Brasil perde 111 mil empregos em junho

18/07/2015 
Alessandra Azevedo

No mês passado, mercado formal de trabalho teve o pior desempenho para o período desde 1992. Com a economia em franca retração, empresas já eliminaram 345 mil vagas neste ano; nos últimos 12 meses, o número de chega a 601 mil.

“A situação do mercado de trabalho não é só desanimadora, mas catastrófica.” A declaração do professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB) Carlos Alberto Ramos é confirmada pelos dados mais recentes do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que reflete o mercado formal, divulgados ontem pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Somente no mês passado, foram eliminadas 111,2 mil vagas com carteira assinada em todo o país, o pior desempenho para junho desde o início da série histórica, em 1992.

O resultado, apesar de ruim, não foi surpreendente. “A tendência tem sido péssima, não há como ser otimista. Não há como fugir do crescimento da taxa de desemprego e da informalidade”, lamentou o professor. O que tem sido visto é um ciclo vicioso: com o Produto Interno Bruto (PIB) caindo — especialistas já lançam previsões de queda de 2% para 2015 — e a inflação a quase 9%, as pessoas ficam mais cautelosas na hora de fazer compras. A consequência é que o comércio não vai para a frente, e os empregos param de crescer. “Até o começo do ano, ainda havia empregadores que, mesmo temerosos, retinham os funcionários. Mas, com o momento de ajuste, eles não estão mais tendo condições de mantê-los”, explicou.

Desconfiança

A consequência desse processo é dramática: desde o início de 2015, as empresas já cortaram 345 mil empregos; nos últimos 12 meses, foram 601 mil postos eliminados. Mesmo se o PIB contrariar as previsões e voltar a apresentar crescimento nos próximos meses — o que é pouco provável, segundo Ramos —, a situação só deve começar a melhorar a partir de 2017. “É um processo que demora, porque é necessário recuperar a confiança dos empregadores. Eles precisam perceber que há um novo ciclo de crescimento para voltarem a contratar”, explicou. Para ele, até o fim do ano, o número de vagas perdidas deve chegar, pelo menos, a 1 milhão.

O especialista em mercado de trabalho Rodolfo Peres Torelly, ex-diretor do Departamento de Emprego e Salário do MTE, vai além. A projeção dele é que sejam perdidos 1,24 milhão de empregos até dezembro. Se confirmado, será o maior deficit anual de empregos formais medido pelo Caged desde o início da série histórica. “Isso se a situação continuar mais ou menos como está, porque, se piorar, deve cair ainda mais. Estamos caminhando para isso”, ressaltou. Para ele, o fato de que junho costuma ter sazonalidade positiva torna a situação alarmante. “O período de maio a setembro costuma ser de saldo positivo no emprego”, disse. Isso porque começa a arrancada comercial para o segundo semestre, com férias e festas de fim de ano.

Torelly enfatizou que, neste ano, foi a primeira vez que junho registrou saldo negativo registrado no Caged. “Em média, o mês dava resultado positivo de cerca de 200 mil vagas. Nunca houve um número tão ruim”, afirmou. Com o acesso ao seguro-desemprego dificultado pelas mudanças recentes nas regras, o quadro fica ainda mais preocupante. “A maioria das pessoas que perderam emprego são chefes de família, com dependentes. Levando isso em conta, pelo menos 400 mil pessoas ficaram sem fonte de rendimento em junho.”

Entre os setores que puxaram o saldo de empregos para baixo estão a indústria de transformação, que perdeu 64 mil vagas, e a construção civil, com menos 24 mil postos de trabalho. No setor industrial, o maior destaque negativo foi a metalurgia, que fechou 9.027 postos. “Esses setores são os primeiros afetados pela crise. Serviços e comércio, que também estão tendo queda, derivam desses dois”, explicou Torelly. O setor de serviços fechou o mês com 39 mil vagas a menos, puxada pelas atividades de comércio e administração de Imóveis (21 mil a menos). Com a confiança baixa, os brasileiros não estão investindo em imóveis, por ser um gasto de longo prazo que as pessoas não estão dispostas a fazer em um momento de incerteza.

Dos oito setores avaliados pelo Caged, apenas a agropecuária aumentou o número de postos de trabalho, por questões sazonais. Foram criadas 44 mil vagas em junho, 2,83% a mais que no mês anterior. Explicado pelo cultivo do café, o resultado também foi superior a junho do ano passado, que registrou aumento de 40 mil vagas. Além disso, na contramão do setor de serviços, apesar de fazerem parte dele, as instituições financeiras e os serviços médicos e odontológicos tiveram crescimento.

Outro lado positivo, segundo Torelly, é que a rotatividade continua alta, apesar da crise. “É um bom sinal, de que ainda está entrando gente e não apenas saindo”, avaliou. No entanto, para retornar ao mercado de trabalho, as pessoas estão precisando aceitar condições menos favoráveis e salários mais baixos. “O resultado deste ano é muito triste. O momento é adverso e a situação continua se agravando. Ainda não chegamos ao fundo do poço.”, resumiu o especialista.


Crise pode encerrar alta de juros

Economistas acreditam que o elevado saldo negativo de empregos em junho aumentará a propensão do Banco Central a encerrar o ciclo de alta de juros, iniciado em outubro do ano passado, para não produzir um estrago ainda maior na economia. Na última reunião, em junho, o Comitê de Política Monetária (Copom) aumentou a taxa básica (Selic) em 0,50%. Para muitos analistas, a deterioração do mercado de trabalho está acima das expectativas. Por isso, eles apostam que, após mais um ajuste de 0,25 ponto no fim deste mês, que levaria a taxa para 14% ao ano, o BC encerrá o aperto.