NO RIO, DESPESAS AUMENTAM, APESAR DA BAIXA PRODUTIVIDADE

 

A arquitetura eclética do Palácio Pedro Ernesto, sede da Câmara Municipal do Rio, mescla com harmonia traços distintos de duas fases do estilo neoclássico. Simetria que não encontra paralelo nas despesas da Casa, que, em 2013, custou aos cofres da cidade R$ 375,5 milhões — o que corresponde a um gasto médio de R$ 7,4 milhões com cada um de seus 51 vereadores. Mesmo com as contas daquele ano ainda sob análise do TCM, a Câmara, em 2014, elevou para R$ 8,6 milhões as despesas por gabinete, totalizando R$ 438,6 milhões.

ANTONIO SCORZACâmara do Rio. O Palácio Pedro Ernesto, sede do Legislativo da capital: apesar de altos gastos, as atividades da Casa muitas vezes se resumem, até segundo vereadores, à distribuição de homenagens

A última novidade da Casa no que diz respeito a gastos foi a aprovação de um projeto de lei para a instalação de um consultório dentário. O local será ocupado por analistas legislativos especializados em odontologia e ortodontia, além de técnicos e auxiliares, que ficarão responsáveis pela saúde bucal dos servidores. Apesar de ainda não estar funcionando, o consultório já deixou de boca aberta alguns vereadores, que classificaram como excessivos os custos da Câmara.

É o que pensam, por exemplo, Teresa Bergher (PSDB) e Renato Cinco (PSOL). Apesar das divergências ideológicas, ambos acham que a produtividade da Casa não justifica suas despesas, consideradas muito elevadas. Eles afirmam que, hoje, o trabalho no plenário praticamente se restringe à distribuição de moções, medalhas e indicações.

— O Legislativo vem apenas respaldando as decisões do Executivo. Com isso, muita gente acha que a Câmara nem deveria existir. No entanto, o papel do vereador é muito importante, desde que seja bem executado. Afinal, cabe à Casa fiscalizar a aplicação de um orçamento de R$ 30 bilhões por ano — diz Teresa.

Renato também acha que a Casa precisa ser mais atuante:

— Circula uma piada que a Casa está cheia de vereadores iguais à personagem Hello Kitty. Parecem não ter boca, nunca falam.

DENÚNCIAS NÃO SÃO APURADAS

No cenário descrito por Teresa, propostas de instauração de CPIs para apurar indícios de irregularidades acabam sendo barradas. Um exemplo é a inexistência de uma comissão que verifique denúncias envolvendo um ex-integrante do primeiro escalão da prefeitura — Rodrigo Bethlem, que foi secretário de Assistência Social. Ele é investigado pelo Ministério Público estadual por suspeita de manter uma empresa offshore e contas em bancos no exterior com dinheiro de origem não comprovada.

As denúncias também envolvem o presidente da Câmara, Jorge Felippe (PMDB), de quem Bethlem era genro. Ele teve os bens bloqueados pela Justiça após a descoberta de uma conta num banco suíço em seu nome, que teria recebido repasses do Scolette Group, empresa com sede no Panamá que tem o ex-secretário como procurador. Ambos negam qualquer irregularidade.

Para o cientista político Carlos Pereira, professor da Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas, a influência do Executivo sobre as câmaras municipais faz parte do processo democrático. Mas ele reconhece que o custo das casas legislativas é muito alto frente à irrelevância de grande parte das decisões tomadas nos plenários:

— O custo quase proibitivo das câmaras precisa ser revisto para refletir a realidade do país. Isso depende de maior engajamento por parte da população.

 

Pedras no caminho do Legislativo

 

Na pequena Pinheiral, com pouco mais de 23 mil habitantes, a 120 quilômetros de distância da capital, os concursos públicos prestados pelo vereador Luimar Guedes Belmont de Souza (PSD), no fim do ano passado, para os cargos de inspetor e escrivão da Polícia Civil de São Paulo viraram um dos assuntos mais comentados na Câmara. Pouco visto na Casa, o dentista Luimar é o vereador campeão de faltas nesta legislatura: em seu segundo mandato, ele acumulou 61 no período de janeiro de 2013 a maio deste ano. Todas essas faltas tiveram justificativa acolhida e foram abonadas pela presidência.

SELMA SCHMIDTSem plenário. Câmara fechada na noite de terça-feira, dia da semana com sessão prevista

— O vereador Luimar ainda está passando por algumas etapas nos concursos (exames de saúde e psicotécnico, entre outros) e não iniciou o curso na Academia de Polícia de São Paulo. Quando começar o curso, vamos ver como ficará a sua situação na Câmara. A Constituição Federal diz que um vereador pode acumular outra atividade se houver compatibilidade de horário — alega o procurador da Câmara de Pinheiral, Joviano da Cunha Medeiros, que acabou fazendo a defesa de Luimar, não localizado pelo celular que consta de sua ficha funcional.

Um inquérito que investiga funcionários fantasmas na Câmara de Pinheiral corre em segredo de Justiça no Ministério Público. Com nove vereadores, a Casa — com sede num imóvel alugado por R$ 6,5 mil, onde funcionou um supermercado — está entre os legislativos com duas sessões semanais, que acontecem sempre às segundas e terças-feiras. Mas o teto é de oito sessões ordinárias mensais. Nada além. Quando há cinco segundas e terças num mês, na última semana não há reunião plenária. Foi o caso da última semana de junho.

— Ontem (segunda) à noite, teve gente que veio assistir à sessão e encontrou a Câmara fechada — contou o aposentado Rogério Santos, morador de Pinheiral.