Correio braziliense, n. 19077, 19/08/2015. Política, p. 4

 

Corrupção se infiltrou, diz o decano do STF

 

O ministro mais antigo do Supremo Tribunal Federal (STF), o chamado decano, criticou a situação ética brasileira ontem, quando a 2ª Turma rejeitou pedido para soltar o lobista Fernando Baiano Soares condenado por receber propina na contratação de navios para a Petrobras. O ministro Celso de Mello afirmou que a corrupção está impregnada em algumas legendas ou órgãos do governo.

Este processo de habeas corpus parece revelar um dado absolutamente impressionante e profundamente preocupante, o de que a corrupção impregnou-se no tecido e na intimidade de alguns partidos e instituições estatais, transformando-se em conduta administrativa, degradando a própria dignidade da política, fazendo-a descer ao plano subalterno da delinquência institucional, disse ele.

No julgamento, Mello disse que a situação da Petrobras é grave. A comprovar-se tal prática vergonhosa, estaríamos em face de uma nódoa indelével, afetando o caráter e o perfil da política nacional. Para falar da crise política atual, Mello lembrou que, em 1954, o opositor Carlos Lacerda declarou: Somos um povo honrado governado por ladrões. O governo era de Getúlio Vargas.

Baiano não conseguiu sair da prisão. Foi detido em novembro, poucos dias depois da Operação Juízo Final, a 7ª fase da Lava-Jato. Anteontem, o juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sérgio Moro, o condenou a 16 anos de cadeia por corrupção e lavagem, além do pagamento de multa de R$ 2 milhões.

A revelação de que a empresa de palestras do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu R$ 27 milhões nos últimos quatro anos, sendo R$ 9,85 milhões de empreiteiras investigadas na Operação Lava-Jato, motivou uma apuração de vazamento de informações. Ontem, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, determinou à Polícia Federal que abra um inquérito para saber por que a movimentação financeira da empresa LILS foi obtida pela revista Veja. A investigação foi pedida pelo Instituto Lula.

Em reportagem publicada no último fim de semana, a Veja mostrou que, de 2011 a 2015, a firma do ex-presidente teve uma movimentação, entre créditos e débitos, de R$ 52 milhões. Entre as empresas que mais fizeram repasses para a LILS, estão as empreiteiras Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS e Camargo Corrêa, todas acusadas de pagarem propina a políticos e funcionários da Petrobras para obterem contratos na estatal. O relatório do Coaf sobre classifica a movimentação financeira da empresa de Lula como incompatível com o faturamento, informa a revista. A assessoria do Instituto Lula disse ao Correio que, na verdade, o documento afirma que o conselho considerou a movimentação atípica.

A entidade informou que o ex-presidente fez sete palestras para a Odebrecht e quatro para a Camargo Corrêa. O instituto divulgou ontem à noite as 41 empresas que contrataram 70 palestras de Lula, que ainda anunciou ter participado de 200 conferências gratuitas no período. As palestras de Lula foram contratadas por algumas das maiores e mais respeitadas empresas de vários setores econômicos, do Brasil e do mundo, destacou a entidade em nota. Por exemplo: Microsoft, Itaú, Infoglobo, Santander, Ambev, Telefónica, Iberdrola e Telmex.

Uma das clientes foi o estaleiro Quip, formado pela Queiroz Galvão, UTC, Iesa e Camargo Corrêa. A empresa, que pagou R$ 378 mil à firma de Lula por palestra motivacional, segundo a Veja, constrói plataformas de petróleo para a Petrobras.

A assessoria do Instituto Lula disse que não pediu a apuração por vazamento, embora essa tenha sido uma das principais queixas dos petistas em ato no fim de semana, em São Paulo. Entretanto, os assessores do ex-presidente informaram que todos os seus negócios foram legais. Todas as atividades foram legais e temos certeza da lisura dessas atividades, disse. Todos os impostos foram devidamente pagos. O que houve foi quebra de sigilo ilegal.