Instabilidade chinesa

 

Os mercados, às vezes, operam em modo pânico. É isso que explica a abrupta queda de ontem de 8,5% na Bolsa de Xangai, na China. Não houve nada de diferente, exceto os problemas de sempre. A economia chinesa está desacelerando, o governo incentivou a compra de ações, e isso provocou uma bolha. Esse excesso está sendo contido também com intervencionismo.

Para o Brasil, esse é um novo problema, que causa mais desequilíbrio. O temor em relação à China fez subir o dólar, e ele já havia subido na semana passada pela mudança da meta fiscal. Essa oscilação cambial pressionará a inflação, que o Banco Central tenta conter com taxas de juros elevadas.

A queda da bolsa chinesa é a volta de um problema que começou há algumas semanas, quando os índices tiveram grandes oscilações. Ontem, as explicações não traziam nada de novo que explicasse um tombo de 8,5% em apenas um dia. Os analistas alegaram que há a ameaça de alta dos juros nos EUA, a desaceleração da própria economia chinesa, problemas de financiamento dos mercados pelo governo chinês. Nada disso é novidade.

Em junho do ano passado, o índice da bolsa de Xangai operava na casa de 2.000 mil pontos. Doze meses depois, em junho deste ano, bateu no pico de 5.100 pontos, com uma valorização de mais de 150% no período. Nos 30 dias seguintes, entrou em queda livre, recuando para 3.500 pontos, até que o governo anunciou novas medidas de intervenção, para conter as vendas e estimular a compra de papéis por órgãos estatais. Isso fez o índice subir a 4 mil pontos. Ontem, em apenas um dia, perdeu 8,5%, voltando para 3.725 pontos.

O governo chinês é intervencionista pela própria natureza do regime. Mas fazer isso na bolsa de valores é correr um risco enorme. Nos últimos 30 dias, o governo proibiu ofertas iniciais de ações, obrigou que empresas estatais comprassem papéis e o banco central a conceder crédito a investidores, entre outras medidas. Chegou a estabelecer limites de vendas de papéis. Isso coloca o governo diante de um dilema: parar com as intervenções e deixar a bolsa se estabilizar sozinha; ou continuar criando mecanismos que evitem a queda e estimulem a alta, mas que também vão acabar adiando o equilíbrio dos mercados por lá.

A economia chinesa vem crescendo há mais de 30 anos e agora entra em uma nova fase, precisando consumir mais e investir menos. Essa troca de marcha não é trivial, e o temor é que o país tenha uma freada brusca. Isso ainda não aconteceu, o crescimento tem se mantido na casa de 7%, mas o risco permanece. Em relatório divulgado ontem, o economista Fábio Silveira, da Go Associados, disse que dificilmente os chineses crescerão mais que 6,5% este ano e mais que 5,5% no ano que vem.

Para o Brasil, a queda da bolsa chinesa é um risco externo a mais num ambiente já tumultuado pelas crises política e econômica. Ela cria mais instabilidade. Já há o problema que vem dos Estados Unidos, com a probabilidade cada vez mais iminente de alta dos juros. Nova redução de crescimento na China afeta nossas exportações de matérias- primas, principalmente minério de ferro e soja. Para se ter uma ideia, em um ano, as ações PN da Vale já perderam 50% do valor, saindo de R$ 29 para R$ 14. Nesse período, o preço da tonelada do minério de ferro caiu da faixa de US$ 90 para entre US$ 50 e US$ 60. No melhor momento da cotação, em 2011, a tonelada chegou a ser vendida próxima a US$ 190.

Esse recuo no preço do minério representa uma perda não só para a empresa, mas também para o governo, porque cai a arrecadação. Menos dólares também entram no país, pressionando a cotação da moeda americana, a inflação, e dificultando o ajuste que precisa ser feito nas transações correntes, que estão com um déficit acima de 4% do PIB.

O dólar ontem chegou a ser cotado em R$ 3,38, para fechar em R$ 3,36. O Boletim Focus, que faz uma coleta de previsões no mercado financeiro, estima que a moeda americana chegará em dezembro valendo R$ 3,25. Ou seja, a cotação atual já está mais alta e, se não cair, vai obrigar os economistas a revisarem as projeções de inflação, que estão em 9,23% este ano. Quanto maior a cotação do dólar, maior o risco da nossa inflação chegar a dois dígitos este ano, e menor a chance de o índice voltar ao centro da meta no ano que vem, como tem dito o Banco Central.