O gargalo do nafta

 

Já se vão mais de dois anos desde que a Petrobras, a única produtora de nafta no país, denunciou o contrato de fornecimento da principal matéria-prima utilizada pela indústria química e petroquímica, alegando a necessidade de fixar preços e condições mais realistas. O fornecimento às centrais petroquímicas só não foi interrompido em razão de sucessivas prorrogações de curta duração e mediante preços em aberto, passíveis de reajuste retroativo a ser definido quando de um acordo definitivo. Assim, o setor permanece com uma espada sobre a cabeça e os investimentos paralisados.

Algum observador menos atento às consequências dos adiamentos poderia até desculpar a demora. Mas certamente se espantaria ao perceber que muitos dos atuais desafios enfrentados pelo setor petroquímico, especialmente o da falta de uma nafta competitiva, aguardam por soluções há meio século. Em caso de dúvida, basta ler o artigo “As oportunidades perdidas”, do ex- ministro do Planejamento, do governo Castello Branco, Roberto Campos, publicado em 17 de outubro de 1967 no GLOBO.

Em sua análise, Campos começa por lamentar que o Brasil, mesmo contando com o maior mercado da América Latina, tenha perdido a liderança petroquímica regional que ostentava uma década antes, sendo superado pela Argentina e pelo México, além de estar prestes a ser alcançado por Venezuela, Colômbia e Chile. Cita como um dos motivos do atraso “a indisponibilidade da melhor matéria-prima, o gás natural”.

Antes de prosseguir com a análise do ex-ministro, cabe abrir parênteses para reconhecer que a situação do Brasil mudou radicalmente desde então. Não faz muitos anos, chegamos a anunciar nossa autossuficiência na produção de petróleo e as reservas do pré-sal começaram a ser exploradas.

Mas nem tudo são flores nesse campo, especialmente porque a modesta expansão da capacidade de refino, de apenas 4% nos últimos dez anos, inviabilizou aumento significativo da oferta de derivados. Assim, o país, antes exportador de gasolina, passou a importar o combustível diante da forte elevação do consumo — 63% apenas nos últimos cinco anos — provocada pelo preço subsidiado ao consumidor final. Além disso, a Petrobras passou a destinar à produção de gasolina parte da nafta que fornecia à cadeia petroquímica, substituindo-a pela importada, insistindo em transferir os custos dessa operação ao setor. Pressionada pela petroquímica americana, que tem no gás de xisto matéria-prima quase quatro vezes mais barata que a nafta, a petroquímica brasileira não tem como arcar com essa conta.

Fechado o parênteses, voltemos à análise de Roberto Campos. “Seria de imaginar-se”, disse, “um senso de urgência para cortar as amarras e acicatar os investidores à la recherche du temps

perdu.” Contudo, não é o que assistimos hoje, pois a renovação temporária e de curto prazo do contrato de nafta impede qualquer planejamento de investimento de uma indústria que é, por natureza, de longo prazo.