Gasto cai, mas herança de 2014 atrapalha

30/07/2015

Por Denise Neumann | De São Paulo

Os dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do governo federal (Siafi) mostram desaceleração dos gastos da União em 2015, mas sugerem que a herança de 2014 e de outros anos anteriores estão afetando o ajuste fiscal em curso. Pelo acompanhamento da execução do orçamento feita pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) e pela ONG Contas Abertas, há um recuo expressivo em investimentos e uma desaceleração diferenciada em gastos correntes no primeiro semestre, onde algumas despesas obrigatórias sobem muito, outras estão mantendo a proporção em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) e outras apresentam queda forte. Os dados oficiais do Tesouro serão divulgados nesta quinta-feira.

Por programas, também há um comportamento diferenciado. O governo elevou os gastos com o Bolsa Família, educação superior e saneamento acima da inflação, manteve o SUS quase no mesmo patamar do ano passado, mas gastou proporcionalmente menos com educação básica e reduziu as despesas com Defesa e moradia digna (onde entra o Minha Casa, Minha Vida), de acordo com as inscrições de pagamentos no Siafi, e considerando valores nominais.

O acompanhamento Ibre-Contas Abertas mostra que o investimento da União no primeiro semestre deste ano correspondeu a 0,61% do PIB, percentual bem inferior ao 1,03% do mesmo período do ano passado. Em valores reais (corrigidos pelo IPCA), a queda é de quase 42%. Em despesas correntes, há aumento de 16,15% do PIB para 16,95%, o que representa crescimento real, em valores, de 2,6% ou R$ 12 bilhões.

Na avaliação do economista José Roberto Afonso, pesquisador do Ibre, no entanto, o dado de 2015 está muito contaminado pela base contraída do ano passado, quando o pagamento de várias despesas com o caixa do Tesouro foram atrasadas, no mecanismo que ficou conhecido como "pedalada fiscal". O gasto com pessoal, na mesma comparação, recua 1,7% em valores já corrigidos pela inflação.

Todos esses valores e comparações, salienta Afonso, consideram valores pagos do Orçamento de 2015 e restos a pagar pagos. E eles podem ser diferentes (no total) daqueles que serão divulgados pelo Tesouro hoje, porque embora a fonte primária dos dados seja a mesma (o Siafi), a tabulação feita pelo Tesouro é diferente. "Mas a tendência é de forte queda do investimento e de desaceleração no crescimento das demais despesas, com algumas quedas", pondera Afonso.

Em alguns programas, o acompanhamento do Contas Abertas-Ibre mostra claramente o efeito das despesas vindas dos anos anteriores. Nos investimentos, do total de despesas pagas de 0,61% do PIB, 0,55 ponto percentual (quase a totalidade) são de restos a pagar. "O principal são pagamentos de anos anteriores e não de obras que geraram demanda em 2015", diz Afonso. No caso de despesas correntes, do total de 16,95% do PIB pago em 2015, 2,09 ponto percentuais são de anos anteriores.

Para Afonso, é aqui que aparece a dificuldade do governo em controlar as chamadas despesas obrigatórias, pois o aumento efetivo de gastos de 2015 corresponde a um acréscimo não desprezível de 0,6 ponto do PIB em relação ao que foi gasto em 2014. Esse percentual, contudo, pode estar inflado pelo efeito das pedaladas, quando o atraso do pagamento pelo Tesouro tiver sido postergado apenas do primeiro para o segundo semestre. Ao mesmo tempo, o gasto embute maiores despesas com programas como Bolsa Família, Previdência e outros.

No caso específico da Previdência, os dados sugerem que houve atraso no pagamento pelo caixa do Tesouro. Apenas na rubrica aposentadorias da área urbana, as despesas cresceram de 2,7% do PIB para 3,4% do PIB entre o primeiro semestre de 2014 e igual período de 2015. Afonso pondera que o aumento equivale a 1,2% do PIB de um ano para outro, o que sugere que a base do ano passado pode estar subestimada.

No início do ano passado, vários economistas estranharam a evolução muito benéfica dos gastos da Previdência, que chegaram a registrar queda em relação a 2013 em algumas despesas em alguns meses. Ao longo do segundo semestre voltaram a crescer fortemente.

Afonso sugere que o Tesouro deveria fornecer uma base de dados das despesas dos últimos anos pelo regime de competência, e não pelo de gasto como é feito hoje, pois dessa forma seria possível fazer comparação mais realista das despesas que estão sendo efetivamente pagas, livres dos efeitos das pedaladas e de heranças de anos anteriores.

O desdobramento das despesas também mostra que o reconhecimento de gastos de anos anteriores está afetando o ajuste fiscal. Essa rubrica passou de peso de 0,15% do PIB em 2014 para 0,29% este ano. Nesse grupo, diz Afonso, devem estar as despesas com o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), que começaram a ser pagas este ano.

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Receita diz que não pretende reabrir Prorelit no futuro e rejeita comparação com Refis

 

Por Edna Simão | De Brasília

O subsecretário de arrecadação e atendimento da Receita Federal do Brasil, Carlos Roberto Occaso, defendeu o Programa de Redução de Litígios Tributários (Prorelit) dizendo que ele "não é predecessor" de outro Refis. "Isso [Prorelit] não é Refis. A única similaridade é a possibilidade de contribuinte desistir da ação [para participar]. Não tem nenhuma redução de multa e juros [no Prorelit]. Não há perdão de multa", disse o subsecretário.

Na semana passada, o governo editou a MP 685 criando o Prorelit com o objetivo de arrecadar R$ 10 bilhões até setembro. A previsão, calculada com base no atual cenário econômico e de oportunidades dos contribuintes, vai ajudar no cumprimento da meta de superávit primário de 0,15% do PIB deste ano.

O subsecretário ressaltou que o governo não trabalha com a possibilidade de reabertura, no futuro, do Prorelit, ou de programas de parcelamento especiais, como o Refis. Segundo Occaso, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e o secretário da Receita, Jorge Rachid, são contrários a eles. O Fisco considera que tais iniciativas influenciam negativamente o comportamento dos contribuintes.

Ao explicar a regulamentação do Prorelit, Occaso destacou que do total de 35.439 mil contribuintes com dívidas em contencioso administrativo ou judicial, 28.399 possuem créditos de prejuízo fiscal - IRPJ ou base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) - para quitação de 57% do passivo tributário. O total do passivo das 28.399 empresas que podem aderir é de R$ 860 bilhões. São médias e grandes empresas de vários setores, disse Occaso.

O Prorelit estabelece que quem tiver débito tributário vencido até 30 de junho de 2015 e em discussão administrativa ou judicial na Receita ou na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) poderá desistir do contencioso e utilizar créditos próprios de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa da CSLL, apurados até 31 de dezembro de 2013 e declarados até 30 de junho de 2015, para a quitação dos débitos em contencioso.

O prazo de adesão começou ontem e vai até o dia 30 de setembro. O diretor do departamento de gestão da dívida ativa substituto da PGFN, Roberto Beggiora, lembrou que, ao contrário de outros programas, o contribuinte deve apresentar requerimento de adesão e o protocolo de desistência de ações até o dia 30 de setembro.