Rebelião chega a analistas do Fisco e ameaça arrecadação

 

Martha Beck

O globo, n. 29954, 11//08/2015. Economia, p. 17

 

O apoio do Ministério da Fazenda à demanda dos auditores fiscais — que querem a carreira incorporada à proposta de emenda constitucional (PEC) 443, que eleva o teto da remuneração de advogados públicos e delegados de polícia para até R$ 30.471,00 — agravou a crise na Receita Federal. Os analistas tributários, carreira de apoio aos auditores, ficaram insatisfeitos por considerarem que a Fazenda prestigiou apenas uma parte do grupo responsável pela arrecadação e, ontem, decidiram cruzar os braços. E esse é um elemento capaz de derrubar ainda mais a arrecadação, num momento delicado para as contas públicas. Com a paralisação, o atendimento em delegacias, inspetorias e agências da Receita Federal deve ser prejudicado, além da emissão de certidões negativas, processos de cobrança e fiscalização de postos de fronteira.

ANALISTAS TÊM OUTRA PEC

Na semana passada, a cúpula da Receita e o gabinete do ministro Joaquim Levy manifestaram apoio aos auditores, que brigam para ser incluídos na PEC 443. Embora a equipe econômica seja contrária ao projeto, foi obrigada a apoiar os funcionários do Fisco, porque a categoria se considerou desprestigiada no debate da proposta na Câmara dos Deputados. Vários parlamentares, inclusive o líder do governo na casa, deputado José Guimarães (PT-CE), destacaram que os advogados públicos são uma carreira de Estado, com grande importância para a arrecadação.

Isso provocou uma rebelião entre os auditores, que decidiram entregar cargos e fazer uma paralisação. Para reduzir a tensão, o gabinete de Levy divulgou uma nota na quinta-feira afirmando que os auditores são uma carreira que merece “respeito e reconhecimento”. Já o secretário da Receita, Jorge Rachid, enviou um e-mail aos superintendentes do Fisco, afirmando que não iria se omitir de “defender a instituição nas discussões ainda em andamento da PEC 443”.

O problema é que os analistas, que também têm uma proposta para elevar o teto salarial da categoria (PEC 391), consideraram que a Receita decidiu privilegiar apenas parte dos servidores que atuam na arrecadação.

— Em plena crise econômica, com o Estado precisando desesperadamente de recursos, os delegados, inspetores, superintendentes e até o secretário da Receita abandonaram o trabalho e passaram a usar o órgão para defender seus interesses corporativos. Mais do que isso, estão atuando deliberadamente para desestruturar a carreira de auditoria e prejudicar o analista tributário, o que traz graves consequências para a administração tributária e aduaneira — disse a presidente do Sindicato Nacional dos Analistas Tributários da Receita Federal do Brasil (Sindireceita), Sílvia de Alencar.

A votação das emendas à PEC 443, aprovada em primeiro turno pela Câmara, está marcada para hoje. Segundo o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional), um dos destaques a serem votados inclui a carreira na proposta. Caso seja rejeitado, o grupo também continuará paralisado. Segundo os auditores, a arrecadação já está sofrendo os efeitos da mobilização da categoria. Um deles é que autos de infração, por exemplo, estão sendo aplicados a empresas, mas não estão sendo lançados no sistema da Receita.