Valor econômico, v. 16, n. 3793, 08/07/2015. Opinião, p. A10

 

Plano Nacional de Educação ainda avança com tropeços

 

Nos últimos dias, Estados e municípios se envolveram em uma verdadeira corrida para elaborar suas metas e estratégias para a educação nos próximos dez anos, conforme foi estabelecido pelo Plano Nacional de Educação (PNE), que entrou em vigor em 2014. Um dia antes do fim do prazo, apenas quatro Estados e 41% dos 5.570 municípios do país haviam aprovado seus planos. Na data final, 11 Estados e pouco mais de 70% dos municípios estavam em dia. Agora, duas semanas depois, o número de Estados pouco mudou, subindo para 13; e o percentual de municípios em dia com o compromisso passou para 83%.

A produção dos planos locais de educação era uma dos objetivos estabelecidos pelo PNE, sancionado em 25 de junho do ano passado, que possui 20 metas e estratégias para o setor nos próximos dez anos, entre as quais aumentar o investimento no setor para 10% do Produto Interno Bruto (PIB) em comparação com os 5,6% atuais.

Muitos Estados e municípios deixaram a tarefa para a última hora e só cumpriram o prazo por causa da pressão do Ministério da Educação, do temor de não ter acesso aos recursos federais sem o plano, e da distribuição de um modelo para ser replicado, o que bate de frente com a ideia de que cada comunidade deveria ter discutido os objetivos e características que desejavam para a educação conforme as particularidades locais, o que alimentou a pesada artilharia dos críticos do modelo.

Foram vários os problemas enfrentados, desde a dificuldade de reunir professores, pais e alunos para o debate, que deveria passar por temas polêmicos como o número de alunos por sala e por professor, até a valorização da carreira e salário dos docentes.

O episódio da elaboração dos planos e metas estaduais e municipais de educação é apenas um sinal de que o PNE caminha com dificuldades. Apesar de ter sido sancionado há um ano, ainda é alvo de críticas, como as dirigidas à proposta de criação do Sistema Nacional de Educação e a fragilização do federalismo, com o risco de aumento da burocracia e do centralismo, o que revela a ausência de debate na sua concepção.

A Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que reúne quase uma dezena de entidades, entre as de trabalhadores do setor e organizações civis, reclama de pontos que ainda não saíram do papel e de falhas de implementação, lembrando que o PNE é uma legislação encadeada, em que cada medida prevista depende do cumprimento de uma anterior (Valor, 24/6). O fato de o MEC ter tido três ministros de janeiro a abril certamente influencia os tropeços e reforça a tese de que o lema "Brasil, pátria educadora" precisa ir muito além do marketing.

Foi polêmica também a intervenção da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) na área. A pedido da própria presidente, o ministro da pasta, Mangabeira Unger, elaborou o documento "Pátria educadora", com uma série de propostas, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) on-line, a utilização de tecnologias em sala de aula, a criação de uma variação do Programa Universidade para Todos (ProUni), o programa de concessão de bolsas de estudo para estudantes de pedagogia e de licenciatura e a premiação de professores que atingirem determinado desempenho. Independente do mérito das propostas, especialistas em educação notaram que o documento nem sempre trilha o caminho do PNE, que deveria ser reforçado.

O Movimento Todos pela Educação, organização civil que acompanha cinco metas do setor para 2022, acaba de divulgar um balanço que deixa a desejar. Segundo o levantamento, o Brasil ainda precisa incluir 2,9 milhões de crianças e adolescentes na educação básica e apenas 54% dos jovens concluem o ensino médio até os 19 anos - nos dois casos, a meta é chegar a 100% em 2022.

Ainda há um longo caminho para se atingir a meta de tornar toda criança plenamente alfabetizada até os 8 anos porque provas constataram que apenas 44,5% dos alunos do terceiro ano do ensino fundamental têm proficiência desejável em leitura, 30,1% em escrita e 33,3% em matemática.

O inquietante é que, apesar desses números, a meta referente ao investimento público em educação básica não está tão distante do estabelecido para 2022, que é atingir 5% ou mais do PIB. Houve avanço nesse ponto em comparação com os 3,2% de 2000 para os 4,7% atuais. Mas os dados de desempenho não tiveram evolução comparável.