Panelaço aumenta pressão

 

O globo, n. 29950, 07//08/2015. País, p. 3

 

Firjan e Fiesp divulgam nota de apoio ao pedido de união feito pelo vice- presidente Michel Temer: ‘ O momento é de diálogo’

JOSÉ ROBERTO SERRANo Rio. Moradores do Flamengo vão às janelas de edifício bater panelas durante o programa político do PT

Com ironias ao panelaço, críticas ao PSDB e reconhecimento da seriedade da crise, o programa político do PT insuflou ontem protestos em pelo menos 21 capitais e no Distrito Federal. A reação da população ocorre no momento em que pesquisa Datafolha mostra que a reprovação ao governo chegou a 71%, a mais alta da série histórica, iniciada em 1987. Na TV, a presidente Dilma Rousseff disse que “sabe suportar pressões e injustiças”. Sem possibilidade de diálogo com a Câmara, ela reuniu- se ontem com Renan Calheiros ( PMDB), presidente do Senado, e apelou por um pacto. A Firjan e a Fiesp apoiaram em nota o pedido de união política feito na véspera pelo vicepresidente Michel Temer. Já os líderes da oposição defenderam a realização de novas eleições. No mesmo dia em que o índice de reprovação da presidente Dilma Rousseff atingiu o pior nível registrado pelos institutos de pesquisa desde 1987 — 71%, segundo o Datafolha —, o programa de televisão que o PT exibiu ontem à noite foi alvo de fortes protestos em pelo menos 21 capitais e no Distrito Federal. No programa, que chegou a ironizar os panelaços, a presidente Dilma foi incisiva ao dizer que “sabe suportar pressões e injustiças”. Na antevéspera, a base aliada da presidente começou a desembarcar do governo, enquanto o vice Michel Temer afirmava que “alguém deve reunificar o país”.

Nos 10 minutos do programa petista, houve manifestante que batesse panelas e fosse às janelas para gritar “Fora, Dilma” e “Fora, PT” em todas as regiões do país. Em São Paulo, os protestos foram robustos em bairros de classe alta como Jardins, Higienópolis, Paraíso e Butantã. Na Avenida Paulista, motoristas que voltavam para casa aderiram a um buzinaço prolongado. A periferia da cidade também se somou à manifestação. Houve panelaços em Jaçanã, Parque Edu Chaves e Jardim Brasil.

O corretor de imóveis Celso Dacca, que tem 58 anos e é morador de Higienópolis, criticou os petistas assim que o programa do partido foi ao ar:

— O panelaço é uma forma de protesto contra um governo que criou um projeto de poder. O PT teve oportunidade histórica de fazer grandes reformas enquanto estava por cima. Perdeu chance de fazer uma reforma política, reforma administrativa para que este país vá para frente. O projeto de poder levou o país à bancarrota.

No Rio de Janeiro, a maioria dos bairros da Zona Sul foi às janelas em repúdio ao PT e à presidente Dilma. Gritos, assovios e vaias ecoaram pelas ruas de Copacabana, Ipanema, Leblon, Botafogo e Jardim Botânico, mas também foram ouvidos na Gávea, em Laranjeiras e no Rio Comprido. No Grajaú, na Tijuca, no Engenho de Dentro e em Madureira, bairros da Zona Norte da cidade, buzinaços se somaram ao ruído das panelas. Em Niterói e São Gonçalo, o cenário não foi diferente. Nos prédios, as luzes dos apartamentos piscaram de forma intensa.

Em Brasília, houve fogos de artifício e gritaria. Em Minas, panelaços e vaias. Manifestações ainda foram vistas em Pernambuco, Alagoas, Bahia, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul, Pará e Espírito Santo.

PIOR DO QUE COLLOR

O protesto que tomou a maior parte do país reflete a alta taxa de reprovação de Dilma, divulgada ontem pelo Datafolha. Os 71% indicados pelo instituto dão à presidente o título de governante mais mal avaliada desde o fim da ditadura. Sua taxa supera a do ex- presidente Fernando Collor de Mello em setembro de 1992 ( 68%).

Na pesquisa anterior, divulgada na terceira semana de junho, 65% dos entrevistados avaliavam o governo Dilma como “ruim” ou “péssimo”. O grupo dos que consideram o desempenho da petista como “ótimo” ou “bom” variou para baixo, dentro da margem de erro de dois pontos percentuais. Em junho, 10% dos entrevistados tinham essa opinião. Agora, são 8%.

No Twitter, a hashtag # panelaço ficou entre os mais populares até depois das 21h, deixando para trás o movimento oposto, que adotou o # ComPTpeloBrasil.

No programa, Dilma disse que “sabe suportar pressões e injustiças”, e seu partido criticou opositores, ironizou panelaços e pediu união dos brasileiros para superar a atual crise econômica.

O ex- presidente Lula apareceu no vídeo e disse que o pior momento do governo da legenda ainda é melhor do que o melhor momento vivido pelo povo sob governos passados:

— Sei que a situação não está fácil e que a crise já chegou às nossas casas. Também sei que esta não éa 1 ª crise que enfrentamos. Nosso pior momento ainda é melhor para o trabalhador do que o melhor momento dos governos passados. Nosso maior ajuste ainda é menor do que os ajustes que eles fizeram.

Para o ex- presidente, os problemas econômicos devem ser resolvidos com “políticas corajosas, não com oportunismo”:

— Eu mesmo fiz ajuste na economia, e, depois, o Brasil ficou muito melhor. É mais fácil chegar ao porto seguro com quem já foi capaz de enfrentar crise e fazer avançar na tormenta, sempre protegendo os que mais precisam.

Dirigido pelo marqueteiro João Santana, o programa começou com o ator José de Abreu fazendo um apelo em favor da união do país contra a crise econômica e pelas medidas adotadas pelo governo federal.

— Um esforço desse tamanho faz pressão nas contas públicas. Mas será que o governo errou ao tentar, de todas as maneiras, evitar que a crise arrombasse a porta dos brasileiros? Aqui para nós: não é melhor a gente não acertar em cheio tentando fazer o bem do que errar feio fazendo o mal? — indagou.

Em seguida, um outro ator disse que “por seis anos os governos do PT conseguiram retardar a chegada da crise econômica” e, em tom de alerta, arrematou:

— Hoje, o Brasil vive problemas passageiros na economia, e tem gente se aproveitando disso para tentar criar uma crise política.

O programa destacou que a ditadura militar foi resultado de uma crise política e que durou 21 anos.

PT MOSTRA NOMES DA OPOSIÇÃO

Por duas vezes, o programa do PT mostrou imagens de ícones da oposição. Apareceram no vídeo o presidente do PSDB, Aécio Neves ( MG), o senador Ronaldo Caiado ( DEM- GO), o presidente do DEM, José Agripino Maia ( RN), e o presidente do Solidariedade, Paulinho da Força ( SP). Seus rostos ficaram em destacam enquanto o locutor dizia: “Não se deixe enganar pelos que só pensam em si mesmos”.

O presidente do PT, Rui Falcão, também apareceu e manteve a linha de ataque aos opositores:

— Uma coisa é cobrar e criticar o governo. Outra é desestabilizar um governo democraticamente eleito. Isso, não podemos admitir jamais. Aos que não se conformam com a derrota nas urnas, só pedimos uma coisa: juízo.

Os petistas chegaram a citar a estabilidade econômica, implantada durante o governo Fernando Henrique ( PSDB). Disseram que ela foi uma das conquistas do Brasil pós- ditadura e reconheceram que “qualquer governo e partido vive bons e maus momentos, comete erros e acertos”.

Dilma apareceu disposta a dar uma resposta àqueles que colocam em dúvida sua disposição de enfrentar a crise:

— Estamos em um ano de travessia, e essa travessia vai levar o Brasil a um lugar melhor. Quem pensa que nos falta energia e ideias para enfrentar os problemas está enganado. Sei suportar pressões e até injustiças. Tenho ouvido e coração neste novo Brasil que não se acomoda, que passou a esperar, e exigir muito dos governos e das empresas.

Mas a presidente reconheceu que ainda há brasileiros em sofrimento:

— Neste novo Brasil, nenhum governo, nenhum governante pode se acomodar, muito menos uma pessoa como eu. Sei que muita coisa precisa melhorar. Tem muito brasileiro sofrendo. Mas juntos vamos sair dessa.

O programa que foi ao ar na noite de ontem terminou com imagens de pessoas batendo panelas e ironias a essa forma de protesto — comum nos últimos meses.

— Nos últimos tempos, começaram a dar uma nova utilidade às panelas. A gente não tem nada contra isso. Só queremos lembrar que fomos o partido que mais encheu a panela dos brasileiros. Se tem gente que se encheu de nós, paciência, estamos disposto a ouvir, corrigir, melhorar. Mas, com as panelas, vamos continuar fazendo o que a gente mais sabe: encher de comi da e esperança. Esse é o panelaço que gostamos de fazer pelo Brasil — afirmou José de Abreu.

— O governo do PT perde hoje mais uma extraordinária oportunidade de falar a verdade. Zomba da inteligência dos brasileiros. O programa não foi capaz de dizer uma palavra sequer em relação ao que vem acontecendo na Lava- Jato; sobre a prisão do tesoureiro do partido; sobre o fato de a maior liderança do partido, do ponto de vista da sua organização, o ex- ministro José Dirceu, estar preso — questionou Aécio Neves, em coletiva no Senado.