Título: Levar cerveja no carro?
Autor: Gama, Júnia
Fonte: Correio Braziliense, 26/08/2011, Política, p. 5
Só no porta-malas Projeto de lei aprovado na CCJ restringe o transporte de bebidas alcoólicas em veículos e prevê multa de R$ 191. Jurista afirma que a medida é inconstitucional
A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou ontem, em caráter conclusivo, um projeto de lei (PL) que proíbe o transporte de bebidas alcoólicas na cabine de veículos. Quem não cumprir a lei estará cometendo infração gravíssima, punida com multa de R$ 191,44 e sete pontos na Carteira Nacional de Habilitação.
O relator do projeto, deputado Hugo Leal (PSC-RJ), explica que a proibição atinge todos os tipos de veículos, inclusive ônibus e táxis, e que bebidas alcoólicas somente poderão ser transportadas em porta-malas. No entanto, o parlamentar aponta que, apesar da proibição ser generalizada, a norma poderá ser regulamentada para comportar algumas exceções. "Mas, a princípio, tirando o pau de arara, tudo o que transportar passageiro será atingido pela lei", diz.
O PL n° 7.050/2002, do senador Edison Lobão (PMDB-MA), hoje ministro de Minas e Energia, deve retornar ao Senado para aprovação, já que Hugo Leal propôs a retirada de uma medida que determina a retenção do veículo até o saneamento da irregularidade, o que, para o deputado, seria "injurídico e ilógico". "Se a infração constitui-se tão somente no transporte de bebidas alcoólicas na cabine de passageiros, basta tirá-las dali e não restará nada de errado com o veículo que justifique a retenção", explica.
Leal defende que a norma é importante no contexto de "afrouxamento" da fiscalização da lei seca (leia palavra de especialista). "Começou como novidade, mas, fora o Rio de Janeiro, que adotou a repressão a essa infração como política pública, a fiscalização diminuiu muito", diz o parlamentar. Para Leal, a lei dará continuidade à restrição ao consumo de bebida alcoólica.
O relator do PL acredita que, com a medida, parte das 38 mil mortes e dos 400 mil feridos anuais por acidentes de trânsito poderá ser evitada. Hugo Leal conta que um trabalho realizado pelo Instituto Médico Legal (IML) de São Paulo detectou que cerca de 43% das pessoas mortas em acidentes de trânsito havia consumido álcool. "É preciso criar instrumentos que dificultem a ingestão de bebidas, e com essa lei temos a esperança de diminuir o número de acidentes."
Questionamento Apesar da boa intenção, o texto gera polêmicas. O jurista Carlos Pellegrino acredita que a lei seja inconstitucional. "Ela restringe o artigo 5º da Constituição, que trata dos direitos inerentes à pessoa humana. Transportar não significa consumir", aponta. O jurista questiona ainda casos específicos em que a lei prejudique o trabalho de empresas que transportem bebidas alcoólicas e pessoas que não tenham veículo próprio. "Como faz uma transportadora de bebidas ou uma pessoa que não tenha carro e precise transportar bebida em ônibus?"
Na próxima semana, deputados da Frente Parlamentar do Trânsito Seguro irão se reunir com o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), e com o líder do governo na Casa, Cândido Vaccarezza (PT-SP), para pedir que seja votado o projeto de qualificação da lei seca. A intenção é aumentar a possibilidade de provas para a fiscalização da norma, que hoje se restringe ao bafômetro.