Entre o medo e a perplexidade

5 jul 2015

MARIA LIMA CRISTIANE JUNGBLUT E EVANDRO ÉBOLI 

Operação da PF nas casas de senadores e deputados deixa o Congresso em polvorosa; clima entre os investigados pelo Supremo é de apreensão.

Os senadores que moram no bloco G da quadra 309 foram acordados pelo ronco de um helicóptero sobrevoando o prédio. Os motoristas e moradores se alvoroçaram com a chegada da Polícia Federal cobrindo todos os flancos do bloco. Logo descobriram que algo impensável acontecia: senadores da República eram alvo de mandados de busca e apreensão pelo envolvimento na Operação Lavajato. Quando a notícia se espalhou, o clima de receio se alastrou pelo Congresso.

ANDRÉ COELHORevolta.

— Eu estava saindo para o pilates e dei de cara com uma tropa de ninjas indo para a casa do Collor. Um baixo-astral! — contou o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP).

Collor usa o apartamento funcional no prédio, mas não estava ali. Dormia com a mulher na Casa da Dinda, mansão no Lago Norte. Ainda estava de pijama quando a PF chegou. Collor ficou indignado. Mais tarde, relatou a colegas que os agentes levaram até cópia de seu testamento.

Collor disse que mostrou notas fiscais dos carros e do Imposto de Renda, mas que o policial fez um telefonema e recebeu a ordem de “levar tudo”. Um agente filmava toda a operação na Casa da Dinda. No apartamento do Senado, como Collor não estava, a porta foi aberta com a ajuda de um chaveiro.

Collor no Senado, após discursar sobre a ida de agentes da PF a dois de seus imóveis: busca e apreensão

Apesar de o assunto ser o principal tema do dia, nenhum partido saiu em defesa de Collor ou fez discurso contra ação policial.

Na Câmara, onde, ao todo, 22 deputados respondem a inquéritos, o assunto estava nas rodas de conversa. Não houve discursos na tribuna, mas o clima entre os envolvidos no escândalo era de receio e perplexidade. Nas conversas com O GLOBO, alguns desses deputados, na condição de anonimato, criticaram s decisões dos ministros do STF que autorizaram as buscas. Os que concordaram em dar alguma declaração, a fizeram com cautela. O primeiro vice-presidente da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), investigado no STF, foi econômico:

— Espero que a PF saiba o que está fazendo. Está tudo em segredo de Justiça. Não quero falar mais — disse Maranhão, que foi apontado pelo doleiro Alberto Youssef como beneficiário do esquema na Petrobras.

Também respondendo a inquérito, Nelson Meurer (PP-PR) acompanhava no computador à sua frente o noticiário sobre o assunto. Foi outro que não quis se estender no assunto: — Não tenho nada a dizer. Jerônimo Goergen ( PP- RS) comentou sobre o assunto com reservas. Ele aparece na lista de deputados do PP que, segundo Youssef, receberam entre R$ 30 mil a R$ 150 mil:

— Já fiz minha parte. Fui o primeiro a entregar minha defesa.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), também alvo de investigação do STF, não quis comentar a ação da PF. E desdenhou ao ser perguntado sobre o clima de apreensão:

— ( Clima?) Não sei, não senti. Não vi ninguém falar de clima. Está sol.

Um parlamentar investigado, que pediu anonimato, comparou sua situação com a de Collor.

— Olha isso! O Collor tá envolvido, esses carrões! Quem sou eu perto disso tudo? Só um deputadozinho.

— Movimentado o Planalto Central hoje né? Está um pandemônio — disse o senador Aécio Neves (PSDB-MG)

____________________________________________________________________________________________________________________

Alvos da PF se dizem vítimas de arbitrariedade

 

Para Collor e Ciro Nogueira, Brasil vive Estado policial

-BRASÍLIA- Os políticos que foram alvos dos mandados de busca e apreensão cumpridos ontem pela Polícia Federal protestaram contra a ação. Alguns ressaltaram que estão colaborando com as investigações, enquanto outros partiram para o ataque e disseram, inclusive, que o Brasil vive momentos de Estado policial — caso da defesa dos senadores Fernando Collor ( PTB- AL) e Ciro Nogueira (PP-PI). Eles são investigados no Supremo Tribunal Federal por suspeita de envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras, desvendado pela Operação Lava-Jato.

Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, advogado de Ciro Nogueira, queixou-se de que a defesa está tendo sua atuação cerceada. Ele deu como exemplo o fato de ter pedido há 40 dias acesso à cópia da delação premiada do empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da UTC. Até o momento não teve êxito. O mandado de busca e apreensão, segundo Kakay, teve como um de seus fundamentos a delação de Pessoa.

— Eu não consigo entender a necessidade de uma operação dessas. Vivemos neste momento um Estado policialesco, perigoso no Brasil. Aquilo que deveria ser uma exceção virou a regra. Estou tentando obter a cópia dessa delação há 40 dias. Uma coisa básica. Mas vemos parte dessa delação nos jornais — afirmou Kakay.

Em nota, o senador Fernando Bezerra (PSB-PE) informou que está à disposição das autoridades e que aguarda o momento de prestar seu depoimento. Disse também que os documentos que foram apreendidos em seu apartamento, no Recife, “poderiam ter sido solicitados diretamente ao senador, sem qualquer constrangimento”. Em sua residência, segundo a assessoria, a esposa de Bezerra entregou aos agentes dois comprovantes da declaração de Imposto de Renda do senador e um extrato de conta-corrente.

Michel Saliba — advogado do ex-deputado João Pizzolatti (PP-SC), hoje secretário estadual em Roraima — disse que a ação foi desnecessária e invasiva. Destacou também que seu cliente colabora com as investigações e já teve seus sigilos quebrados.

— Ele está colaborando com as investigações, teve seus sigilos quebrados. Parece-me desnecessária essa operação como um todo. Tem uma repercussão midiática. Não há necessidade de um aparato desses, chegando às 6h da manhã na casa da pessoa. Um gasto desnecessário — disse Saliba.

Carlos Humberto Fauaze, advogado do ex- deputado e ex- ministro das Cidades Mário Negromonte, hoje conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia, informou ter recebido com surpresa a notícia da operação. Segundo ele, seu cliente não tem nada a esconder.

— Recebo com surpresa essa busca e apreensão porque essa operação (Lava-Jato) já acontece há alguns meses e não é usual uma busca tanto tempo depois — afirmou Fauaze.

Por meio da assessoria, o líder do PP na Câmara, deputado Eduardo da Fonte (PE), afirmou estar “à disposição da Justiça para colaborar no que for possível para esclarecer todos os fatos”.