O globo, n. 29897, 15/06/2015. País, p. 4

PF investiga denúncia de que agentes agrediram historiador

Vinicius Sassine e Simine Iglesias

Uruguaio Gerardo Caetano diz que foi detido e espancado em aeroporto do Rio

“Como resisti, me bateram com mais força, jogando- me no chão e jogando no chão minha bagagem” Gerardo Caetano Historiador uruguaio

- BRASÍLIA- A Superintendência da Polícia Federal ( PF) no Rio instaurou uma sindicância para apurar a conduta dos policiais federais acusados de agredir o historiador uruguaio Gerardo Caetano, durante uma conexão que ele fazia no Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, quando vinha de Madri rumo a Montevidéu. A denúncia de espancamento mobilizou dois ministros do governo Dilma Rousseff. O titular da SecretariaGeral da Presidência, Miguel Rossetto, enviou quartafeira uma carta a Caetano com um pedido de desculpas em nome do governo e comunicou o episódio ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que determinou a sindicância.

Caetano. Ministro da Justiça mandou apurar denúncia de agressão ao historiador

Caetano — um dos mais importantes historiadores do Ururecusar guai, professor da Universidade da República e integrante da Academia Uruguaia de Letras — relatou em carta o episódio da suposta agressão, ocorrida no último dia 6. Ele disse ter sido espancado e algemado por policiais federais pouco após o desembarque. A história teve repercussão na imprensa do Uruguai e foi publicada no blog do colunista Ancelmo Gois no site do GLOBO. A PF, por sua vez, lavrou um termo circunstanciado por desacato, que teria sido cometido pelo historiador. A ocorrência foi registrada na delegacia do aeroporto.

A carta de Rossetto, enviada quatro dias após o espancamento denunciado, afirma que o governo recebeu com “surpresa e indignação” as informações sobre as agressões. O ministro diz que a amizade e a integração entre Brasil e Uruguai são incompatíveis com situações “lamentáveis” como a ocorrida. Rossetto informou a Caetano que o Ministério da Justiça, ao qual a PF é subordinada, abriu a investigação para apurar “com rigor” os fatos.

O historiador disse ter sido espancado e algemado após se a passar pelo setor de imigração. “Diante da minha insistência e meu protesto, aproximou- se um agente da Polícia Federal que, de uma forma muito agressiva, empurroume e disse que devia continuar na fila de imigrações e parar de reclamar. Pedi que não me empurrasse e mencionei que tinha direitos. Nesse momento, para minha absoluta surpresa, apresentaram- se outros três agentes que começaram a bater em mim e a gritar que estava detido”, afirmou Caetano na carta.

“Como resisti, me bateram ainda com mais força, jogandome no chão e jogando no chão minha bagagem de mão ( onde tinha meu laptop, cuja tela quebrou pelo impacto). Continuaram me espancando e me ameaçando, arrastando- me no chão até uma sala cuja porta fecharam para continuar me batendo. Logo depois me algemaram”, relatou o acadêmico.

A história começou com o pouso no aeroporto da aeronave da companhia Iberia, proveniente de Madri e com escala original em São Paulo. O mau tempo obrigou o pouso no Rio. Após espera de uma hora na pista, conforme o relato de Caetano, os passageiros desembarcaram no aeroporto. Funcionários da Iberia entregaram um documento de trânsito a cada um, segundo o historiador.

RECORDAÇÕES DAS DITADURAS

O problema aconteceu quando uma funcionária sem identificação pediu que passageiros de outras nacionalidades passassem pela imigração. O historiador protestou contra a necessidade desse procedimento, o que levou à reação dos agentes da PF. Caetano acabou sendo levado para uma sala de passageiros em trânsito e pouco depois embarcou para Montevidéu.

“O acontecido fez minha memória voltar aos penosos tempos do terror das ditaduras, nas quais os cidadãos podiam ser objeto de vexames inauditos e despojados de todo direito pelos policiais de plantão. Além disso, me fere particularmente que tudo isso tenha ocorrido em um aeroporto do Brasil, Estado membro do Mercosul e país com o qual tenho construído laços muito fortes de trabalho e amizade”, afirmou o historiador.