Restrições fiscais abrem espaço para PPP

Flavia Lima

18/08/2015

 Diante da crise orçamentária que assola Estados e municípios por todo o país e da "urgência" em tocar obras imposta pelas eleições municipais de 2016, cresce o número de concessões em infraestrutura feitas sob a forma de parcerias público-privadas (PPP) - projetos que pressupõem um pagamento público, sem que governos precisem dispor de caixa no curtíssimo prazo.

Ainda que a Lava-Jato preocupe, pois empresas envolvidas na operação predominam entre as maiores obras de PPPs, os projetos vêm ganhando musculatura nos últimos meses. Dados compilados pela empresa Radar PPP com exclusividade para o Valor indicam que, desde a primeira parceria, em dezembro de 2006, são 81 contratos ou R$ 144,9 bilhões. Cerca de um terço, ou R$ 44 bilhões, foi assinado nos últimos 12 meses, o que, segundo analistas, sinaliza uma aceleração de projetos de PPPs em dois níveis da federação - a União ainda engatinha nesse aspecto.

"Os prefeitos precisam honrar seus planos de governo, então vejo cada vez mais municípios assinando contratos nesse fim de mandato", diz Guilherme Naves, sócio da Radar PPP. Segundo ele, Rio, Sergipe e Rio Grande do Sul são boas apostas entre os Estados que serão destaques nas PPPs nos próximos anos. Entre os municípios, Belo Horizonte e Rio devem manter o protagonismo, além da cidade de São Paulo, com grupo de projetos mais diversificado, que inclui, por exemplo, Anhembi e Pacaembu.

Segundo especialistas, as PPPs abrem espaço para obras sem a necessidade de muitos recursos no curto prazo, mas precisam ser encaradas com responsabilidade diante do que chamam de "tentação orçamentária", já que a conta do investimento é deixada para os mandatos seguintes. Isso porque o ganhador da licitação arca com os investimentos imediatos - daí a maior viabilidade financeira em tempos de escassez de recursos -, enquanto o poder público responde pela remuneração futura, que pode se prolongar por até 30 anos.

No curto prazo, dois contratos de PPPs já têm um vencedor declarado e aguardam apenas assinatura, totalizando cerca de R$ 3,3 bilhões: o do Contorno Metropolitano Norte de Belo Horizonte e o do esgoto sanitário de Divinópolis, também em Minas. Há ainda outras sete licitações em andamento que junto ao projeto grande de iluminação pública de São Paulo (ainda em discussão pelo Tribunal de Contas), do metrô de Curitiba e de outro para construção e operação de unidades de saúde em Belo Horizonte, superam R$ 15 bilhões.

Na sexta-feira, o governo de São Paulo deu sinal verde para a construção, sob a forma de PPPs, de dez mil moradias populares em Itaquaquecetuba, Arujá e Guarulhos, cujo valor ainda é difícil estimar. Assim que publicado, o projeto vai se juntar aos mais de 80 Procedimentos de Manifestação de Interesse (PMIs), publicados em 2015, um avanço importante em comparação aos 39 de 2012, 59 de 2013 e 53 procedimentos em 2014.

O PMI é o estágio inicial de uma PPP, em que os governos colhem percepções da iniciativa privada sobre determinado empreendimento. Não há muita clareza sobre os bilhões que envolvem esses 80 projetos, mas eles indicam que, para um período mais longo, de 18 a 21 meses, as expectativas também são bastante promissoras.

João Pedro Cortez, sócio da Una Consultoria de Análise, explica que, uma vez que os projetos em infraestrutura mais atrativos para o setor privado - e que, portanto, podem ser financiados pelos usuários - estão cada vez mais escassos, as parceria público-privadas surgem como opção interessante. "É uma das poucas alternativas para o poder público anunciar investimentos relevantes em uma área essencial, que é a infraestrutura", diz.

Segundo Cortez, diante de receitas tributárias em queda, limites de receita estourados e dificuldade de acessar crédito, o papel das PPPs é vital. Neste momento, a Una está envolvida na fase preliminar de estudos de mobilidade urbana, saneamento e presídio.

São especialmente os governos regionais que concentram as obras sob esse tipo de parceria em projetos de mobilidade urbana, saneamento, saúde, habitação, segurança e até mesmo estádios, como os da Copa da Mundo. Os projetos de iluminação pública vêm crescendo bastante, sobretudo após a transferência, por resolução da Aneel de 2010, dos ativos de iluminação pública para responsabilidade municipal.

Segundo a Radar PPP, são 44 projetos estaduais (São Paulo tem 11, Minas, 9, e a Bahia, 6), 33 municipais, 3 no Distrito Federal e apenas um da União. No caso da União, os primeiros projetos de concessão dos últimos governos se mostraram atrativos para o setor privado, logo financiáveis pelos usuários e sem a necessidade de uma contrapartida pública. Naves, do Radar PPP, lembra que como a "nata" dos projetos se esgotou, o "gap" de viabilidade financeira deve ser preenchido por PPPs e isso deve aparecer já no Programa de Investimento em Logística, o PIL 2.

Dois projetos de lei também buscam elevar o número de projetos sob o modelo, ao sugerir a mudança do atual limite de 5% da receita corrente líquida de Estados para gastos com PPPs. A ideia é que esse limite suba para até 10% da receita, além de reduzir de R$ 20 milhões para R$ 5 milhões o valor mínimo de um contrato de PPP. A iniciativa é boa, diz Naves, porque mais municípios vão poder tocar projetos. "Sempre lembrando que fazer PPP não é pegar dinheiro da iniciativa privada e gastar como se público fosse".

Há projetos de PPPs de todos os tamanhos. O Porto Maravilha, um grande projeto de urbanização, de quase R$ 8 bilhões. A Linha 4 e 6 do metrô de São Paulo e o metrô de Salvador, que superam R$ 5 bilhões cada, também são bons exemplos. Nos 81 contratos de PPP assinados e sob análise, há projetos inclusive menores, como o aeroporto da Zona da Mata, de R$ 150 milhões.

Alexandre de Almeida Leite, analista sênior da Moody's, avalia que as PPPs são importantes para que Estados e municípios consigam viabilizar projetos que, de outra forma, não seriam possíveis por conta das restrições fiscais, mas vê um mercado ainda tímido no Brasil. Mais recentemente, afirma, há avanços, como a série de projetos tocada para a Olimpíada do Rio sob a forma de PPP, como o VLT carioca, em parceria com o município. Leite espera que a limitação fiscal sirva de impulso para que a estrutura seja mais usada, pois faz todo o sentido em setores com maior perfil de risco. "Basta olhar exemplos em países desenvolvidos", diz. "Temos espaço grande para desenvolver isso no Brasil."

 

Mercado projeta primeiro biênio de recessão em 85 anos

Ana Conceição 

18/08/2015

A economia brasileira deve registrar dois anos consecutivos de retração, o que seria o primeiro biênio de recessão em 85 anos, de acordo com as expectativas dos analistas de mercado reunidas no boletim Focus, do Banco Central. Ontem, pela primeira vez o relatório trouxe uma projeção negativa para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2016. A mediana das estimativas saiu de estabilidade para queda de 0,15%. Para 2015, a previsão foi de recuo de 1,97% para queda de 2,01%.

Se confirmada, será a primeira dupla recessão desde 1930/1931, quando o PIB recuou 2,1% e, depois, 3,3%, de acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Naquela época, o país sofria os efeitos da chamada Grande Depressão, longo período que se seguiu ao "crash" da bolsa de Nova York, em 1929.

O Brasil não registra PIB negativo desde a retração de 0,2% em 2009, auge da crise financeira internacional provocado por outro "crash", do Lehman Brothers. Na chamada "década perdida", nos anos 80, houve alguns anos de contração - 1981 (-4,25%), 1984 (-2,93%) e 1988 (-0,06%) -, mas alternados com períodos de crescimento. Em 1990, houve outra queda forte, de 4,35%.

As expectativas para atividade em 2016 têm se deteriorado nas últimas semanas a reboque do recuo previsto para 2015 (algumas estimativas chegam a -3%), que deve deixar uma herança estatística negativa para o próximo ano. Para além desse ponto técnico, várias instituições cortaram os números de 2016 diante do ceticismo com relação à retomada da confiança no setor privado, do aumento do desemprego e seus efeitos sobre a demanda, além do ainda presente risco de perda do grau de investimento. O fato de a mediana do Focus, que abrange cerca de cem casas, ter ficado negativa mostra que o pessimismo se generalizou.

Na semana passada, o Itaú revisou sua projeção do PIB de 2016 de recuo de 0,2% para queda de 1%, enquanto o Bank of America cortou sua estimativa de aumento de 0,7% para retração de 0,4%. Para o BofA, o aumento da instabilidade política e a redução das metas de superávit primário para este e os próximos anos indicam que a confiança do setor privado não deve se recuperar tão cedo.

"Acreditamos que a recuperação da economia vai levar mais tempo, já que um repique da confiança parece improvável no curto prazo", afirmaram em relatório os economistas do BofA David Beker e Ana Madeira. Para 2015, projetam queda de 2,3%. A demanda doméstica, na avaliação do banco, deve cair 2,3% neste ano e 0,6% no próximo.

Para José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, fatores internos, como a deterioração do mercado de trabalho e a queda no consumo, e externos, como o baixo crescimento do comércio mundial, vão atrasar a retomada da atividade econômica. "O Fator estima queda de 2,5% no PIB de 2015 e de 0,6% em 2016, e ambas as estimativas podem ser revisadas para baixo. Segundo Gonçalves, ainda que o investimento caia menos no próximo ano, a perspectiva para o consumo doméstico é bem ruim.

Ao lado da piora nas projeções para a atividade, o Focus mostra também que as expectativas para a inflação em 2016 continuam a se deteriorar, distanciando-se da meta de 4,5%. A mediana para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 12 meses subiu pela segunda semana, de 5,59% para 5,65%, e para o ano fechado de 2016 avançou de 5,43% para 5,44%. Gonçalves, do Fator, avalia que essa deterioração pode ser creditada à recente depreciação cambial. No boletim o BC, a projeção para o dólar subiu R$ 3,50 para R$ 3,60 ao fim do período. Para 2015, a previsão do IPCA se estabilizou em 9,32% após 17 semanas em alta.

Quanto aos juros, o mercado começa a reduzir as apostas para a Selic no ano que vem. Depois de três semanas estável em 12%, a mediana das estimativas para a taxa Selic ao fim de 2016 caiu para 11,88%. Em um mês é a segunda vez que essa projeção cede já que há quatro semanas os analistas esperavam que o juro terminasse o próximo ano em 12,25%.

 

Fiscais da Receita decidem entrar em greve amanhã

Fábio Puppo

18/08/2015

Os auditores fiscais da Receita Federal anunciaram ontem que vão paralisar o trabalho por tempo indeterminado a partir de amanhã. Segundo o comunicado divulgado pelo sindicato da categoria, a decisão ocorreu em assembleia nacional da categoria.

Segundo o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), "o protesto não vai afetar a população, pois alguns serviços continuarão funcionando".

Um deles, cita o sindicato, é a restituição de Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF), que seguirá o calendário estabelecido. Outro é a fiscalização de bagagem acompanhada nos aeroportos de voos vindos do exterior.

O serviço relacionado à fiscalização de perecíveis, medicamentos, fornecimento de bordo, tripulações, bagagem desacompanhada, animais vivos e urnas mortuárias também continuará normal, de acordo com as informações do sindicato.

"A paralisação será realizada nas repartições da Receita, em moldes semelhantes àqueles que já vinham sendo exercidos nos dias nacionais", afirma o sindicato. "Os auditores aproveitarão o tempo em que não estarão despachando, analisando processos e repassando os créditos tributários para desenvolver discussões sobre a carreira e o trabalho na Receita", diz o texto.

Na sexta-feira, terminou sem conclusão a reunião entre o Sindifisco e o secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Planejamento, Sérgio Mendonça. O sindicato afirma que "a categoria continua interessada em negociar".

"Quanto mais demorar um acordo, pior ficará a situação do ajuste fiscal pretendido pelo governo federal, para os quais os auditores foram instados a contribuir pesadamente com a arrecadação", afirma o texto distribuído pelo Sindifisco.