UNE e movimentos organizam atos por ‘legalidade e democracia’

 

O globo, n. 29954, 11//08/2015. País, p. 4

LETICIA FERNANDES, SÉRGIO ROXO, TATIANA FARAH, EVANDRO ÉBOLI E FERNANDA KRAKOVICS

A União Nacional dos Estudantes (UNE), que junto com os movimentos sociais terá um encontro com a presidente Dilma Rousseff quinta-feira, em Brasília, prepara uma convocação aos movimentos estudantis para um ato pela legalidade e pela democracia no dia 20. De acordo com a presidente da UNE, Carina Vitral, os motes principais serão a defesa da democracia e as críticas ao ajuste fiscal.

VITOR VOGEL/UNE/DIVULGAÇÃOLíder estudantil. Carina Vitral em manifestação: crítica ao ajuste fiscal e apoio à legalidade do mandato de Dilma

A ideia, segundo Carina, é organizar uma série de outros protestos em seguida. Aos 26 anos e recém-chegada à presidência da UNE — ela foi eleita em junho —, a estudante do sexto ano de Economia da PUC de São Paulo, filiada ao PCdoB, negou que os atos dos estudantes serão de apoio à presidente Dilma Rousseff, mas uma “resposta a ideias conservadoras”.

— Vai ser uma resposta não a favor ou contra um governo, vai ser uma resposta contra ideias conservadoras que estão nas ruas. Mais do que uma passeata contra a presidenta Dilma, o que a gente viu nas passeatas da direita foram ofensas à figura da mulher. E levantaram a bandeira da intervenção militar — disse a presidente da UNE. — Reafirmamos uma posição de apoio à legalidade do mandato da presidenta, mas mantendo a independência em dizer com o que a gente não concorda. Os melhores amigos dizem as verdades, não o que se quer ouvir.

O PT aposta nos movimentos sociais para responder aos protestos programados para o próximo domingo, que podem servir de combustível para os grupos políticos que articulam o impeachment. Em Brasília, hoje e amanhã, Lula e Dilma estarão lado a lado na Marcha das Margaridas, ato em defesa dos direitos das mulheres organizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag).

A entidade, aliada histórica do PT, estima que cerca de 70 mil mulheres estarão presentes ao evento. Na abertura, hoje à noite, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva discursará para essa plateia pró-governo no estádio Mané Garrincha, num palco montado nas arquibancadas. Amanhã, Dilma também deve falar no estádio, no centro do gramado, e encerrará a marcha, que seguirá em direção à Esplanada dos Ministérios.

— Vão ser atos organizados no Brasil inteiro, com a linha da defesa da democracia e críticas ao ajuste fiscal. (Haverá) Apoio à legalidade do mandato da presidenta, apoio à democracia — diz Carina.

VIGÍLIA NO INSTITUTO LULA

Fazem parte ainda do plano de reaproximação dos petistas com a base do partido um encontro de Dilma com a CUT e com o MST e com a UNE, na quinta- feira, em Brasília; e a ida de Lula ao ato nacional pela Educação organizado pelo partido, também na capital federal.

“Vamos deixar claro para a presidenta Dilma que vamos lutar para defender o mandato que ela conquistou legitimamente”, afirma nota divulgada ontem pela CUT sobre o encontro com a presidente. A central sindical ligada ao PT informa que partiu dela e dos outros movimentos a iniciativa de pedir o encontro com Dilma. Diz que o objetivo da reunião é “reafirmar a disposição de luta em defesa da democracia”.

Além disso, a partir de hoje, um grupo ligado ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, que nos anos 1970 foi presidido por Lula, vai montar uma vigília na frente do instituto do ex-presidente, na Zona Sul de São Paulo. A ideia é ficar no local até domingo para prestar solidariedade ao líder petista e evitar ataques como o do dia 30 de julho, quando uma bomba caseira foi atirada contra o local. Na última sexta-feira, cerca de 500 petistas já fizeram um ato de apoio ao ex-presidente na frente do Instituto Lula.

Segundo Carina, a ideia do encontro com Dilma na quintafeira partiu de movimentos sociais e centrais sindicais, capitaneados pela UNE e pela própria CUT. Essas entidades acreditam que, com o agravamento da crise política, a presidente precisa “se apoiar no povo brasileiro, em setores da sociedade que a elegeram”, e dar uma “demonstração de força”.

A presidente da UNE fez críticas aos cortes no orçamento da Educação e disse ser “incoerente” um governo que usa o slogan “Pátria educadora” cortar verbas da pasta:

— Nós achamos que é incoerente cortar dinheiro da Educação com o slogan da “Pátria educadora”. E nós sempre dissemos isso. Temos criticado o corte de verbas na Educação e vamos continuar criticando.

REUNIÃO COM EX-PRESIDENTE

Carina se reuniu pela primeira vez com o ex-presidente Lula há duas semanas, na sede do Instituto Lula, em São Paulo. Elogiou sua capacidade de ouvir os líderes estudantis e ouviu o desejo do ex-presidente de transformar o Plano Nacional de Educação em bandeira política.

Carina criticou ainda o ajuste fiscal e pôs na conta dos ministros do PT (“que não estão 100%”) as sucessivas derrotas do governo no Congresso, sob a batuta do presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB), e o crescimento do espaço dos peemedebistas no governo.

 

‘PMDB tem espaço demais’

Petista dos mais próximos de Lula, o prefeito de São Bernardo do Campo, Luiz Marinho, classificou ontem de “bobagem” a redução de ministérios como forma de enfrentar a crise e afirmou que o PMDB já tem muito espaço dentro do governo, enquanto o PT tem “espaço insuficiente”.

— Para que mais espaço para o PMDB? Ele tem espaço demais. Cuida da articulação política, Integração, Minas e Energia, Portos. Tem coisa para caramba. Mas, se a solução for pôr 100% do PMDB, então ponha 100% do PMDB. Eu sinceramente acho uma visão muito estreita. Se os parlamentares estão dizendo “esse ministro não representa o partido”, tem de enfrentar essa discussão, não adianta ficar postergando. De repente não é a quantidade de ministros, mas como colocar pessoas dos partidos que representem efetivamente os partidos.

O petista afirmou que a presidente deu os primeiros passos para sair da crise, ao iniciar o diálogo com líderes e movimentos sociais:

— A presidenta Dilma aparentemente resolveu tomar as iniciativas de diálogo com vários segmentos. Espero que isso se restabeleça e que o partido não tenha mais que fazer esse tipo de reclamação — disse o prefeito, para quem o governo deve “sair dessa perplexidade e agir”.

Marinho, como tem feito o PT, atacou a política econômica do ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Além de defender que o governo adote medidas como as tomadas por Lula em 2008, para ampliação do crédito e do consumo, ele criticou a decisão do ministro de apenas liberar estados e municípios para fazerem convênios internacionais no ano que vem:

— É preciso que o Levy tire o pé da garganta dos municípios e dos estados.

O petista desconsiderou a possibilidade de o ex-presidente Lula assumir um ministério para garantir foro privilegiado por conta das investigações da Operação Lava-Jato, que apura crimes de corrupção e cartel nos contratos da Petrobras.

— Não faz sentido o Lula ser ministro. Se ele tivesse de ir para o governo, teria de ser uma necessidade da presidenta — disse ele, apontando que Dilma demora a seguir os conselhos do ex-presidente: — Ouvir, ela sempre ouviu. Só não dava sequência ao que ouvia. Afinal de contas, ela não é surda.