O rastro da propina paga a Duque

30/07/2015 

 EDUARDO MILITÃO
JOÃO VALADARES
 
Procuradores oferecem denúncia contra o ex-diretor de Engenharia da Petrobras por receber R$ 1 milhão para beneficiar empresa na instalação de tubulações entre poços de petróleo. Presidente da Andrade Gutierrez vira réu em ação penal .

A força-tarefa da Operação Lava-Jato no Paraná ofereceu ontem a 28ª denúncia do caso, sendo a 18ª relacionada à Petrobras e a crimes envolvendo políticos. O alvo é novamente o ex-diretor de Engenharia Renato Duque, ligado ao PT. Outras ações o acusaram de repassar propinas de empreiteiras ao partido, o que é negado pela legenda. Na acusação de ontem, a Procuradoria-Geral da República diz que o ex-dirigente beneficiou uma empresa que instalou tubulações entre poços de petróleo. 

Ontem, o juiz Sérgio Moro ainda transformou em réus Otávio Azevedo e outros executivos da construtora Andrade Gutierrez.

O grupo de nove procuradores narrou ao magistrado que Duque recebeu cerca de R$ 1 milhão de propina nas contas da empresa Hayley. Para isso, beneficiou a Saipem S/A. “Em 27/5/2011, a Saipem S/A foi convidada pela Petrobras para participar do certame envolvendo a instalação do gasoduto submarino de interligação dos campos de Lula e Cernambi”, narram eles.

Outras firmas foram convidadas, mas só duas e um consórcio apresentaram documentação inicial. A única proposta válida foi da Saipem: R$ 286 milhões, valor superior à estimativa da estatal. Após reuniões de Duque com o consultor João Bernardi, também acusado, o negócio deslanchou.

“Em vez de a Petrobras refazer a licitação, optou-se somente pela flexibilização de algumas condições de contratação”, diz a acusação. Ainda assim a nova estimativa de custos não poderia aceitar a proposta da empresa. A solução foi elevar novamente a estimativa da estatal para “encaixar” o preço da Saipem. Novas negociações determinaram a contratação em R$ 248 milhões. A empresa Hayley, ligada a Bernardi, recebeu pagamentos no exterior. Tudo era para Duque, segundo a procuradoria.

O ex-diretor ainda é acusado de operações de lavagem de dinheiro por meio de operações no mercado de capitais e da aquisição de obras de arte. “A lavagem de dinheiro por intermédio de aquisição de obras de arte é uma forma inovadora de ocultar o real proprietário dos valores provenientes de crimes”, afirmou o procurador Diogo Castor de Mattos, integrante da Lava-Jato.

O advogado de Duque, Alexandre Lopes, afirmou ao Correio que a denúncia não tem provas robustas para sustentar qualquer acusação contra seu cliente. “A denúncia é absolutamente improcedente”, disse. “A acusação tem como base delações que não se comprovam. Não há mínimo suporte probatório que permita a deflagração da ação penal”, continuou. Apesar disso, ele acredita que o juiz Sérgio Moro vá seguir com a ação criminal. “Justa causa não importa ao Moro”, ironizou. A Saipem disse em nota que, assim que for notificada, se oferecerá para colaborar com as investigações. Bernardi não foi localizado.

Corrupção

O presidente da construtora Andrade Gutierrez, Otávio Marques de Azevedo, virou réu em ação penal no âmbito da Operação Lava-Jato. Outras 12 pessoas, envolvendo operadores do esquema, lobistas e executivos da empresa, também vão responder ao mesmo processo. A Procuradoria-Geral da República atribui ao empreiteiro e aos outros acusados os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A denúncia do Ministério Público Federal foi aceita na tarde de ontem pelo juiz Sérgio Moro, à frente dos processos relativos ao esquema de corrupção na Petrobras.

Além do empreiteiro, viraram réus o doleiro Alberto Youssef, os ex-diretores da petroleira Paulo Roberto Costa e Renato Duque e ainda Fernando Soares, mais conhecido como Fernando Baiano, apontado como o operador do PMDB. A legenda nega as acusações.

Na denúncia, os procuradores da República alegam que a Andrade Gutierrez participava de um cartel para “obter preços favoráveis e, com isso, lucros extraordinários”. Parte do lucro excedente era utilizado para pagar suborno a agentes públicos e partidos políticos. No despacho proferido ontem, o juiz Sérgio Moro diz que, conforme a denúncia, Otávio Marques de Azevedo estaria envolvido diretamente na prática dos crimes, orientando a atuação dos demais, inclusive nas tratativas com Fernando Soares, o Fernando Baiano, para repasse de propinas à Diretoria de Abastecimento da Petrobras.

Na terça-feira, o dono da Odebrecht, o empresário Marcelo Bahia Odebrecht, também virou réu, com outras 12 pessoas, numa das ações penais da Lava-Jato. A denúncia do Ministério Público Federal, que pede condenação do grupo por corrupção, lavagem de dinheiro e pertencimento à organização criminosa, havia sido encaminhada à Justiça Federal na sexta-feira passada.

Delações fechadas

Cinco novos investigados fecharam delação premiada na Lava-Jato, informa relatório do Ministério Público. Agora, são 22 delatores no Paraná e um no Rio de Janeiro. Uma das confissões veio do lobista Mário Góes, acusado de pagar propinas de estaleiros e empreiteiras. Ele disse que prestou serviços de consultoria no valor de R$ 1,5 milhão, mas que o restante era propina para o ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco.

O advogado de Duque, Alexandre Lopes, disse que seu cliente “não recebeu nenhum pagamento indevido” de ninguém. Apesar de ser crítico das colaborações premiadas da Lava-Jato, ele afirma que seu cliente não descarta fazer uma delação premiada. “Disse que, em tese, não é impossível”, afirmou. “A cadeia pesa. É um massacre psicológico. Abala o juízo.” Porém, se isso acontecer, Lopes deixará de atender Duque.

Saiba mais

Entenda as duas denúncias em tramitação na Justiça Federal

Alvo
Renato Duque

Acusação

O Ministério Público acusa o ex-diretor da Petrobras Renato Duque de favorecer a Saipem. A empresa deveria instalar um gasoduto para interligar os poços de petróleo do pré-sal. Para isso, US$ 1 milhão foi depositado em uma conta em favor do ex-dirigente.

Defesa

O advogado de Duque diz que a denúncia não tem provas, apenas depoimentos feitos em delação premiada.

Próximos passos

O juiz Sérgio Moro deve decidir se rejeita ou aceita a denúncia. Depois disso, a defesa tem 10 dias para rebater as acusações.

Alvo

Executivos da Andrade Gutierrez

Acusação
Na denúncia aceita pela Justiça Federal, a Andrade Gutierrez é acusada de participar de cartel para “obter preços favoráveis e, com isso, lucros extraordinários”. Os investigadores atestam que parte do lucro excedente era utilizado para pagar suborno a agentes públicos e partidos políticos. Os procuradores dizem que Otávio Marques de Azevedo está envolvido diretamente na prática dos crimes, orientando a atuação dos demais, inclusive nas tratativas com o lobista Fernando “Baiano” Soares para repasse de propinas à Diretoria de Abastecimento da Petrobras, que era comandada por Paulo Roberto Costa.

Defesa

A empreiteira diz que “o conteúdo da denúncia apresentada contra seus executivos e ex-executivos parece não trazer elementos novos além dos temas já discutidos anteriormente, e que já foram devidamente esclarecidos no inquérito”. “Infelizmente, os devidos esclarecimentos e provas juntadas não foram levados em consideração”. A empresa luta pela soltura de Azevedo e demais executivos.