Déficit público bate mais um recorde negativo em maio

02/07/2015

Sem contar ainda com todas as medidas do plano de ajuste fiscal - a principal, do fim prático das desonerações, ainda precisa passar pelo Senado - e com a arrecadação em queda, o desempenho das contas públicas continua preocupante. A dívida bruta do setor público consolidado disparou: subiu de 59,8% do PIB em janeiro para 62,5% em maio. Maio foi um mês de déficits para o governo central (- R$ 8,9 bilhões), para o setor público (- R$ 6,9 bilhões) e o resultado só não foi pior porque Estados e municípios fecharam no azul. A perda do grau de investimento tornou-se mais que uma possibilidade, enquanto o Congresso não para de votar aumentos de gastos. O Senado aprovou reajuste médio de 59,6% para o Judiciário, uma conta extra de R$ 25,7 bilhões, enquanto a Câmara deu aval à indexação de todas as aposentadorias pelo salário mínimo - hoje ela é válida só para os que ganham o piso.

A herança do primeiro mandato de Dilma é bem mais pesada do que se previa. O déficit primário de 2014 chegou a -1,08% do PIB quando ajustado por receitas atípicas e pelo "float" de restos a pagar (José C. Gerardo, Valor, 23 de junho). Na prática, a economia de 1,1% do PIB proposta, se fosse cumprida, apenas zeraria o déficit.

Do lado das receitas, há pouco a esperar. A recessão se aprofundou no segundo trimestre, e ainda não por obra do ajuste, que permanece incompleto. Pelo lado das despesas, além dos pesadelos engendrados pelo Congresso, há a carga muito pesada de juros, agravada por perdas contábeis do Banco Central com os swaps cambiais. Nos doze meses encerrados em maio, o déficit nominal, que considera a conta de juros, foi recorde: 7,9% do PIB. É o quarto maior dos 60 países listados pela revista "The Economist", atrás apenas dos rombos dos governos da Venezuela, Arábia Saudita e Egito.

Por qualquer ângulo que se olhe, a conta dos juro é enorme e crescente. Em termos nominais, seu peso é esmagador. Nos cinco primeiros meses do ano, essas despesas atingiram R$ 198,9 bilhões, quase o dobro dos R$ 101,6 bilhões do mesmo período de 2014. O setor público consolidado está pagando 4,42% do PIB de juros reais (descontada a inflação) e o governo central, 5,4% do PIB, cifras que fazem empalidecer o ajuste fiscal pretendido, além de torná-lo impotente. Já a taxa de juros implícita sobre a dívida líquida, paga pelo governo central nos 12 meses terminados em maio, atingiu espantosos 18,3%.

Os números foram um pouco inflados até maio porque carregam R$ 41,2 bilhões em perdas com swaps cambiais, que podem não se repetir no futuro. Mas a tendência destrutiva dos juros é clara. Os sinais dados pelo Banco Central no relatório de inflação de junho indicam que eles vão subir um pouco mais e que a taxa não será revertida tão cedo.

Quando as condições eram favoráveis, no primeiro mandato de Dilma, uma política fiscal expansionista arruinou os efeitos de impulso econômico dados por uma política monetária frouxa. As condições, de certa maneira, pioraram muito agora. A política fiscal tenta ser moderadamente contracionista e há forte suspeita de que não irá consegui-lo, enquanto que a política monetária já pode ter cruzado a fronteira do necessário para corrigir cinco anos de leniência com a inflação, que chegou a 9%.

O governo não possui todos os meios para corrigir esta situação porque sua base de apoio no Congresso está dividida e rebelde, como comprovam as várias derrotas impostas a ele ao longo do semestre. É improvável que se façam cortes de fôlego com 94,9% de despesas obrigatórias no orçamento. A proposta de maior desvinculação ou o fim das vinculações em uma reforma se defrontaria com parlamentares descontentes e pouco inclinados a aumentar o poder do Executivo.

Dessa forma, o ajuste tem seguido o caminho ruim, mas de menor resistência, do aumento de impostos e grandes reduções no investimento. A esperança inicial da equipe econômica era que, embora forte, a recessão seria breve e em 2016 a economia e as receitas voltariam a crescer. Essa perspectiva está sendo aos poucos destruída pela profundidade insuspeitada do herdado desajuste das contas públicas e pelo amortecimento das medidas de aperto enviadas ao Congresso. As previsões para 2016 estão sendo contaminadas pelos reveses do primeiro semestre. Escassearam as apostas de que o PIB cresça 1% no ano que vem e aumentam as que vislumbram estagnação.