Plano de proteção ao emprego será voltado a quem mais demitiu e deve beneficiar indústria e construção. Para participar do Programa de Proteção ao Emprego ( PPE) — que permite redução de jornada e corte de até 30% nos salários, com contrapartida do governo federal — as empresas em dificuldades financeiras terão que esgotar primeiro a utilização do banco de horas dos funcionários e o período de férias, inclusive coletivas. De acordo com os critérios de adesão, divulgados ontem, o programa vai beneficiar, sobretudo, as empresas que mais demitiram nos últimos meses.
Na hora de avaliar o pedido de adesão, o Ministério do Trabalho vai analisar o indicador líquido de geração de empregos ( diferença entre admissões e demissões), registrado no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados ( Caged), para aferir se a empresa realmente está passando por crise financeira. Essa diferença terá que ser igual ou menor a 1% do total de funcionários que a companhia tinha nos últimos 12 meses, contados do mês anterior à solicitação da adesão. Ou seja, empresas que tenham aumentado seu quadro de pessoal em mais de 1% estão fora do programa. Já que as mantiveram esse limite ou reduziram o número de funcionários poderão aderir.
EXPECTATIVA É ATINGIR 50 MIL EMPREGADOS
Uma empresa com 100 empregados, por exemplo, que tenha demitido 10 trabalhadores e contratado nove no período poderá participar do programa, pois expandiu o seu quadro em um funcionário, ou 1%. Se contratou 11 e demitiu 15 também terá direito, pois o número de funcionários diminuiu. A expectativa do governo é que um total de 50 mil trabalhadores sejam incorporados ao programa.
Segundo o secretário- executivo da Secretaria- Geral da Presidência da República, Laudenir Müller, o objetivo da medida não é atender quem está expandindo o estoque de empregados. E sim quem está dispensando funcionários para evitar que entrem em uma “rota de demissões”.
Durante a vigência do programa, as empresas ficam proibidas de dispensar, sem justa causa, os empregados que tiverem sua jornada de trabalho temporariamente reduzida. Após o término, a estabilidade será mantida durante o prazo equivalente a um terço do período de adesão.
Outra condição para participar do programa é a realização de acordos coletivos específicos com o sindicato da categoria. O prazo começa a contar a partir da publicação da resolução com os requisitos, prevista para hoje. O programa vai vigorar até 31 de dezembro de 2016. As empresas precisam, ainda, ter no mínimo dois anos de existência e estar em dia com o pagamento de impostos e contribuições federais.
— Queremos implementar o programa com rapidez, porque ele atende, nesse momento de dificuldade, o que é fundamental para o nosso governo, que é manutenção dos empregos — disse o ministro do Trabalho, Manoel Dias.
As empresas interessadas precisam registrar o acordo coletivo no Ministério do Trabalho, para onde devem enviar também a relação dos nomes dos trabalhadores incluídos no programa. Elas podem preencher o formulário de adesão ao PPE no site oficial do Ministério, que é o coordenador do comitê criado especificamente para essa finalidade, com a participação de várias áreas de governo. Caberá à Caixa Econômica Federal realizar os desembolsos da parcela que o governo vai arcar dos salários: 15%, paga com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador ( FAT).
Assim, o valor pago pela empresa poderá ser reduzido em até 30%, mas, por causa da parcela paga pelo governo, a perda do empregado será de, no máximo, 15%. Entretanto, para quem recebe salários mais altos, a perda pode ser um pouco maior, porque a contrapartida do governo será limitada a 65% do valor da parcela do seguro- desemprego, ou R$ 900,84 em valores atuais.
Ao participar da cerimônia do anúncio das regras, o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores ( Anfavea), Luiz Moan, enfatizou que o programa vai ajudar as empresas a saírem da crise, porque os empregados vão continuar trabalhando.
— Nenhum empregador gosta de perder o seu funcionário, principalmente, aquele que é qualificado. Nós precisamos dos trabalhadores qualificados para superar a crise. E o PPE é instrumento fundamental nesse sentido — afirmou.
Ele informou que há pelo menos três montadoras em processo de negociação com os sindicatos dos trabalhadores para participar do programa. O ministro do Trabalho confirmou que tem recebido manifestações de vários setores da economia em busca de informações.
O índice escolhido para avaliar a situação financeira da empresa já é usado pelo Ministério na concessão de parcelas adicionais de seguro- desemprego. Só que, para o seguro, o cálculo é feito por setores e estados.
Para Rodolfo Torelly, do site especializado Trabalho Hoje, o método escolhido para o PPE ( situação individual da empresa) é arriscado, porque poderá beneficiar empresas em crise por má gestão.
— Acho inadequado. Deveria ser por setor e região — disse, acrescentando que a demanda deve superar a expectativa, e, em tempos de ajuste fiscal, será beneficiado quem “pedir primeiro”, pois o FAT é deficitário.
Para economistas, a medida deve beneficiar, principalmente, os setores que já sentem mais fortemente o freio no mercado de trabalho, sobretudo a indústria e a construção civil. De acordo com os dados mais recentes do Caged, a indústria de transformação acumula, em 12 meses, saldo líquido ( contratações menos demissões) negativo de 375.998 vagas. Já o setor de construção eliminou 329.288 postos de trabalho no mesmo período.
— Vai ter adesão, porque são setores que estão sangrando mais. Mas não vai conseguir evitar esse sangramento — destaca Fabio Silveira, diretor de pesquisa econômica da GO Associados.
Já Carlos Thadeu de Freitas, economista- chefe da Confederação Nacional do Comércio ( CNC), avalia que o segmento que representa não deve aderir em peso ao modelo. Nos últimos12 meses, o comércio ainda registra saldo líquido positivo de vagas, com a criação de 155,3 mil postos de trabalho. Além disso, a baixa especialização no varejo acaba favorecendo uma rotatividade mais alta, diz.
— O potencial para o comércio é muito restrito. Para serviços, pode ser que funcione razoavelmente melhor, pois a mão de obra não é facilmente substituível — afirma.
IMPACTO NAS CONTAS PÚBLICAS
Para Luís Testa, diretor de marketing da Catho Empresas, é difícil estimar o volume de adesões, já que a decisão envolve uma série de fatores. O especialista destaca, no entanto, que gestores tendem a considerar fatores que vão além do custo da folha de pagamento.
— Cada empresa vai analisar o quanto terá de impacto no curto, médio prazo. Do ponto de vista do capital humano, a tendência é sempre manter o colaborador — afirma.
O governo prevê um gasto de cerca R$ 112,5 milhões com o programa, em um prazo de seis meses, considerando um salário médio de R$ 2.500. Ex- diretor do Banco Central, Freitas pondera que o impacto nas contas públicas deve ser amenizado pela arrecadação de imposto, já que, com renda, o trabalhador pode continuar a consumir:
— Você perde de um lado, mas ganha de outro. Mantendo ele empregado, você ajuda a coletar impostos também.