Uma gráfica de R$ 68 milhões

23/07/2015 

João Valadares

 

Vaccari, segundo depoimento de delator, ordenava os repasses à gráfica (Carlos Moura/CB/D.A Press - 9/4/15)

Vaccari, segundo depoimento de delator, ordenava os repasses à gráfica

 

Informações da área de inteligência da Polícia Federal, com base na análise da quebra de sigilo da Editora Gráfica Atitude, utilizada pelo ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto com o objetivo de receber propinas que se transformariam em doações legais para o partido, apontam uma movimentação financeira de R$ 67,7 milhões de junho de 2010 a abril deste ano. Os dados foram anexados ao relatório de indiciamento do presidente da Odebrecht, Marcelo Bahia Odebrecht.

Em depoimento de delação premiada, o executivo da Toyo Setal Augusto Mendonça afirmou que, além do suborno pago diretamente ao ex-direto de Serviços da Petrobras Renato Duque e ao ex-gerente da petroleira Pedro Barusco, a SOG/Setal repassou dinheiro para a Gráfica Atitude a mando de Vaccari. João Vaccari pediu ao colaborador que, ao invés da realização de doações oficiais ao PT, contribuísse com pagamentos à Editora Gráfica Atitude, aponta o termo de colaboração. Mendonça menciona ainda que, em pelo menos três oportunidades, João Vaccari solicitou ao declarante que efetuasse tais contribuições ao PT mediante pagamentos a Gráfica Atitude, por suas empresas SOS/Setal, na ordem de R$ 2,5 milhões, sendo que os pagamentos foram efetuados de forma parcelada, mês a mês, neste período, afirma.

A análise dos dados bancários aponta depósitos que somam R$ 2,25 milhões para a gráfica em questão realizados pelas empresas Projetec Projetos e Tecnologia, Tipuana Participações e SOG Óleo e Gás, todas integrantes do grupo Toyo Setal. A gráfica pertence aos sindicatos dos Bancários de São Paulo e dos Metalúrgicos do ABC. No quadro societário, aparecem ainda a secretária-geral da entidade, Juvandiá Moreira Leite, Sérgio Aparecido Nobre e Luiz Cláudio Marcolino.

No pedido de prisão de Vaccari, a Atitude é citada como um canal para mascarar doações ao PT. A força-tarefa de procuradores afirma que ao menos parte das doações de 2014 das empresas investigadas na operação seriam, na realidade, pagamento de vantagem indevida.

Delação premiada
Os procuradores também se basearam na delação premiada de Eduardo Leite, vice-presidente da Camargo Corrêa. Eduardo Leite afirmou que João Vaccari solicitou propina para o PT por meio de doações oficiais da Camargo Correa. Atente-se que a empreiteira de fato doou na campanha de 2014 cerca de R$ 35 milhões ao PT, não podendo ser descartada a hipótese que tal doação se referia ao pagamento de propina, dizem os nove procuradores no pedido ao juiz Sérgio Moro, que, na época, ordenou as prisões de Vaccari, a oitiva forçada de sua esposa, Giselda Lima, e a prisão temporária da cunhada, Marice Lima, que sofreu ações de busca e apreensão na residência.

Os investigadores afirmam que a Atitude não prestou serviço algum às empresas. De acordo com o Ministério Público Federal, as notas fiscais são genéricas e mencionam apenas serviços gráficos. Com a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a gráfica foi multada em 2010 pelo Tribunal Superior Eleitoral por fazer campanha em favor de Dilma Rousseff e criticar o então candidato da oposição, José Serra (PSDB). Segundo o tribunal, a CUT reproduziu em site publicação feita pela Atitude.

O documento da Polícia Federal revela que R$ 17,95 milhões foram depositados em espécie na conta da Editora Gráfica Atitude, por meio de 137 operações, entre dezembro de 2007 e março de 2015, pelo Sindicato dos Bancários. Vaccari, a Atitude e o PT negam qualquer tipo de irregularidade no caso apurado pela PF.


Entenda o caso
Queda só após prisão
O ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto foi preso em casa em 15 de abril deste ano. Semanas antes, sua residência já tinha sido alvo de busca e apreensão por parte da Operação Lava-Jato. O Partido dos Trabalhadores fez a defesa do seu ex-dirigente até onde deu. Mesmo após o depoimento pouco convincente na CPI da Petrobras, o manteve no cargo. Vaccari só caiu depois da prisão. A situação dele, que já teve pedido de habeas corpus negado pela Justiça, ficou ainda mais complicada após a delação premiada do ex-gerente de Serviços da petroleira Pedro Barusco. Ele afirmou que, por meio do ex-tesoureiro, o PT recebeu em propina aproximadamente R$ 200 milhões. O suborno era repassado pelas empreiteiras que integravam o esquema bilionário de corrupção na estatal.