Governo depende agora da cooperação do Congresso
O déficit nominal do setor público atingiu 8,12% do Produto Interno Bruto (PIB) no acumulado de doze meses até junho, equivalente a R$ 462,7 bilhões. Trata-se da pior performance desde o Plano Real, de 1994, e mostra o tamanho do desarranjo das finanças públicas brasileiras. Apesar de muito se olhar o desempenho fiscal do governo pelo conceito primário, é o nominal - que inclui as despesas com o pagamento dos juros da dívida pública - que revela a real situação das contas.
Com o déficit nominal em junho, de R$ 36,3 bilhões, o "buraco" aberto na contabilidade dos governos federal, estaduais e municipais e suas empresas é de R$ 209,6 bilhões no primeiro semestre, segundo dados divulgados pelo Banco Central na sexta feira. O maior peso do déficit está no governo central, responsável por um "rombo" que equivale a 6,77% do PIB no acumulado de doze meses até junho e que é, em geral, financiado pela emissão de dívida mobiliária sobre a qual o Tesouro Nacional paga juros.
Os pagamentos de juros nominais atingiram R$ 417 bilhões, o que corresponde a impressionantes 7,32% do PIB. Descontadas as despesas com juros, o déficit primário foi de R$ 45,7 bilhões, ou 0,80% do PIB, superior ao do mês de maio que havia sido de 0,68% do PIB.
O resultado final dessa sequência de gastos superiores à arrecadação é a expansão da dívida pública. Os dados do BC mostram que a dívida líquida do setor público alcançou R$ 1,96 trilhão em junho - 34,5% do PIB - e a dívida bruta atingiu R$ 3,58 trilhões, 63% do PIB.
É pelo tamanho e pela trajetória da dívida que se avalia a solvência do país. Hoje ninguém arrisca dizer que a trajetória do endividamento público é confortável, principalmente por que os juros que incidem sobre a dívida líquida, a chamada taxa implícita da dívida, é muitíssimo elevada: 25,2%.
"Se não colocar as contas em ordem o Brasil terá problemas maiores", alertou o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, na sexta feira. Desde que assumiu, o ministro vem em uma verdadeira cruzada para reverter a deterioração fiscal que já vinha ocorrendo há alguns anos, mas agravou-se bastante no ano passado, quando o governo registrou o primeiro déficit primário desde 1997.
Para uma análise mais acurada dos resultados obtidos até agora pelo governo é preciso levar em conta o comportamento da economia. Em uma situação recessiva como se encontra o país neste ano, as restrições para se obter os superávits necessários para estabilizar a relação dívida/PIB são imensas. Principalmente considerando-se que as receitas com impostos e contribuições não só estão em queda pela redução do faturamento das empresas, mas porque o pagamento de alguns tributos estão sendo postergados, como advertiu a própria Receita Federal, em nota à imprensa.
Para melhor avaliar a performance da política fiscal em curso este ano, o ministro da Fazenda utilizou o conceito de resultado estrutural na exposição que fez ao anunciar a redução da meta de superávit primário para 0,15% neste ano. Esse resultado leva em consideração o ciclo econômico e exclui as receitas e despesas públicas extraordinárias, que não são recorrentes. Por esse critério, informou o ministro, a política fiscal do primeiro semestre deste ano foi neutra, na comparação com igual período de 2014.
A redução da meta fiscal de 1,13% do PIB para 0,15% do PIB não significa, segundo Levy, um afrouxamento, uma decisão do governo de gastar mais, O que se pretendeu foi estabelecer um objetivo mais realista e eliminar as incertezas quanto ao comportamento da economia, ajudando os agentes econômicos, o governo e as famílias na tomada de decisão de gastos e investimentos.
Em nota técnica que publicou na quinta-feira, o Tesouro prevê que o impulso fiscal deste ano será significativamente contracionista mesmo com a redução da meta de superávit primário para 0,15% do PIB. Ou seja, a política fiscal estará ajudando o Banco Central a conduzir a inflação em direção a meta de inflação em 2016.
Para que o governo consiga cumprir a nova meta ele terá que contar com a colaboração do Congresso Nacional, que reinicia hoje os seus trabalhos, não apenas aprovando as medidas do ajuste fiscal propostas por Levy, mas evitando também a chamada "pauta bomba".