Retorno da CPMF vai aumentar carga tributária para 36% do PIB

 

A volta da CPMF, com uma alíquota próxima aos 0,38% cobrados à época de sua extinção, deve retirar mais R$ 40 bilhões por ano da economia e elevar a carga tributária do país de 35% para 36% do Produto Interno Bruto (PIB). A projeção é do advogado e professor de Tributação e Finanças Públicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), Fernando Zilvetti. Segundo ele, se aprovada, a medida trará mais pressão sobre a inflação:

— A ideia de restituir a CPMF é mais uma tentativa do governo de repassar a conta da sua incompetência na gestão pública para o contribuinte. É muito triste para quem está tentando reconquistar a confiança dos investidores. No dia seguinte ao reconhecimento de que ele, governo, é responsável pela crise, passa-se mais uma conta aos cidadãos.

‘ASSÉDIO FISCAL’

Para o tributarista, os ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento) deveriam ser processados por “assédio fiscal”.

— É uma falta de responsabilidade dos agentes de política fiscal, Levy e Barbosa, que, em vez de cortar gastos, extinguir ministérios e cargos comissionados, fazem o contrário e aumentam ainda mais a carga tributária. Eles deveriam ser processados por assédio fiscal — afirma.

Fábio Klein, analista de finanças públicas da Tendências Consultoria, vê na volta da CPMF uma “situação de desespero” da equipe econômica, já que as despesas estão crescendo em termos reais (acima da inflação) enquanto a receitas caem a um ritmo maior do que o PIB. De janeiro a julho, diz, as despesas do governo avançaram 0,4% além da inflação, ao passo que a receita encolheu 2,7% em termos reais.

— O governo está desesperado para encontrar meios de controlar suas contas, pois há uma retração fortíssima de receitas com despesas que, mesmo com os ajustes já feitos (como nas pensões previdenciárias e no seguro-desemprego), crescem acima da inflação. Essa é a realidade e a razão do desespero — diz.

Para o diretor de políticas e estratégia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), José Augusto Fernandes, a decisão prejudica a competitividade da indústria e “é um contrassenso”.

— É muito mal vinda. Distorce a competitividade. É um contrassenso na medida em que, de um lado, estão buscando eliminar a cumulatividade do Pis/Cofins e, de outro, recria a CPMF. Isso mostra uma dificuldade enorme do Brasil de ter um sistema tributário de classe mundial e que a elevação da carga no Brasil é anticrescimento — analisa.

Humberto Barbato, presidente da Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica), diz que, “no atual nível de atividade, tirar mais dinheiro da produção para jogar na máquina pública é, sem dúvida, querer diminuir ainda mais o ritmo da economia”.

—É a típica medida anticíclica — ironizou ele, completando: —Precisamos fazer a economia girar, e isso (a CPMF) faz a economia desacelerar ainda mais. Não faz nenhum sentido e é inaceitável que se pense numa hipótese como essa nesse momento.

‘MERCADO DE CAPITAIS DESTRUÍDO’

Já o presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto, disse não ver razão para a volta do imposto.

— A CPMF, quando foi adotada no passado, destruiu o mercado de capitais. Espero que o governo, se adotar novamente a CPMF, tenha sensibilidade para olhar para trás e ver o que aconteceu — disse, durante o Congresso Internacional de Mercados Financeiro e de Capitais.

Para José Velloso, presidenteexecutivo da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), “é muita burrice” cogitar a volta da CPMF. Segundo ele, num contexto de forte recessão, desemprego e inadimplência em alta, recriar um imposto com tantos “vícios” deveria ser impensável:

— É um tributo injusto, que pune os mais pobres. Para a indústria é cumulativo, e as empresas que já têm tantos problemas para pagar as obrigações tributárias, pagarão ainda a CPMF sobre todas elas. É uma atitude burra que só vai piorar a recessão.

 

Governadores querem recursos para a saúde

 

Vários governadores se manifestaram a favor da CPMF, desde que ela seja dividida com estados e municípios e destinada, principalmente, a investimentos em áreas como a saúde. O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, é um deles. Para ele, a contribuição poderia ser um caminho para custear o Sistema Único de Saúde (SUS):

ANDRÉ COELHOPezão. O governador do Rio defende que CPMF ajude a financiar o SUS

— Saúde custa caro, cada vez mais precisa de recursos. Acredito que o país tem de encontrar uma fonte para custear o setor.

Pezão diz ser favorável à volta da CPMF se houver garantias legais de que esses recursos serão compartilhados com estados e cidades, o que, segundo ele, está nas mãos do Congresso Nacional.

Para Eduardo Paes, prefeito do Rio, a CPMF é um “imposto simples, que dispensa fiscalização”. Mas faz uma ressalva:

— A gente não pode ter mais uma vez criação de impostos com a concentração da arrecadação na União. A União já arrecada 70% dos impostos no Brasil. Então, não é ruim voltar a CPMF, mas isso tem de seguir com equilíbrio para não aumentar a carga tributária.

O governador de Minas, Fernando Pimentel, acredita que, se a CPMF for dividida com cidades e estados, ela ajudará a resolver “uma iminente crise financeira” desses entes:

— Não vejo nenhuma contradição. Vejo que, neste momento, pode contribuir para ajudar a resolver o problema financeiro da União, estados e municípios.

Rodrigo Rollemberg, governador do Distrito Federal, diz que “todos os estados enfrentam esse problema” (do financiamento da saúde) e defende a CPMF como alternativa. O governador do Maranhão, Flávio Dino, engrossa o coro dos que defendem que os recursos sigam para a saúde, mas quer que a discussão vá além:

— Defendo um cesta de alternativas que incluam também o reajuste da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) para bancos, imposto sobre grandes fortunas (acima de R$ 2 milhões ou R$ 3 milhões) e regulação do seguro DPVAT.

OUTRO LADO

Já o governador pernambucano, Paulo Câmara, declara-se contra aumento de carga tributária, mas diz ser necessário analisar quais setores serão beneficiados. Ele defende que a CPMF seja uma “alternativa a favor do Brasil, não só uma medida paliativa”. Ricardo Coutinho, da Paraíba, porém, é taxativo.

— Sou contra. O governo tem de ter capacidade de investimento — afirmou.

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, o prefeito da capital paulista, Fernando Haddad, e o governador de Alagoas, Renan Filho, não retornaram as ligações da reportagem.