"Sem crescimento, não há equilíbrio fiscal"

25/07/2015

Por Angela Bittencourt

Em menos de um mês, o governo alterou as duas metas que orientam a política econômica no Brasil: a meta de inflação e a meta fiscal. A meta de inflação mudou para 2017 não em seu ponto central, de 4,50%, mas na margem de tolerância para sua variação. O indicador, que poderia subir até 6,50% sem condenar o Banco Central (BC) por descumprimento de um mandato legal, agora pode chegar no máximo a 6%. A meta fiscal foi reduzida de 1,1% do Produto Interno Bruto (PIB) para 0,15% do PIB para este ano; para 2016 e 2017, a meta de superávit primário que estava em 2% declinou para, respectivamente, 0,7% e 1,3% do PIB; e, para 2018, foi fixada em 2% do PIB. O governo deu um passo importante ao colocar dois pilares da economia doméstica - meta de inflação e meta fiscal - em perspectiva mais realista. Governo e economistas divergem quanto ao retorno positivo dessa ação, estimado pela retomada e pela consistência do crescimento econômico.

O governo indica, no cenário apresentado com a revisão da meta fiscal, que depois de retrair 1,5% neste ano, o PIB crescerá 0,5% em 2016, 1,8% em 2017 e 2,1% em 2018. Para uma centena de economistas que participam da pesquisa Focus, a economia encolherá mais neste ano e avançará menos no próximo. Na sexta à tarde, porém, grandes bancos já estimavam PIB negativo em 2016.

"O governo não trabalha com este cenário", disse o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, em entrevista à coluna na sexta-feira. "Em nosso cenário, o PIB começa a crescer no quarto trimestre deste ano e continua a crescer no ano que vem." A redução da meta de superávit primário, além de não mudar a direção do ajuste - alterado na intensidade para atingir 2% do PIB - "ajuda a economia brasileira a crescer mais rapidamente", comenta o ministro. "Sem crescimento, não há como sustentar nem mesmo o equilíbrio fiscal", afirma.

Câmbio muda a todo minuto, Orçamento é uma vez por ano

No processo de análise de despesas e receitas para chegar a uma "proposta crível e, portanto, realista para a meta fiscal, ainda que eventualmente tendo que revisar projeções para nível menor que o previsto", em nenhum momento a equipe se distanciou de um fato: a necessidade de colocar (depressa) a atividade em marcha." "A redução de despesas - maioria obrigatória - foi feita até onde é possível", explica Barbosa. "Não dava para cortar mais sem comprometer o funcionamento da economia. Há um suporte que é necessário para que a atividade se sustente e o país recupere o crescimento até porque ele é necessário para manter a classificação de risco atribuída por agências de rating."

Na sexta, o dólar atingiu o maior preço em 12 anos impulsionado pela expectativa de que o Brasil será rebaixado pelas agências e até poderá perder o 'grau de investimento' - selo de bom pagador concedido a países que não ameaçam credores com calotes. "O rating leva em conta o resultado primário, mas principalmente a trajetória da economia e ela não se limita ao resultado fiscal, considera também as perspectivas de crescimento. De novo, sem crescimento não há sustentação do equilíbrio fiscal."

O ministro do Planejamento acrescenta que o rating de uma economia é uma avaliação global. "E sabemos pelas análises emitidas pelas agências, que na avaliação dos países contam a questão fiscal, o crescimento e a conta de reservas internacionais. E, apesar da volatilidade cambial, o Brasil não tem problema de liquidez em moeda estrangeira. Temos um elevado nível de reservas."

Após as crises financeiras da década de 1990, várias economias emergentes - incluindo o Brasil - adotaram a política de acumulação de reservas internacionais. A ideia, na época, era assegurar autonomia de política econômica para esses países suportassem flutuações do câmbio eventualmente originadas na economia mundial. As reservas se tornaram um "seguro". Essa política tem um custo que pode ser avaliado pela diferença existente entre a taxa de juro doméstica e a internacional. Hoje esse "seguro" é alto, mas dá aos emergentes e ao Brasil em particular um grau menor de fragilidade financeira.

"Os governos devem trabalhar para reduzir custos em uma economia. E isso se faz com aumento de produtividade, controle da inflação - que viabiliza a redução dos juros - e a saúde fiscal dessa economia", lembra o ministro, que defende a busca de soluções permanentes para os desequilíbrios presentes e reconhece que nem sempre decisões de governo respondem às expectativas dos agentes econômicos, especialmente as do mercado financeiro. "É necessário compreender que há uma hierarquia na política macroeconômica", explica Nelson Barbosa. "A taxa de câmbio muda a todo minuto, a taxa de juro pode mudar a cada seis semanas e o fiscal muda de ano em ano."

O Orçamento obedece a ciclos anuais, envolve múltiplas decisões tomadas por atores diferentes. Não se inicia o processo de encaminhamento e execução do Orçamento do país com a ideia de subtrair etapas. "Propostas são feitas, enviadas para avaliação do Congresso e só depois teremos uma lei. Há quem considere o processo lento. Mas é bom e importante que os rituais sejam cumpridos e as medidas passem pelo Congresso. Na democracia é assim. Pode demorar mais? Pode. No entanto, ao sair do Congresso, as decisões se tornam duradouras ou permanentes", pondera.

A equipe econômica prepara a agenda legislativa do segundo semestre. Algumas medidas já anunciadas aguardam votação no parlamento - projeto de repatriação de capital não declarado de brasileiros no exterior e desoneração da folha de pagamento. Outras, em discussão no governo, também chegarão lá - caso da reavaliação do PIS/Cofins.

O ministro Nelson Barbosa, até por dever de ofício, é positivo quanto à expectativa de aprovação das duas iniciativas pelos parlamentares, mas é objetivo em relação à efetividade das medidas propostas pelo governo. "Em todas as áreas de política econômica do governo trabalhamos com o intuito de manter transparência e realismo. As decisões não são unilaterais. Importantes medidas dependem de decisão do Congresso e, no estágio seguinte, de resposta do mercado. A repatriação de capital é um exemplo. Se o mercado não aprovar a ideia, a medida, mesmo aprovada, tem seu alcance limitado", conclui.