Governo busca pacto com Senado diante de Câmara ‘ ingovernável’

 

O globo, n. 29950, 07//08/2015. País, p. 4

 

A presidente Dilma Rousseff promoveu três reuniões ontem para debater o que o governo fará agora para enfrentar a crise política — uma com o vice Michel Temer e os ministros Aloizio Mercadante ( Casa Civil) e Eliseu Padilha ( Aviação Civil), outra com os ministros petistas, e a terceira com o presidente do Senado, Renan Calheiros ( PMDB- AL) —, e decidiu reforçar a articulação política e apostar no Senado para barrar as pautas- bomba que vêm sendo aprovadas na Câmara.

AILTON DE FREITASDilma Rousseff. Presidente fez ontem três reuniões para discutir medidas que ajudem a debelar a crise política

O apelo de Temer, feito na véspera, de uma união no Congresso para enfrentar a crise recebeu ontem o apoio das Federações das Indústrias do Rio ( Firjan) e de São Paulo ( Fiesp). As duas entidades divulgaram nota afirmando que o “momento é de responsabilidade, diálogo e ação para preservar a estabilidade institucional do Brasil”.

As federações ressaltam que “é hora de colocar de lado ambições pessoais ou partidárias e mirar o interesse maior do Brasil”.

— Os empresários não podem assistir a esse jogo vagabundo, de quinta categoria, da arquibancada. No fundo, ( a nota) é um grito para endossar o apoio ao Temer. Os políticos são eleitos para elevar o Brasil a um patamar melhor. ( A crise) Vai piorar, e o alvo são os empregos — afirmou ao GLOBO o presidente da Firjan, Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira.

— Já existe muita bomba todo dia, não precisamos de mais bombas, mas, sim, pautas de estímulo ao crescimento do país — disse o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, ao GLOBO.

Se a conclamação de Temer foi bem recebida pelo setor produtivo, ministros do PT passaram a acusar o vice de conspirar contra a presidente Dilma Rousseff, por ter afirmado que a crise é grave e que alguém precisa unir o país. Diante desse mal- estar, o peemedebista deu explicações na manhã de ontem à presidente. Em meio a articulações na própria base aliada para que Dilma não conclua o mandato, a interpretação de ministros petistas foi que o vice estava se credenciando para o cargo. Temer disse à presidente que sua intenção não foi essa, mas, sim, chamar a Câmara à responsabilidade.

Ontem, após dar uma palestra em uma universidade de Brasília, o vice- presidente voltou a defender o diálogo e explicou a declaração da véspera.

— Eu realmente resolvi fazer um apelo como articulador político do governo. É preciso que alguém faça esse apelo, e eu estou tomando, por isso, a liberdade de fazê- lo em nome do governo. O que vai precisar é diálogo, nada mais do que isso. Nós vamos continuar dialogando, não vamos nos impressionar com o dia de ontem, com o dia de hoje. Mas o alerta era indispensável — afirmou, em entrevista coletiva.

Na visão de um ministro próximo a Dilma, Temer sinalizou que a presidente não tem mais condições de unificar:

— A fala agrava a crise. É uma fala que pode ser interpretada, como muitos estão fazendo, como alguém se credenciando para o cargo.

Depois de sofrer mais uma derrota na Câmara, com a aprovação do aumento do teto salarial de advogados públicos e procuradores, o governo vai tentar barrar a chamada pauta - bomba no Senado. A avaliação dominante no governo é que os senadores, por terem mandatos mais longos, de oito anos, e por serem mais experientes, são menos suscetíveis à pressão das ruas. O assunto foi discutido na reunião com Temer, Mercadante e Padilha. No fim do dia, Dilma convidou Renan Calheiros para um conversa no Palácio do Planalto.

SENADO CRITICA DEPUTADOS

O diagnóstico foi que a Câmara está “ingovernável” e que os deputados não estão preocupados com o país. No Senado, um pacto entre governo e oposição para segurar as chamadas bombas fiscais pode dar certo. No plenário, os senadores Blairo Maggi ( PR- MT), Fernando Bezerra Coelho ( PSB- PE) e José Serra ( PSDB- SP) atacaram duramente o descontrole das votações na Câmara e avisaram que não compactuarão com o comportamento dos deputados.

Na antevéspera, em reunião da cúpula do PSDB e do PMDB na casa do senador Tasso Jereissati ( PSDB- CE), em que também se discutiu um cenário de possível afastamento de Dilma, os senadores acertaram que vão desarmar, no Senado, as bombas aprovadas na Câmara. Estavam presentes, entre outros, o presidente do Senado, Renan Calheiros, e o presidente do PSDB, Aécio Neves ( MG).

Mais tarde, em encontro apenas com ministros petistas — Jaques Wagner ( Defesa), Ricardo Berzoini ( Comunicações), Edinho Silva ( Comunicação Social), José Eduardo Cardozo ( Justiça) e Mercadante —, Dilma resolveu reforçar a articulação política, comandada hoje por Temer, pedindo que os petistas também comecem a trabalhar na recomposição da base do governo. Uma nova rodada de conversas com esse time anticrise foi convocada pela presidente para o próximo domingo.

— Ou os ministros se envolvem cotidianamente na reconstrução da base, ou fica muito difícil o Temer e Padilha levarem tudo sozinhos. O vice está muito sobrecarregado. E os ministros do PT têm que dar o exemplo — afirmou um ministro que tem participado dessas conversas com a presidente.