Correio braziliense, n. 19070, 12/08/2015. Brasil, p. 6

 

O retrato da violência contra as mulheres

Warner Bento Filho

Pesquisa revela que, apesar de a Lei Maria da Penha ter sido aprovada há nove anos, uma em cada cinco brasileiras sofre agressões. Situação é mais frequente entre as que têm nível de escolaridade baixo.

Uma em cada cinco brasileiras é vítima de violência doméstica ou familiar, mas apenas a minoria denuncia os casos, apesar da ampla divulgação da Lei Maria da Penha. O maior número de agressões se dá contra as que têm menos escolaridade — 27% têm ensino fundamental, 18% concluíram o ensino médio e 12% têm formação universitária. As informações estão em pesquisa feita pelo instituto Data Senado, divulgada ontem. O instituto entrevistou 1.102 mulheres entre 24 de junho e 7 de julho. Na maioria das vezes (73%), as agressões são praticadas por homens com quem as vítimas têm ou tiveram relação afetiva — marido (49%), ex-marido ou ex-namorado (21%) ou namorado (3%).

A violência física é a mais apontada nas declarações (66%), mas o índice de vítimas de violência psicológica vem subindo. Em pesquisa do Data Senado no ano passado, o percentual foi de 38%. Agora, passou para 48%. Os casos de abuso ou violência sexual respondem por 11% das ocorrências. Ciúmes e bebida aparecem como as principais causas das agressões.

 

A pesquisa revela que a maioria das vítimas (57%) considera que a mulher não é tratada com respeito no Brasil. Entre as que nunca sofreram violência, esse índice é de 40%. O atendimento nas delegacias é considerado ótimo ou bom para 48% das entrevistadas. As que avaliam o serviço como regular somam 14%. Para 38% delas, o atendimento é ruim ou péssimo.

“A Lei Maria da Penha ainda não se consolidou”, afirma o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para quem a violência contra as mulheres é, “antes de tudo, uma grande violação dos direitos humanos”. Aprovada em agosto de 2006, a Lei Maria da Penha, que visa combater a violência doméstica contra a mulher, completa nove anos.

A ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Eleonora Menicucci, que participou do ato de divulgação da pesquisa no Senado ontem, disse que esse tipo de estudo é importante para “dar mais visibilidade ao problema e para que a sociedade se conscientize de que não podemos conviver com essa chaga”.

A ministra apresentou relatório dos atendimentos feitos pelo Disque 180 no primeiro semestre deste ano. O serviço atende mulheres brasileiras no Brasil e em outros 15 países. Segundo a ministra, foram 750 mil atendimentos no período. “Chama a atenção o fato de que a maioria das mulheres que denunciaram agressões, 65%, não são dependentes econômicas do companheiro”, disse Eleonora Menicucci.

A senadora Simone Tebet (PMDB-MS) lembrou que o Brasil é o sétimo país mais violento contra a mulher entre os pesquisados pela Organização das Nações Unidas (ONU). “O caminho é longo, mas o importante é que estamos avançando”, disse.

 

Cotas

 

O plenário do Senado deve votar hoje o projeto de emenda à Constituição (PEC) que reserva vagas para mulheres no Congresso Nacional, nas assembleias legislativas, na Câmara Legislativa do Distrito Federal e nas câmaras municipais. A PEC estabelece um patamar crescente de cadeiras destinadas às mulheres. Na primeira eleição após a aprovação da proposta, a reserva terá de ser de 10% do total. Na segunda, passa para 12% e, na terceira, para 16% das cadeiras.

Atualmente, a lei assegura a reserva de vagas entre os candidatos. As listas de postulantes de cada partido devem ser preenchidas por, no mínimo, 30% de mulheres. A determinação, no entanto, nem sempre é cumprida. A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), que defende a aprovação da proposta, disse que a alteração é importante por se tratar de um benefício “não só para as mulheres, mas para o amadurecimento de nossa democracia”.

Políticas de incentivo à participação das mulheres no parlamento apresentam bons resultados em países do continente. No México, as mulheres ocupam 142 de um total de 500 cadeiras do parlamento (28%). Na Argentina, a presença de mulheres em cargos públicos vem aumentando nas últimas décadas. Hoje, ocupam 37% das vagas na Câmara e 36% no Senado. No Brasil, raramente a participação feminina supera os 10%.