Alcance de maioridade aos 16 anos pode ser ampliado

 

Vendida como branda por seus apoiadores, a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos aprovada em primeiro turno na Câmara dos Deputados poderá ser ampliada no futuro para mais crimes do que o previsto sem que seja necessário novamente o aval de três quintos dos parlamentares — votação exigida em propostas que alteram a Constituição.

ROBERTO STUCKERT FILHO/11-9-2003Bancada da bala. Alberto Fraga, em 2003, no Congresso: há mais de uma década, deputado propõe aumentar penas

O texto aprovado prevê a redução da maioridade em caso de crimes hediondos, que são definidos por lei ordinária. Levantamento feito pelo GLOBO mostra que existem 81 projetos em tramitação na Câmara e no Senado que visam à inclusão de 50 crimes entre os hediondos.

Alterações em leis ordinárias podem ocorrer com menos votos do que o necessário para aprovar PECs, até mesmo por votação simbólica. A PEC da redução da maioridade foi aprovada na madrugada de quinta-feira, 24 horas depois de ter sido rejeitada.

 

Parlamentares querem tornar pena de tráfico mais dura

 

Vários dos 24 deputados que trocaram o voto contra pelo favorável à redução da maioridade de um dia para o outro usaram como justificativa a retirada do crime de tráfico de drogas do texto. Dois projetos em tramitação na Câmara, porém, propõem inclui-lo na lei de crimes hediondos. Um é de autoria de Alberto Fraga (DEM-DF) e o outro, de Jair Bolsonaro (PP-RJ), expoentes da chamada “bancada da bala” há mais de uma década. Para virar lei, a proposta passará por comissões. No plenário, necessitará apenas de maioria simples, sem exigência de votação nominal.

Retirados na manobra para a aprovação da redução da maioridade, os crimes de terrorismo, tortura e roubo qualificado também são alvo de projetos de lei para torná-los hediondos. Também excluído, o crime de lesão corporal grave pode virar hediondo quando praticado contra crianças ou idosos, ou ainda associado a tentativa de homicídio.

Os projetos que visam à ampliação do rol de crimes hediondos são apresentados por parlamentares de diferentes partidos e correntes ideológicas. A lista inclui “ultraje a culto”; crimes de discriminação e preconceito, como racismo; roubo e furto de medicamentos; adulteração de alimentos; roubo de veículos; acesso indevido a computadores; e até apropriação indevida de recursos do Bolsa Família. Temas como pedofilia, corrupção, eutanásia e aborto também poderão ser incluídos.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é autor de um dos projetos para tornar o aborto hediondo. Ele mantém sua proposta, mas diz que os parlamentares serão criteriosos para a inclusão de novos crimes justamente devido à redução da maioridade.

— Acho que isso vai dificultar que se aprovem mais projetos dessa natureza, justamente pelo cuidado de se fazer essa extensão. Vai ser mais difícil aprovar. Não se pode banalizar o crime hediondo — diz Cunha.

A líder do PCdoB, Jandira Feghali (RJ), reclama que a possibilidade de redução da maioridade para outros crimes por lei ordinária não foi informada de forma clara aos parlamentares na votação da semana passada:

— Foi um debate hipócrita, falso, mentiroso, feito para responder a uma opinião publica que não tem nem a informação de que já se pune hoje a partir dos 12 anos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Houve um discurso falso de que se restringiu o rol de crimes porque, na verdade, abriu-se a possibilidade de incluir mais crimes depois.