Justiça condena três ex-executivos da Camargo Corrêa; PF indicia Odebrecht

A Justiça Federal condenou, na segunda-feira, ex-executivos da construtora Camargo Corrêa por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Também ontem, a Polícia Federal indiciou o empresário Marcelo Odebrecht, presidente da maior empreiteira do país, por corrupção, lavagem de dinheiro, fraude em licitações e crime contra a ordem econômica. As duas decisões são desdobramentos da Operação Lava-Jato, que investiga a Petrobrás.

Foi a primeira condenação de empreiteiros, ainda em 1ª instância no âmbito da Juízo Final, etapa da operação que alcançou as empreiteiras. A decisão é do juiz Sérgio Moro, que conduz as ações penais decorrentes da investigação de corrupção e propinas na estatal.

Os crimes referem-se às obras das refinarias Abreu e Lima e Repar. Dalton dos Santos Avancini, que foi presidente da empreiteira, e Eduardo Leite, ex-vice-presidente, foram condenados a 15 anos e dez meses de reclusão. Os dois fizeram delação premiada e, por isso, Moro concedeu a eles regime de prisão domiciliar.

João Ricardo Auler, ex-presidente do Conselho de Administração da empreiteira, pegou nove anos e seis meses de reclusão por corrupção e pertinência à organização criminosa. Ele foi absolvido do crime de lavagem.

O juiz também condenou o ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef. O agente da Polícia Federal Jayme Alves de Oliveira Filho, o Jayme Careca, foi condenado a 11 anos e dez meses de prisão por lavagem e organização criminosa.

Na mesma sentença, o magistrado absolveu o empresário Márcio Andrade Bonilho, do Grupo Sanko Sider, do crime de corrupção ativa, por falta de prova. Também foi absolvido Adarico Negromonte Filho - irmão do ex-ministro das Cidades do governo Dilma Rousseff Mário Negromonte - da imputação do crime de pertinência à organização criminosa e de lavagem.

Indenização

Moro impôs a alguns dos condenados o pagamento de indenização de R$ 50 milhões à estatal - valor apurado da propina repassada, segundo a força-tarefa da Lava-Jato. O pagamento não se aplica a Avancini, Leite, Youssef e Costa - todos sujeitos a indenizações específicas previstas em seus acordos de delação.

Os empresários já não exercem mais funções na Camargo Corrêa. Eles foram condenados por fatos que, segundo a investigação, ocorreram no período em que ocupavam a cúpula da empreiteira - Avancini era presidente, Auler, presidente do Conselho de Administração e Leite exercia o cargo de vice-presidente. Avancini, que já esteve preso em Curitiba, vai cumprir ainda cerca de um ano de prisão domiciliar, com tornozeleira eletrônica.

Polícia

Marcelo Odebrecht foi indiciado por corrupção, lavagem, fraude a licitações e crime contra a ordem econômica, supostamente praticados em contratos da Petrobrás. Em relatório de 64 páginas o delegado Eduardo Mauat da Silva atribui os mesmos crimes a outros dirigentes da Odebrecht - Rogério Santos de Araújo, Alexandrino Alencar, Márcio Faria da Silva e Cesar Ramos Rocha, afastados após serem presos. O agente público da Petrobrás Celso Araripe de Oliveira e os executivos Eduardo de Oliveira Freitas Filho e João Antonio Bernardi Filho também foram indiciados.

Marcelo Odebrecht e outros investigados foram presos em 19 de junho, quando deflagrada a Operação Erga Omnes, 14ª etapa da Lava-Jato. O inquérito contra a cúpula da empreiteira foi aberto em 27 de outubro de 2014. O relatório será agora submetido ao Ministério Público Federal para eventual oferecimento de denúncia.

 

Empresa alega empenho em busca de 'sanar irregularidades'

 

 

A Camargo Corrêa reiterou que, "desde que tomou conhecimento das investigações, além de ter se colocado à disposição das autoridades, tem empreendido esforços para identificar e sanar irregularidades, reforçando sua governança corporativa e sistemas de controle".
O criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, que defende Eduardo Leite, disse que esperava o perdão judicial, dada a efetividade da delação, "reconhecida na sentença". "Ou uma redução da pena. No entanto, nenhuma diminuição tendo por base a própria delação foi aplicada pelo juiz, que reduziu a reprimenda de cada crime com base em outra causa não prevista na lei de delação, e sim no Código Penal, que é o fato de ter havido confissão espontânea."
Mariz não se conforma com a condenação. "Leite não cometeu corrupção ativa, não ofereceu ou prometeu vantagem indevida. O que Leite não nega é ter entregue as importâncias prometidas, mas tal entrega não faz parte da corrupção que se perfaz com o mero oferecimento ou promessa."
"A defesa ataca a deliberada confusão do Ministério Público, agora aceita pela sentença, consistente na descrição de lavagem nos mesmos termos que se descreveu a corrupção. A lavagem seria o próprio ato de corromper ou seu exaurimento. Leite foi condenado duas vezes pelo mesmo fato." Mariz afirma que o ex-executivo não participou de organização criminosa.
O advogado Celso Vilardi, que defende João Auler, afirmou que a sentença é "absolutamente injusta". "O juiz utiliza a palavra dos delatores para condenar, mas desconsidera esses mesmos delatores quando afirmam a inocência de Auler sobre corrupção. Sobre organização criminosa o erro da sentença é gravíssimo porque afirma que Auler não praticou qualquer ato a partir de 2009 e, por isso, o absolve do delito de lavagem. Mas o condena por organização criminosa, cuja lei só começou a vigorar em 2013."
O advogado Pierpaolo Bottini, defensor de Dalton Avancini, considera que a decisão ocorreu "nos termos do acordo de colaboração". "Ninguém fica feliz em receber uma pena dessas, mas pelo menos ele (Avancini) tem a certeza de que não vai para a prisão." O criminalista Luiz Flávio Borges D?Urso, que defende Márcio Bonilho, da Sanko Sider, declarou sobre a absolvição de seu cliente. "Fez-se Justiça. Bonilho realizou operação comercial absolutamente regular."

Odebrecht

Em nota, a Odebrecht declarou que, "embora sem fundamento sólido", o indiciamento de Marcelo Odebrecht e ex-executivos da empresa já era esperado. "As defesas aguardarão a oportunidade de exercer plenamente o contraditório e o direito de defesa." Na avaliação da maior empreiteira do País, em relação a seu presidente, "o relatório da Polícia Federal traz novamente interpretações distorcidas, descontextualizadas e sem nenhuma lógica temporal de suas anotações pessoais".

"A mais grave é a tentativa de atribuir a Marcelo Odebrecht a responsabilidade pelos ilícitos gravíssimos que estão sendo apurados e envolveriam a cúpula da Polícia Federal do Paraná, como a questão da instalação de escutas em celas", destaca.
A advogada Camila Vargas do Amaral afirma que "provas contra Rogério Araújo (ex-executivo da empresa) não se sustentam". "A defesa lamenta que a Polícia Federal tenha incorrido no mesmo erro do Ministério Público Federal ao associar telefonemas de Rogério Araújo a Bernardo Freiburghaus e pagamentos ao delator Paulo Roberto Costa (na Suíça). A defesa já demonstrou em petição à Justiça Federal que o cruzamento de dados feitos pelo MPF está repleto de inconsistências."
Segundo Camila, "tidos como prova de crime, comprovantes bancários, se submetidos a análise atenta, demonstram que pagamentos a Paulo Roberto supostamente ocorridos logo após ligações de Araújo foram feitos, em realidade, em datas anteriores a muitos dos telefonemas e não naquelas indicadas". A advogada diz que "cruzamento feito pelo MPF desconsiderou a diferença de fuso horário entre Brasil e Suíça". "Depósito citado de US$ 400 mil ocorreu quatro dias antes do telefonema a ele relacionado."
No relatório de indiciamento de Odebrecht, a PF atribui a integrantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Paraná "manipulação" para favorecer suposta estratégia da empreiteira para confrontar a Operação Lava Jato.

Os presidentes das seccionais da OAB reagiram. "A OAB não se intimidará e nunca deixará de agir onde prerrogativas profissionais e o direito de defesa forem desrespeitados, sejam eles de advogados de investigados ou de delatores", diz texto divulgado pela Ordem.

"Nenhum advogado pode, e nem será, intimidado por autoridades policiais contrariadas com a defesa da Constituição e do Estado Democrático de Direito."