Empreiteiros na fila dos condenados

21/07/2015 

Eduardo Militão
 
Ex-dirigentes da Camargo Corrêa devem cumprir pena por corrupção, lavagem e pertinência à organização criminosa. PF indicia Marcelo Odebrecht e outros sete suspeitos por suborno, fraude em licitações e branqueamento de recursos.

A Operação Lava-Jato deu mais um passo para fechar o cerco de executivos de empreiteiras suspeitas de desviar dinheiro da Petrobras. Ontem, o juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sérgio Moro, condenou três ex-dirigentes da Camargo Corrêa por corrupção, lavagem e pertinência à organização criminosa, e determinou o pagamento de R$ 50 milhões à estatal para reparação de prejuízos. A Polícia Federal ainda indiciou o presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, e mais sete pessoas por suborno, fraude em licitações, branqueamento de recursos e crime contra a ordem econômica. Enquanto a Camargo Corrêa, que teve dois executivos fechando acordo de delação premiada, disse que “tem empreendido esforços” para “sanar irregularidades”, a Odebrecht criticou o indiciamento policial, afirmando que ele não tem “fundamento sólido”.

Presos na Operação Lava-Jato em novembro, João Auler, Dalton Avancini e Eduardo Leite faziam parte da cúpula da Camargo Corrêa até o mês passado. Sérgio Moro ainda condenou o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, o doleiro Alberto Youssef e o policial Jayme “Careca” Alves. Entre os absolvidos, está o dono da fornecedora de tubos Sanko Sider, Márcio Bonilho, e Adarico Negromonte, irmão do ex-ministro das Cidades Mário Negromonte.

A denúncia do Ministério Público foi feita em 11 de dezembro do ano passado, menos de um mês depois de a Polícia Federal colocar cerca de 30 executivos e empreiteiros na cadeia na Operação Juízo Final. A acusação diz que executivos da Camargo Corrêa, integrante de um cartel de empresas formado para combinar licitações e fraudar certames da Petrobras, pagaram pelo menos 1% de propinas para Paulo Roberto para obter contratos nas refinarias de Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco, e Getúlio Vargas (Repar), no Paraná. Para fazer os pagamentos, a empreiteira simulou compra superfaturada de tubos da Sanko Sider. Depois, a fornecedora fechava contratos de consultoria com empresas de fachada ligadas ao doleiro Alberto Youssef.

Em sua sentença, o juiz Sérgio Moro destacou que o esquema era sustentado por agentes políticos que mantinham diretores corruptos na estatal de petróleo. “Surgiram, porém, elementos probatórios de que o caso transcende à corrupção — e lavagem decorrente — de agentes da Petrobras, servindo o esquema criminoso para também corromper agentes políticos e financiar, com recursos provenientes do crime, partidos políticos”, contextualizou o magistrado. Políticos são alvo de inquéritos e ações penais em Curitiba e em Brasília, no Supremo Tribunal Federal. “Aos agentes políticos cabia dar sustentação à nomeação e à permanência nos cargos da Petrobras dos referidos diretores. Para tanto, recebiam remuneração periódica.”

O juiz Sérgio Moro rejeitou a tese das defesas de que os delatores foram coagidos a confessar crimes e acusar outras pessoas injustamente. Ele lembrou que o Supremo Tribunal Federal foi quem homologou as colaborações de Paulo Roberto e Youssef, por exemplo. “Além de inconsistente com a realidade do ocorrido, é ofensivo ao Supremo Tribunal Federal, que homologou os acordos de colaboração mais relevantes, certificando-se previamente da validade e voluntariedade”, disse o magistrado na sentença, proferida no fim da manhã de ontem.

Documentos
As provas dos crimes não se basearam apenas em depoimentos, mas em documentos, como contratos e transferências bancárias. “Resta provado, como apontado, que a Camargo Corrêa, em decorrência de sua participação no cartel de empreiteiras e no ajuste fraudulento de licitações, pagou propina à diretoria de Abastecimento da Petrobras com dinheiro proveniente dos antecedentes crimes de cartel e de ajuste de licitações, ocultando e dissimulando sua origem e natureza, o que caracteriza corrupção ativa e lavagem de dinheiro”, julgou Sérgio Moro.

A sentença foi contra executivos e não a pessoa jurídica da Camargo Corrêa. Entretanto, Moro recomendou na sentença que a empreiteira busque fazer acordos de colaboração e leniência com o Ministério Público, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Petrobras. Para o juiz, os acordos “talvez sejam a melhor solução para as empresas considerando questões relativas a emprego, economia e renda”. A Camargo Corrêa disse em nota que, desde que soube das investigações, adota medidas para identificar e corrigir irregularidades, “reforçando sua governança corporativa e sistemas de controle”.

Os advogados de Avancini e Leite disseram que a sentença atendeu às expectativas do acordo de delação firmado. A reportagem não localizou a defesa dos demais réus.

A lista
Confira as sentenças da Lava-Jato até agora:

João Auler, ex-presidente do Conselho da Camargo.
Corrupção ativa e pertinência a organização criminosa.
Pena: 9 anos e meio de prisão e multa de R$ 627 mil.

Dalton Avancini, ex-presidente.
Corrupção ativa, lavagem e pertinência à organização.
Pena: 15 anos e 10 meses de prisão e 355 dias-multa. Convertido* em penas alternativas e multa de R$ 2,5 mi.

Eduardo Hermelino Leite, ex-vice.
Corrupção ativa, lavagem e pertinência à organização. Pena: 15 anos e 10 meses de prisão e 265 dias-multa. Convertida* em penas alternativas e multa
de R$ 5,5 milhões.

Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras.
Corrupção passiva, lavagem.
Pena: 12 anos de prisão e 315 dias-multas. Convertida* em penas alternativas e mais multa de R$ 50 milhões.

Alberto Youssef, doleiro.
Corrupção passiva.
Pena: 5 anos de prisão e 165-dias multa. Convertida* em penas alternativas mais multa de R$ 50 milhões.

Jayme Alves de Oliveira, policial federal.
Lavagem.
Pena: 11 anos e 10 meses de prisão,
mais multa de R$ 711 mil.

Absolvidos
Adarico Negromonte, irmão do ex-ministro das Cidades Mário Negromonte
Márcio Bonilho, dono da Sanko Sider
Waldomiro de Oliveira, dono da MO Consultoria**

*Fez acordo de delação e a pena foi reduzida a prisão domiciliar, às vezes com penas alternativas.
*Não foi condenado porque seu caso depende de avaliação em outro processo.

Lula e Cunha são citados
A Polícia Federal indiciou o presidente da empreiteira Odebrecht, Marcelo Bahia Odebrecht, por corrupção ativa, fraude em licitação, lavagem de dinheiro e crime contra a ordem econômica. O delegado Eduardo Mauat ainda pediu a manutenção da prisão preventiva dele e dos ex-executivos da construtora Alexandrino Alencar Rogério Araújo, Márcio Farias e César Ramos. Ao todo, a polícia indiciou oito pessoas, incluindo Celso Araripe, Eduardo Freitas e João Bernardi.

O delegado da Operação Lava-Jato destacou em relatório parcial à 13ª Vara Federal de Curitiba que Marcelo Odebrecht participou das condutas criminosas apuradas. Uma evidência seriam anotações apreendidas no calendário de seu telefone celular, em que ele menciona o nome de “Lula” e “ECunha”. “Podemos constatar referências a nomes de autoridades públicas, doações e ‘pagtos. diretos’, influência junto de instituições (inclusive o Judiciário)”, afirmou ele. Marcelo “desce a detalhes” quanto a sua “postura diante de irregularidades”, escreve o delegado. E cita mensagens do executivo sobre não movimentar valores, “higinizar apetrechos” de pessoas identificadas pelas siglas MF e RA, “vazar doação de campanha”. “GA, FP, AM, MT, Lula? ECunha?”, continua o texto de Marcelo Odebrecht. O relatório da PF não informa a data da anotação.

Outra evidência seria um e-mail a respeito de “sobrepreço” de pelo menos R$ 25 mil em um navio-sonda, apontado em uma mensagem de correio eletrônico para o presidente da empresa. “Além do caso específico das sondas, o material trazido aos autos aponta para o seu conhecimento e participação direta nas condutas atribuídas aos demais investigados, tendo buscado, segundo se depreende, obstaculizar as investigações.”

A Odebrecht disse que já esperava o indiciamento. Os esclarecimentos oficiais devem demorar um pouco mais. “As defesas de Marcelo Odebrecht, Marcio Faria, Rogerio Araújo, Alexandrino Alencar e Cesar Rocha aguardarão a oportunidade de exercer plenamente o contraditório e o direito de defesa.” (EM)