Esta foi uma terrível semana para os gregos, de viver com dinheiro contado, com a vida em tumulto e medo do futuro. Não há boa saída: se o “sim” vencer no referendo de hoje, o ajuste vai continuar sem chance de sucesso; se o “não” ganhar, haverá mais corrida bancária, que desmontará a combalida economia grega. O governo improvisou à beira do precipício.
Os bancos terminaram a semana com um colchão de liquidez de apenas € 1 bilhão, o que não é nada para enfrentar a turbulência que pode ocorrer quando, enfim, as agências abrirem. Por isso, nunca a Grécia foi tão dependente do Banco Central Europeu (BCE).
O primeiro-ministro, Alexis Tsipras, anunciou o plebiscito, primeiro, e pensou nas consequências, depois. Um exemplo disso foi a declaração do ministro Yanis Varoufakis de que se o país sair do euro a conversão do dinheiro para o dracma será feita no valor de um para um. Na época da entrada na união monetária, o valor da conversão foi de 340 dracmas por um euro. Esse novo dracma não tem chance alguma de manter a paridade. A solidez da moeda depende da confiança no emissor. No caso, o emissor é um país endividado, que deu um calote. A desvalorização monetária destruiria grande parte do patrimônio e das economias dos gregos.
Há dois pontos que não podem ser esquecidos na discussão da crise grega: o primeiro é que o país tem uma dívida de 170% do PIB e não consegue acessar os mercados de crédito internacionais. Por isso, depende dos empréstimos do FMI e do BCE para continuar financiando seus gastos e provendo liquidez ao sistema financeiro. O segundo é que os gregos já fizeram um enorme esforço fiscal nos últimos anos, a ponto de ter superávit primário desde 2013 e um déficit nominal na casa de 2% do PIB. Os gregos argumentam que já colocaram as finanças no azul e fizeram sacrifícios demais, e que a dívida voltou a crescer porque a economia encolheu. Os credores dizem que perdoaram um pedaço da dívida, em 2012, e que nada mais podem fazer.
O problema da Grécia coloca em cheque o limite da política de austeridade. O país chegou a um ponto em que cortar mais só aumentaria a fragilidade da economia. Por outro lado, quem defende que simplesmente o país abandone as medidas de ajuste não sabe dizer como convencer os credores a continuar financiando um país que tem uma dívida muito maior do que o seu PIB.
A Grécia gastava muito antes de entrar no euro e acumulava déficits. Teria problemas com ou sem a entrada na zona do euro. Ao aderir à união monetária, usou dados fiscais falsos. Nos primeiros anos da moeda única, foi beneficiada pela abundância de capitais a juros baixos. Até que houve a crise. Daí para frente, a Grécia afundou. O déficit e a dívida dispararam. Nem tudo é, portanto, culpa da política de austeridade. O país em parte cavou o buraco no qual entrou.
Os gregos já conseguiram um perdão parcial da dívida em novembro de 2012, quando firmaram um acordo com o FMI e o Banco Central Europeu. O país se comprometeu a buscar elevadas taxas de superávit primário, cortar gastos com pensões, aposentadorias, e estabelecer um plano de privatizações que aumentasse o fluxo de caixa do governo e desse competitividade. Fez isso, em parte, mas a dívida continuou crescendo.
Estão todos num beco sem saída. Se as autoridades da zona do euro cederem, o plano de Tsipras de ameaçar com o agravamento da crise terá dado certo; se a Europa não ceder, poderá enfrentar contágio em outros países superendividados, como a Itália.
As autoridades gregas ainda não explicaram o que seria o dia seguinte do “não”. As autoridades europeias não sabem dizer que chance de sucesso teria o “sim”; ou seja, se a Grécia continuar na zona do euro, cumprindo o mesmo plano de ajuste dos últimos anos, qual seria a probabilidade de ser bem sucedida?
Neste evento específico, Tsipras tomou uma decisão impensada e provocou sofrimento extra ao povo. Ele fez um movimento perigoso, sem saber qual seria o lance seguinte. E não deu certo. Tudo neste caso é mais complexo do que parece. Qualquer que seja o resultado do referendo, a Grécia continuará em recessão e levará um longo tempo para se reerguer. Com ou sem a Grécia, a zona do euro terá que pensar o futuro da moeda comum, porque outros testes ocorrerão.