Valor econômico, v. 16, n. 3802, 21/07/2015. Brasil, p. A3

 

Empresas têm R$ 61 bi elegíveis para 'mini Refis'

 

Por Fernando Torres | De São Paulo

As 25 companhias abertas que têm o maior volume de contencioso tributário do país, cujo valor somado alcançava R$ 363,3 bilhões no fim de 2014, carregavam no balanço do primeiro trimestre saldo de R$ 61,9 bilhões em créditos tributários decorrentes de prejuízo fiscal. É desse encontro de contas - entre cobranças administrativas e judiciais de tributos de grandes empresas e créditos tributários a compensar que elas possuem - que o governo esperar tirar ao menos de R$ 10 bilhões em arrecadação extras este ano, com a criação do programa que tem sido chamado de "mini Refis", que deve vir por medida provisória a ser editada nos próximos dias. Ao contrário de outros programas que receberam o nome Refis, este não prevê perdão de multas e nem parcelamento dos débitos a perder de vista.

Os dados são de levantamento exclusivo feito pelo Valor e incluem processos de perda considerada provável pelas empresas, de R$ 53 bilhões, e também os de perda possível - para os quais não há provisão constituída (R$ 309 bilhões). Conforme oValor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor antecipou na semana passada, a ideia é que as empresas possam quitar débitos em disputa com a Receita pagando 43% em caixa, à vista, e 57% com prejuízo fiscal acumulado nos balanços.

A grande vantagem é acelerar o aproveitamento dos créditos tributários decorrentes de prejuízo fiscal e base negativa de Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), que, no cenário normal, só podem abater 30% do lucro real (base de recolhimento dos tributos sobre o resultado das empresas) de cada ano.

Depois das bilionárias baixas contábeis de 2014, e com "ajuda" da desvalorização cambial dos últimos anos, a Petrobras lidera a lista dos que tem mais tributos a compensar e carregava no balanço de março R$ 21,9 bilhões em prejuízo fiscal e base negativa de CSLL. Ao mesmo tempo, tem contencioso tributário de R$ 96,1 bilhões, para o qual não constituiu provisão, dos quais R$ 61,5 bilhões na esfera federal.

Itaú e Bradesco aparecem em seguida na lista daqueles que tinham o maior saldo de créditos tributários decorrentes de prejuízo fiscal a compensar no fim do primeiro trimestre, no valor de R$ 10,6 bilhões e R$ 5,8 bilhões, respectivamente. Cabe notar, contudo, que esses valores cresceram bastante neste início de ano (ao fim de 2014 eram de R$ 6,3 bilhões e R$ 3,7 bilhões), principalmente em decorrência do efeito da variação cambial.

Como os bancos devem registrar lucro nos próximos trimestres, os créditos gerados dentro de um mesmo exercício podem ser compensados sem a limitação dos 30% e sem que as instituições precisem recorrer ao "mini Refis".

A quarta companhia com maior saldo de prejuízo fiscal no balanço é a Vale. É importante destacar que os R$ 4,3 bilhões que a empresa tem para compensar se referem ao consolidado do conglomerado, sendo que parte relevante desse saldo se refere a perdas de controladas da mineradora no exterior. Individualmente, sem considerar as subsidiárias no Brasil, a Vale S.A. tem R$ 375 milhões de prejuízo fiscal. Procuradas para comentar o interesse em aderir ao "mini Refis", nenhuma das quatro empresas quis se pronunciar.

Valor apurou que o incentivo é bem visto, mas considerado pequeno. Ou seja, deve haver adesão, mas está longe de provocar correria das empresas por encerrar contingências usando o saldo acumulado de prejuízo fiscal.

"O benefício pode interessar a grandes empresas, que possuem grande acúmulo de prejuízos fiscais e bases negativas e não possuem a perspectiva de utilizá-los no abatimento do IRPJ e CSLL, seja em razão da trava de 30%, seja em razão da baixa perspectiva de lucro nos próximos anos", diz o advogado Fábio Martins de Andrade, do Andrade Advogados. Segundo ele, a opção pelo programa também pode ser vantajosa em caso de perspectiva de derrota numa disputa, já que a dívida é corrigida pela Selic, que está em alta.

Outro atrativo é evitar a constituição de garantias onerosas, ou o risco de ter o débito inscrito na dívida ativa da União, como reconheceu a Petrobras em comunicado na semana passada, em que informou que vai pagar parte do valor de uma disputa tributária que envolve a cobrança de IOF sobre empréstimos entre a companhia e suas controladas no exterior.

Da dívida de R$ 1,6 bilhão que será paga, e se refere ao ano de 2008, R$ 1,2 bilhão será quitado à vista e R$ 400 milhões com prejuízo fiscal, conforme permite um Refis antigo, mas como limite menor do que o previsto para o novo programa. Em nota do balanço, a empresa informa que, em março, o contencioso total envolvendo cobrança de IOF sobre empréstimos entre a companhia e suas controladas no exterior chegava a R$ 7,3 bilhões, ao se considerar autuações de 2007, 2008, 2009 e 2010. Ou seja, ainda há mais por vir.

No dia 6 de julho, o Valor informou, citando fonte próxima à empresa, que a estatal mudaria sua política referente ao tratamento de débitos tributários, revendo a estratégia da administração anterior, que era questionar os valores sem constituir provisões.

O maior contencioso da Petrobras com o governo federal, no valor de R$ 21,4 bilhões, se refere ao não recolhimento de Imposto de Renda na fonte e Cide sobre remessas para pagamento de afretamento de plataformas que juridicamente estão sediadas no exterior.

 

Fazenda decide repassar R$ 1,9 bilhão a Estados e municípios até o fim do ano

 

Por Raphael Di Cunto e Leandra Peres | De Brasília

 

Ilan Pellenberg/Frame/FolhapressJoaquim Levy, ministro da Fazenda: acenos aos secretários estaduais em busca de apoio para salvar a reforma do ICMS

Em um agrado aos governos estaduais, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, repassará aos Estados e municípios quatro parcelas de R$ 487,5 milhões relativas ao auxílio financeiro destinado a fomentar as exportações do país. O pagamento está previsto em projeto de lei encaminhado sexta-feira pelo governo ao Congresso. Ao todo, o governo pagará R$ 1,95 bilhão entre setembro e dezembro deste ano.

O projeto prevê que o pagamento ocorrerá até o último dia útil de setembro, outubro, novembro e dezembro deste ano, descontadas as dívidas vencidas e não pagas por Estados e municípios à União, inclusive as de empréstimos no exterior em que o governo federal seja o avalista. Não há menção a nenhuma compensação das desonerações realizadas em 2015.

A autorização, conforme antecipou na sexta-feira o Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, foi um aceno do ministro aos secretários estaduais que compõem o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), e uma forma de buscar apoio para salvar a reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Em março de 2014, os secretários tinham feito o pedido do pagamento do auxílio, que é uma parcela da compensação que a União faz aos Estados e municípios pela desoneração do ICMS prevista na Lei Kandir. O projeto só foi encaminhado ao Congresso na noite de sexta-feira, após reunião do Confaz em que Levy questionou se havia alguém contrário à reforma do ICMS e ninguém se manifestou.

Na reunião do Confaz, os 27 secretários estaduais de Fazenda encaminharam ofício ao ministro da Fazenda com dez reivindicações. Uma delas diz respeito à transferência do auxílio financeiro, mas os secretários querem as compensações relativas a 2014 e 2015.

Outra reivindicação dos secretários é que o governo adote iniciativas voltadas à não aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que estabelece nova desvinculação de receitas da União (DRU), pois argumentam que a medida terá "impacto financeiro negativo e expressivo sobre as receitas estaduais". A atual desvinculação de 20% das receitas de impostos e contribuições da União acaba em dezembro e a PEC encaminhada pelo governo prevê aumento da desvinculação para 30%.

Os secretários pediram também a sanção do projeto de lei complementar, recentemente aprovado pelo Congresso, que altera a Lei Complementar 148/2014, definindo novos critérios de apuração de encargos para a dívida dos Estados e municípios com a União. Eles querem que a presidente Dilma Rousseff não vete os artigos 2º a 10º da lei, que autorizam a utilização de depósitos judiciais para o pagamento de precatórios judiciais, da dívida pública fundada e de investimentos. Durante a reunião, o ministro Levy confirmou que a presidente Dilma não vetará essa autorização.

A rápida regulamentação da Lei 148/2014 e a subsequente assinatura dos respectivos aditivos contratuais é outro pleito apresentado pelos secretários. Eles desejam que esses instrumentos legais subsidiem a assinatura dos acordos do Programa de Ajuste Fiscal dos Estados e a elaboração das leis orçamentárias estaduais para 2016.

A retomada do processo de avaliação e autorização da contratação de operações de crédito pelos Estados foi outra reivindicação apresentada pelos secretários. Em resposta, o ministro informou, durante a reunião do Confaz, que começará a liberar as autorizações de empréstimos que estão represadas na Fazenda, embora não tenha falado em valores ou prazos.

Os secretários ainda pediram a elevação das transferências para manutenção do Sistema Único de Saúde (SUS) e a adoção de iniciativas visando adequar a majoração do índice de reajuste do Piso Nacional do Magistério aos índices de inflação, pois disseram que "muitos Estados já estão ultrapassando os limites de gasto de pessoal da Lei de Responsabilidade Fiscal". Eles desejam também que o governo federal auxilie a construção e aprovação de uma desvinculação de receitas dos Estados. (Colaborou Ribamar Oliveira, de Brasília)