Itamaraty é convocado sobre cotas
30/07/2015
Rodolfo Costa
Mathias Abramovic, pela segunda vez, se declarou negro para se beneficiar do sistema em seleção do órgão.
Procuradoria do Distrito Federal quer saber por que edital do concurso para diplomata não especificou mecanismo que valide a autodeclaração dos candidatos.
A discussão sobre supostas fraudes ao sistema de cotas raciais no concurso público para diplomata ganhou novos contornos. A procuradora da República Ana Carolina Alves Araújo Roman, do 2º Ofício de Cidadania da Procuradoria do Distrito Federal (PR-DF), convocou o Itamaraty para uma reunião hoje a fim de discutir as polêmicas em torno da Lei nº 12.990/14, que reserva 20% de vagas em seleções da União a pessoas que se autodeclaram pretas ou pardas. Denúncias do movimento negro apontam que concorrentes como o médico Mathias Abramovic — que gerou polêmica ao se candidatar pelas cotas ao cargo de diplomata, no certame de 2013 —, estariam se aproveitando de brechas na legislação.
O pedido da PR-DF faz parte da investigação que o Ministério Público Federal (MPF-DF) instaurou para apurar as prováveis irregularidades no concurso. Entre os pontos que serão debatidos está o motivo de o edital não ter especificado um mecanismo que valide a autodeclaração dos candidatos. De acordo com o Itamaraty será informado à Procuradoria da República que o ministério “segue o padrão de outros órgãos do Estado e cumpre a Lei nº 12.990”.
Militantes do movimento negro e do Ministério do Planejamento destacam, no entanto, que o Supremo Tribunal Federal (STF) já pacificou por meio da Arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) n° 186, a elaboração de mecanismos complementares à auto-identificação.
As polêmicas, no entanto, deverão ganhar força ao longo dos próximos meses.O Ministério Público Federal (MPF) no Espírito Santo ajuizou ação civil pública pedindo a suspensão parcial do concurso para agente da Polícia Federal em todo o país, alegando ilegalidades na exclusão de candidatos por falsa declaração. Em Alagoas, a 3ª Vara da Justiça Federal determinou que a União reintegre um dos candidatos eliminados e o convoque para o curso de formação profissional.
Ilegalidade
No entendimento do advogado Max Kolbe, do escritório Kolbe Advogados Associados, a criação de comissões específicas para analisar a veracidade da autodeclaração de cor ou raça de candidatos em concursos é inconstitucional. “A ADPF 186 trata de cotas para universidades públicas, que é um instituto absolutamente diferente das cotas raciais para concursos públicos. No que tange as cotas para seleções públicas deve ser aplicada a lei, que fala apenas em autodeclaração”, afirmou.
Verificação
Na avaliação do advogado, militante do movimento negro e professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Samuel Vida, a lei é clara ao prever que candidatos serão eliminados na hipótese de constatação de declaração falsa. “Nada impede que os órgãos federais adotem para finalidade específica a verificação quando for apresentada uma denúncia ou algum indício de fraude. É previsto na Constituição adotar esse tipo de procedimento e prezar pela lisura do processo seletivo”, disse.