Valor econômico, v. 16, n. 3803, 22/07/2015. Opinião, p. A10

 

Recessão avança e país tem pressa para concluir ajuste

 

O primeiro semestre terminou sem nenhum sinal de recuperação da atividade econômica. Ao contrário. Poucos indicadores de junho são conhecidos até agora, mas as 111 mil demissões líquidas do mês são um sinal evidente de que a recessão está se aprofundando. A última vez em que o mês de junho registrou corte de empregos formais foi em 1992, há 23 anos. E essa também foi a primeira vez que o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) encerrou junho com corte de vagas no setor de serviços.

O ajuste do mercado de trabalho demorou, mas agora já é percebido como mais consistente inclusive pelo Banco Central. Na segunda-feira, o diretor de assuntos internacionais do Banco Central, Tony Volpon, em evento em São Paulo, disse que "o mercado de trabalho não estava respondendo à atividade, mas agora está".

Até agora, nas atas de suas reuniões, o Comitê de Política Monetária (Copom) havia registrado a "distensão" do mercado de trabalho com a ponderação de que "é preciso ampliar o horizonte de observações, e que ainda prevalece risco significativo relacionado, particularmente, à possibilidade de concessão de aumentos de salários incompatíveis com o crescimento da produtividade, com repercussões negativas sobre a inflação".

A resposta do mercado de trabalho ao ajuste em curso na economia aparece não apenas no emprego, mas também no elemento que afeta mais diretamente a inflação: o poder de compra. Dois indicadores de renda apontam uma inédita queda no salário nominal. Nos 12 meses encerrados em maio, tanto a Pesquisa Mensal de Emprego, que é amostral e entrevista a população das seis maiores regiões metropolitanas do país, como a Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário (Pimes), que recolhe informações da indústria brasileira, mostraram que os salários já perdem para a inflação.

Os salários perdem não apenas porque a inflação está maior, mas porque a correção nominal dos rendimentos diminuiu. Em maio do ano passado, enquanto a inflação em 12 meses estava acumulada em 6,1%, os salários no mesmo período haviam subido 8,7%. Agora, a inflação está maior - 8,76%, pelo INPC - mas o reajuste acumulado também diminuiu e ficou em 7,5%, considerando-se os 12 meses encerrados em maio. Na PME, o rendimento nominal em maio estava acumulado em 7,7%, também abaixo da inflação do período.

Parte desse menor aumento nominal dos salários reflete o corte de vagas mais qualificadas, movimento que no presente achata o rendimento médio, mas no futuro resultará em retomada mais lenta da produtividade. Reforçando o ajuste do mercado de trabalho, as negociações salariais em curso enfrentam maior dificuldade para garantir aumentos acima da inflação e também mostram que o aumento real já é, em média, metade daquele concedido no ano passado.

Esse ajuste tem duas facetas. Ele é importante para a desinflação da economia porque reduz a demanda. Do outro lado desse ajuste, contudo, estão famílias que perderam renda e estão, depois de muitos anos, relembrando o significado da palavra desemprego. Também estão eleitores que, descontentes, retiram apoio do governo. Ontem, a pesquisa CNT/MDA mostrou que apenas 7,7% avaliam positivamente o governo da presidente Dilma Rousseff.

Momentos de ajuste são momentos de escolhas difíceis. A política econômica mudou, mas a aposta de que o segundo semestre já traria os primeiros sinais de retomada da confiança e que a atividade começaria a sair do fundo do poço não se confirmou. Como no dilema para saber quem veio primeiro, o ovo ou a galinha, a crise política e a econômica se alternam no noticiário negativo e uma realimenta a outra.

Se o governo fraco e a incerteza gerada pelas diferentes disputas de poder em Brasília aumentam a insegurança de empresários e investidores sobre o futuro, nenhum político quer assumir a paternidade do ajuste recessivo. Talvez por isso sua face mais conhecida seja a do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que não pertence ao Partido dos Trabalhadores (PT). Talvez pela mesma razão o Congresso tenha contribuído mais em aumentar despesas que em cortá-las.

No meio desse embate, é o país que tem pressa de concluir o ajuste e voltar a crescer e gerar empregos.