Dilma faz defesa da democracia

18/07/2015

Rosana Hessel

 

Afagos de Dilma à argentina Cristina Kirchner contrastaram com o tratamento dado ao venezuelano Nicolás Maduro (Wenderson Araújo/AFP)

Afagos de Dilma à argentina Cristina Kirchner contrastaram com o tratamento dado ao venezuelano Nicolás Maduro



A presidente Dilma Rousseff aproveitou a 48ª Cúpula do Mercosul para dar o recado à oposição e aos que defendem o impeachment dela. Poucas horas depois de o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), anunciar ontem que não apoiaria mais o governo da petista, a chefe do Executivo usou parte de seu discurso de abertura para se defender politicamente e afirmou de forma dura que não há espaço para aventuras antidemocráticas. Somos uma região que sofreu muito com as ditaduras. Somos uma região em que a democracia cresce e amadurece. Temos que persistir nesse caminho, disse Dilma, no Palácio do Itamaraty. 

Durante o encontro, Dilma se alinhou à posição dos presidentes do Uruguai, Tabaré Vázques; e do Paraguai, Horácio Cartes, sobre a necessidade de dar mais atenção ao comércio no bloco econômico que, apesar de ter sido criado em 1991, ainda não possui uma união aduaneira concretizada. Ela, no entanto, não desprezou a importância de outras parcerias. Para a brasileira, com o fim do superboom das commodities e da desaceleração da China, as economias da região enfrentam dificuldades e, para voltarem a crescer, é importante negociar com outras nações. 

A presidente citou os esforços em relação às negociações com a União Europeia, iniciadas há mais de 20 anos, cuja a proposta comercial deve ser entregue no fim do ano; e sugeriu a aproximação com os países da Aliança do Pacífico. A crise não pode ser razão para criarmos barreiras comerciais entre nós. Pelo contrário, disse. Os efeitos da crise geram desafios para a região e por isso é possível que as regras reservem espaço para a adoção de políticas adequadas para ações produtivas. Precisamos encontrar novos caminhos para a inserção de nossos produtos na cadeia de valor global, emendou. 

O embaixador José Botafogo Gonçalves, vice-presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), acredita que a consolidação da união aduaneira no bloco é o caminho, mas alerta: para isso, é preciso que Argentina e Brasil acabem com os ex-tarifários, que foram renovados ontem até 2021 para os dois países. 



Inadimplência 
Na reunião, a presidente Dilma Rousseff destacou a renovação por mais 10 anos do Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (Focem), instrumento para a redução das assimetrias do bloco. O Brasil, no entanto, deve aportes ao Focem desde 2013. De acordo com dados do Ministério do Planejamento, os atrasos somam US$ 157 milhões. O órgão não informou quando haverá normalização dos repasses. 



Enfraquecimento 
As trocas comerciais entre os países do Mercosul estão enfraquecidas, refletindo a desaceleração econômica do bloco. Neste ano, pelas estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI), as maiores economias do grupo, Brasil, Argentina e Venezuela, terão retração de 1,5%, 0,3% e 7%, respectivamente. Paraguai e Uruguai devem crescer 3,9% e 2,8%, nessa ordem. 

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Atenção e desprestígio

19/07/2015 

Rosana Hessel
 
Enquanto a presidente da Argentina, Cristina Kirchner, recebeu todas as atenções da colega Dilma Rousseff, que até chorou ao falar da amiga que deixará o governo no próximo ano, o mandatário da Venezuela, Nicolás Maduro acabou sendo o mais desprestigiado durante a 48ª Cúpula do Mercosul, realizada ontem no Palácio do Itamaraty. 

A agenda do evento começava bem cedo, com a assinatura dos atos de adesão da Bolívia do bloco, como membro pleno, e da Guiana e do Suriname, como associados. Em seguida, Dilma tinha uma reunião bilateral com o presidente da Guiana, David Granger. Maduro chegou no meio da conversa, quando a presidente não estava no saguão para cumprimentá-lo. Algumas fontes disseram que ele tentou participar da reunião com Granger, mas foi barrado. A assessoria do Planalto não confirmou a informação. 

A quebra do protocolo na entrada de Maduro foi comentada entre os presentes como uma falha da organização. Pouco depois da chegada do venezuelano, Dilma desceu para recebê-lo e posar para a tradicional foto do aperto de mãos. Mas o discípulo de Hugo Chávez enfrentou outra saia justa durante o almoço, quando Granger citou a disputa territorial da Guiana com a Venezuela. O mundo inteiro já reconhece nossas fronteiras. A Guiana foi obstruída no desenvolvimento de seu próprio território. Já temos provocações incansáveis há muitos anos, afirmou. Após a fala de Granger, Maduro e comitiva deixaram o Itamaraty. 

Já Cristina Kirchner teve status de convidada especial. No Brasil, você terá uma amiga sempre pronta para recebê-la e compartilhar sonhos e esperanças, disse Dilma, com lágrimas nos olhos e voz trêmula. A presidente brasileira entregou para a argentina o Grande Colar da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul, a mais alta condecoração brasileira para um cidadão estrangeiro.