Investigadores analisam atividades de Lula

André Guilherme Vieira e Fernando Taquari 

04/08/2015

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva entrou "no radar" da Operação Lava-Jato, segundo comentou uma autoridade diretamente envolvida nas investigações, logo após a prisão preventiva do ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, decretada pelo juiz Sergio Moro, da Justiça Federal de Curitiba, e cumprida ontem, em Brasília, durante a 17ª fase da investigação, denominada "Pixuleco".

Dirceu é investigado por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro pelo recebimento de R$ 29 milhões em sete anos, de empresas investigadas por meio da JD Assessoria e Consultoria, segundo o Ministério Público Federal (MPF).

"Por enquanto são suspeitas. Ele [Lula], por ora, não é investigado. Mas ele está no radar", afirmou a autoridade ao Valor PRO, serviço em tempo real do Valor. Chama a atenção dos investigadores o fato de Lula ter recebido pagamentos a título de remuneração por palestras de empresas das quais dirigentes e executivos respondem a processo criminal por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa a partir de recursos desviados de contratos com a Petrobras.

"Ele [Lula] recebeu valores daquelas empresas investigadas. No exercício do mandato dele não há nenhum indício de que tenha recebido. Mas depois que ele saiu do cargo, recebeu aqueles valores referentes a palestras pelo Instituto [Lula], que têm de ser pensados", avalia a fonte.

A empresa aberta por Lula para receber remunerações por suas palestras, a Lils palestras, Eventos e Publicidade Ltda, recebeu R$ 1,5 milhão da Camargo Corrêa em três pagamentos de R$ 337,5 mil (em 26 de setembro de 2011), R$ 815 mil (em 17 de dezembro de 2012) e R$ 375,4 mil (em 26 de julho de 2013). As informações constam de laudo pericial da Polícia Federal.

"Nenhum dos delatores disse que os pagamentos recebidos por Lula foram propina. Mas os valores não deixam de ser suspeitos. Nos parece algo incompatível se considerarmos que as empresas pagavam mais de R$ 300 mil por palestra que sequer comprovação têm, e ainda com esse custo", afirma um dos responsáveis pelas investigações.

Procurado, o ex-presidente ressaltou, por meio da assessoria de imprensa do instituto que leva seu nome, a legalidade das palestras ao afirmar que foram eventos públicos e que os pagamentos estão registrados e declarados à Receita Federal. "Esse boato anônimo não corresponde nem à verdade nem à declaração dada pelo procurador Carlos Fernando Lima [que atua na Lava-Jato] em entrevista ao jornal "O Globo", no dia 26 de junho, onde ele diz: 'sabemos que o ex-presidente faz palestras efetivamente'", diz a nota.

Já Camargo Corrêa afirmou que "as contribuições ao Instituto Lula referem-se a apoio institucional e à Lils Ltda. ao patrocínio de palestras do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no exterior. A contribuição ao Instituto Lula foi registrada equivocadamente em 2012 como 'bônus eleitoral' na contabilidade analisada pela Polícia Federal, de acordo com a empresa.

Ex-presidente considera-se resguardado de acusações

Andrea Jubé 

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva considera-se resguardado da nova etapa da Operação Lava-Jato, que devolveu ontem à prisão o "homem forte" de seu primeiro mandato, o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu. Petistas próximos ao ex-mandatário afirmaram ao Valor que a detenção de Dirceu não vincula Lula à investigação, porque o conteúdo das delações revelado até agora sugere que o ex-ministro atuava em benefício próprio e de um grupo restrito de favorecidos.

Uma liderança do PT que frequenta o Instituto Lula em São Paulo argumenta que os delatores ouvidos pelo Ministério Público Federal apontam como benefício próprio do ex-ministro com a suposta arrecadação da propina a aquisição de um imóvel em Vinhedo, no interior paulista, além de outras propriedades em nome da empresa de consultoria de Dirceu, em nome de seu irmão, que também foi preso, e de sócios.

"Sempre tentam vincular o Lula, fazer ligações com o PT, mas já no passado Lula havia declarado que se sentira traído", argumenta este líder petista. Lembra que após as revelações do então deputado Roberto Jefferson sobre o esquema de pagamento de mesadas para que a base aliada votasse favoravelmente ao governo, o "mensalão", Lula pediu a saída de Dirceu. Mais tarde, o ex-presidente declarou aos jornalistas que desconhecia o esquema revelado por Jefferson e que se sentia "traído", mas não disse por quem. "Era óbvio que era uma alusão ao Zé Dirceu", afirma esta fonte petista.

A mesma fonte sublinha que Dirceu saiu magoado do governo, porque Lula não fez nenhum gesto para que ele permanecesse no cargo. Acrescenta que após a saída de Dirceu, Lula teria confidenciado a interlocutores que "o governo melhorou" após a saída do chefe da Casa Civil. Lula convocara Dilma Rousseff, então ministra de Minas e Energia, para suceder a Dirceu no posto. Ressalta que após o julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal e sua consequente condenação, Dirceu enviou sucessivos recados, por meio de terceiros, de que sentia-se abandonado por Lula e Dilma.

O temor real do PT, agora, aponta para os novos capítulos da Lava-Jato, com a provável delação premiada do ex-diretor da Petrobras Renato Duque, supostamente indicado para o cargo por Dirceu.

Um líder do PT disse ao Valor que o partido aguardava a prisão ou a acusação formal de integrantes da sigla, depois que o Ministério Público Federal acenou com as iminentes denúncias de caciques de outros partidos, como o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o ex-presidente e senador Fernando Collor (PTB-AL). Para esta liderança, é como se fosse preciso que uma cabeça petista fosse a prêmio, para que outros caciques partidários também se tornem alvos do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. O PT receia denúncias futuras contra os senadores Lindbergh Farias (RJ), Gleisi Hoffmann (PR) e Humberto Costa (PE), que respondem a inquéritos no âmbito da Lava-Jato.