergonhados se eu fizesse algo errado. O país está envergonhado — disse o lavrador Antônio Ferreira Cruz, de 37 anos, do povoado de Telêmaco.

“PERGUNTA QUEM TEM R$ 100?”

Trabalhador braçal, sem vínculo empregatício, Antônio recebe diária de R$ 35 para roçar pastos em fazendas da região, contratado por intermediários de mão de obra, chamados pelos trabalhadores de “empeleiteiros” (empreiteiros). Com a crise, o trabalho escasseou. Ele teme passar fome .

— Pergunta no povoado quem tem R$ 100? Não vai achar. Falam em bilhões roubados da Petrobras, e a gente sobrevivendo na marra.

Para o carpinteiro José Francisco da Conceição, de 32 anos, do povoado de Taboca, em Olho DÁgua das Cunhãs, o povo está pagando pelo escândalo da Petrobras. (* Especial para O GLOBO).

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Suspensão do Bolsa Família é criticada por pescadores

Elvira Lobato

Corte atinge quem recebe seguro no período em que a pesca é proibida

Igarapé do Meio, Pindaré-Mirim e Rosário têm atividade pesqueira, e milhares de pescadores estão registrados para receber o seguro de um saláriomínimo mensal nos quatro meses do período de defeso, quando a atividade é proibida. O anúncio de que será suspenso o pagamento do Bolsa Família nos meses em que estiverem recebendo o seguro defeso (de 1º de dezembro a 31 de março) afetou ainda mais a imagem de Dilma. O Sindicato dos Pescadores de Igarapé do Meio tem 600 afiliados, dos quais 150 recebem o seguro defeso.

A presidente do sindicato, Augusta Costa do Nascimento, diz que a reação foi “horrível” e muitos se desesperaram.

— Se a eleição para presidente fosse hoje, Dilma não teria mais de 30% dos votos aqui — afirmou.

Igual avaliação é feita pela presidente do Sindicato dos Pescadores de Rosário, Lucionora Ramos Rodrigues. O sindicato tem 3.600 filiados, dos quais 2.800 credenciados para receber o seguro defeso.

Ela diz que, em 2014, defendeu voto em Dilma por crer que era a melhor opção para a população de baixa renda:

— Quando vinham me perguntar se deviam votar na Marina ou no Aécio, eu dizia que devíamos permanecer com a Dilma. Agora, a sensação é de descontrole total. Dilma puxou o tapete. 

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Agricultores desconhecem cálculo da aposentadoria

Elvira Lobato

Confusão sobre novas regras arranham a imagem de Dilma

A mudança nas regras da aposentadoria anunciada recentemente não foi compreendida no meio rural, e vários trabalhadores ouvidos apontaram a alteração como fator de descrédito na presidente Dilma Rousseff.

— Como alguém vai se aposentar com 95 anos? Antes de chegar lá, vai estar morto — indaga Raimundo Alves, de 64 anos. Aposentado como trabalhador Rural, ele continua em atividade na lavoura e diz temer que as novas gerações não consigam o benefício.

A maior parte dos trabalhadores não entende que os 85 anos para as mulheres e os 95 anos para os homens referem-se à soma da idade com o tempo de contribuição. Em Pindaré-Mirim, o aposentado Nelson Galdino Neto, 75 anos, fez a mesma confusão. Ele é um dos poucos a declarar que votaria novamente em Dilma. Seu genro, Vagner dos Anjos, 25 anos, dono de um comércio, discordou do sogro:

— Se ele não está revoltado, eu estou.

O vigia Francisco Jesus Carneiro, 43 anos, funcionário terceirizado da prefeitura de Rosário, exibe contas de luz para explicar sua insatisfação com o governo. A conta passou de R$ 64 em setembro para R$ 85 no mês passado. Na casa humilde, segundo ele, além das lâmpadas, há apenas TV, geladeira e ventilador:

— Dilma está batendo, machucando.