Dilma discute crise econômica em jantar com empresários

 

A presidente Dilma Rousseff se reuniu por quatro horas com sete empresários pesos-pesados da economia brasileira para analisar a crise internacional e debater medidas para a retomada do crescimento do país. Na conversa, na noite de terça-feira, Dilma reconheceu que o Brasil vive um momento difícil e que não dá mais para minimizar os efeitos da crise na economia local, mas defendeu união para superar este momento. A presidente demonstrou especial preocupação com os desdobramentos da situação da China.

GIVALDO BARBOSA/24-08-2015Dilma. Presidente demonstrou disposição para compreender a fundo os problemas do governo, afirmou um empresário

Estavam no encontro, no Palácio da Alvorada, os empresários Luiz Carlos Trabuco (Bradesco), Cledorvino Belini (Fiat), Benjamin Steinbruch (CSN), Joesley Batista (JBS), Rubens Ometo (Cosan), Edson Bueno (Dasa) e Josué Gomes (Coteminas). O jantar não foi divulgado na agenda da presidente, segundo o Palácio do Planalto, porque o gabinete pessoal da presidente considerou que essa foi uma atividade de caráter privado.

O jantar foi organizado pelo gabinete pessoal, pela Casa Civil e pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). Os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil) e Armando Monteiro Neto (MDIC) acompanharam a presidente.

— Se eu pudesse resumir a mensagem dela, é o seguinte: olha, estamos vivendo um momento difícil em que há várias questões que estão aí colocadas. Não adianta querer de alguma forma minimizá-las porque existem dificuldades reais, mas nós temos que sair disso, porque o objetivo da política econômica é a retomada. E nós temos que sair todos juntos e todos têm que ajudar — contou Monteiro.

Os empresários, segundo um dos participantes, reafirmaram o compromisso com a estabilidade e apresentaram uma série de propostas para melhorar a governabilidade. Eles disseram à presidente que a indústria liquidou o estoque e avalia que, até o fim do ano, haverá uma melhora na economia, com aumento das vendas. Monteiro disse que os empresários manifestaram confiança no país e consideraram o encontro “muito bom”.

— Ninguém manifestou uma posição de falta de confiança. Todos, evidentemente, querem ver o Brasil superar estas dificuldades que estão aí colocadas. Acho que o diálogo com outros setores da sociedade (porque o setor empresarial dialoga em outras direções) também é um diálogo com o Congresso. E é importante que todos nesta hora possam dar uma contribuição para que a gente possa sair o mais rápido possível desta dificuldade.

DILMA ‘MAIS OUVIU DO QUE FALOU’

O ministro disse que a conversa foi franca e produtiva. Ele destacou que Dilma, além de ouvir os empresários com atuação nacional, também tem se reunido com os que atuam regionalmente, para analisar as questões peculiares a cada estado. Nas últimas semanas, por exemplo, a presidente se reuniu com empresários de Pernambuco e da Bahia.

— O clima foi muito bom. A presidente mais ouviu do que falou. Acho que da conversa você termina extraindo questões muito válidas não só para entender o que está acontecendo na economia real a partir da visão dos próprios agentes econômicos, que têm uma inserção real nestas áreas, como também pode alinhar percepções do cenário, sobretudo agora que há elementos no contexto internacional (China) que projetam muitos elementos de preocupação e, em alguns casos, de incertezas — disse Monteiro.

Segundo um dos empresários que participou do encontro, Dilma realmente “falou pouco e ouviu muito”, o que foi interpretado como ótimo sinal pelos participantes. A presidente passou a impressão de ter disposição para compreender a fundo os problemas que seu governo está enfrentando, o que também foi considerado positivo pelos empresários.

O ministro disse ainda que Dilma abordou com os empresários a situação da China:

— Ela colocou uma preocupação que o resto do mundo está tendo e que hoje está presente na avaliação de todos ambientes. Não se conhece a extensão deste processo numa economia com as características da China. Mas é um elemento muito importante a se acompanhar e monitorar.

 

‘Eles destruíram as finanças pela reeleição’

 

Oeconomista e ex-ministro Delfim Netto afirmou ontem que ficou “espantado” com as declarações da presidente Dilma Rousseff, que, na terça-feira, reconheceu em entrevistas ter demorado para perceber a gravidade da crise econômica, e que “2016 não será uma maravilha”. Segundo o ex-ministro, até 2013 o país não enfrentava grandes problemas econômicos, mas, em 2014, o atual governo decidiu destruir as finanças públicas deliberadamente para conseguir a reeleição.

MICHEL FILHO/17-03-2014Espanto. Delfim fez críticas às declarações de Dilma

— Até 2013, você não tinha grandes problemas (nas finanças). Havia alguma orientação equivocada. Mesmo as finanças públicas, que apresentavam um déficit de 3% do PIB, e a dívida pública representando 53% do PIB não eram nada trágico. Mas, em 2014, foi uma coisa deliberada. Eles destruíram as finanças públicas deliberadamente para obter a reeleição — disse Delfim Netto, durante o seminário “Repensando o Desenvolvimento Produtivo no Brasil”, da Fundação Getúlio Vargas, que contou a presença do ministro Roberto Mangabeira Unger, da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (Sae).

Delfim, que se tornou um dos conselheiros dos governos do PT desde a eleição de Lula, em 2003, disse que, apesar de a crise econômica ter sido criada para viabilizar mais um mandato, não pode se queixar da presidente Dilma, “uma pessoa inteligente”.

— O primeiro dever do governo é continuar governo seja lá como for, porque é a única forma de corrigir os erros que já foram feitos e poder fazer outros — justificou o ex-ministro, acrescentando que Dilma lhe lembrou o “velho” filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900), que dizia que “as piores mentiras são as que contamos para nós mesmos. As que contamos para os outros não têm importância”.

Apesar das críticas, Delfim se mostrou otimista em relação ao futuro da economia brasileira Segundo ele, desde José Bonifácio (1763-1838), todos os governos do país se comprometeram a controlar despesas, inclusive ele mesmo, quando foi ministro da Fazenda (entre 1967 e 1974), e mesmo assim o país viveu mais de 20 crises, “iguais a essa que estamos vivendo”.

— Com todo o controle das despesas, tivemos umas 20 crises, ou 30, iguais a essa que estamos vivendo, e qual é a surpresa? Somos hoje a sétima economia do mundo, com 200 milhões de habitantes, e o quadro final não é tão ruim quanto parece. Mais do que isso, tivemos momentos que incluem praticamente 50 anos de crescimento a 6,5%. Tínhamos defeitos como o da distribuição de renda, mas todos melhoraram — disse.

 

Base governista na Câmara sugere áreas para gastos

 

Na contramão do ajuste fiscal, um grupo de deputados da base governista apresentou ontem um documento com sugestões à ‘‘Agenda Brasil’’ nas quais pedem garantias de “não contingenciamento” do orçamento para as áreas de saúde, educação e pesquisa científica. Além disso, o documento, intitulado ‘‘Pauta da Virada’’, ressuscita o tema do controle da mídia, que havia sido enterrado pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Em um ponto sobre direitos civis, os parlamentares pedem ‘‘o aperfeiçoamento da legislação sobre meios de comunicação com medidas efetivas contra concentração econômica”.

Deputados de 15 partidos (PCdoB, PROS, PSL, PT, PSD, PMN, PRB, PRP, PTC, PP, PRTB, PTdoB, PR, PSDC e PTN) assinaram o documento. Vários deles deixaram transparecer que sequer haviam lido a pauta apresentada à imprensa. A “Pauta da Virada’’ foi articulada pelos líderes do governo José Guimarães (PTCE) e Jandira Feghali (PCdoB-RJ).

CUNHA FAZ CRÍTICAS

Guimarães negou que o pacote vá provocar gastos extras aos cofres públicos. Ele disse que todos os pontos da proposta serão analisados antes de votados, para evitar novas despesas do governo. A ‘‘Agenda Brasil’’ foi o marco da reaproximação do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), com o Planalto. O pacote não foi combinado com Cunha, que criticou a iniciativa. Ele afirmou que tudo deveria ser negociado com a Câmara e que muitas das propostas não eram efetivas, serviam apenas de “espuma”.

Cunha também não foi consultado sobre o documento apresentado ontem. Ele voltou a minimizar a importância da “Agenda Brasil’’. Segundo o presidente da Câmara, o colégio de líderes deve atuar em cima de projetos, em vez de tratar de hipóteses.

— A gente não vota agenda, vota projetos. O que tiver de projeto e for consensual no colégio de líderes, ou pelo menos tiver o apoio da maioria, dá para votar sem problema algum. Os líderes discutem agenda toda reunião. Para mim, não há qualquer dificuldade, votaremos as pautas que os deputados entendem que estão prontas para serem votadas. A que são temas, que façam projetos e os tragam. Eu não trato de hipóteses; trato de fatos, de projetos e medidas provisórias — provocou Cunha.

LEVY DEFENDE VERBA PARA EMENDAS

Um dia depois de o governo anunciar a liberação de R$ 500 milhões em emendas parlamentares, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, disse que ‘‘esse tema está evoluindo bem’’. Segundo ele, não falta dinheiro para pagar emendas de deputados e senadores.

— A gente não tem exatamente falta de recursos em relação a emendas. Há algum tempo, a gente fez um decreto que tirava alguns recursos dos ministérios e os redistribuía para responder a algumas demandas específicas. Agora, na parte das emendas impositivas, temos avançado bem, uma boa parte vem sendo executada. Eliseu Padilha (ministro da Aviação, responsável pela articulação política) organizou muito bem esse processo e isso facilita, porque todo mundo fica sabendo o que está acontecendo — afirmou Levy, após participar de uma reunião com o vice-presidente Michel Temer.