Brasil e Alemanha buscam impulso comercial

Andrea Jubé, Daniel Rittner e Lucas Marchesini 

21/08/2015

Em busca de uma agenda positiva, a presidente Dilma Rousseff pediu à chanceler Angela Merkel investimentos no programa de concessões de infraestrutura e empenho da Alemanha nas negociações de um acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia, além de ter garantido que as novas metas brasileiras para redução das emissões de gases do efeito-estufa até 2030 serão anunciadas em setembro.

Merkel disse que há interesse nos leilões de infraestrutura e se comprometeu a pressionar Bruxelas, sede da Comissão Europeia, por mais velocidade nas negociações comerciais. A troca de ofertas entre os dois blocos está prevista para o último trimestre deste ano. "Em tempos econômicos difíceis no mundo, abordamos a cooperação em nível econômico", afirmou a chanceler, em uma declaração conjunta, no Palácio do Planalto. "O Mercosul é bastante heterogêneo, mas o Brasil é a liderança. Vamos trabalhar com a Comissão Europeia para acelerar as negociações pelo acordo Mercosul-UE", resumiu.

A goleada de 7 a 1 na semifinal da Copa do Mundo foi o cardápio em todas as mesas nas quais 12 ministros e vice-ministros alemães se distribuíram na quarta-feira à noite, no Palácio da Alvorada, em jantar informal com seus colegas brasileiras para dar pontapé inicial nos trabalhos. "Foi o assunto inevitável para quebrar o gelo", confessou um dos participantes. Ele relatou que a própria Merkel tomou a iniciativa de provocar Dilma graciosamente. "Eu sei que as consequências do 7 a 1 podem ser dramáticas para a Alemanha", afirmou a chanceler, segundo os relatos, temendo uma vingança da seleção brasileira.

Com abraços fraternos, frequentemente sem a ajuda de intérpretes, Dilma e Merkel demonstraram bastante sintonia em todos os momentos. Elas fizeram uma declaração específica sobre mudanças climáticas em que reconhecem o "papel decisivo" dos dois países na tentativa de limitar em dois graus centígrados o aumento da temperatura média global até o fim do século. Dilma prometeu anunciar no mês que vem as metas brasileiras de redução dos gases-estufa para a COP 21, a conferência internacional do clima em Paris, marcada para dezembro. Ela preferiu não antecipar nada e apenas repetiu a promessa, feita durante sua visita à Casa Branca, de reduzir para zero o desmatamento ilegal na Amazônia até 2030.

O estilo alemão impediu a comitiva chefiada por Merkel, no entanto, de evitar um discurso franco sobre o país. O vice-ministro das Finanças, Jens Spahn, recomendou mais segurança regulatória para viabilizar investimentos nas concessões de infraestrutura. "Estou bem impressionado com o plano de investimentos do governo [brasileiro] por todo o país. Cinco mil quilômetros de rodovias é bem impressionante."

Questionado se as companhias alemães vão entrar nos leilões, no entanto, Spahn fez uma ponderação. "Na verdade, para fazer isso [investir], precisamos talvez de outro tipo de regulação, para tornar [as oportunidades] mais atraentes para os investimentos. Você precisa de mais segurança. Queremos que mais empresas alemãs invistam, mas é preciso que o quadro seja mais interessante do que hoje. Você precisa de segurança sobre impostos, por exemplo", comentou.

O ministro dos Portos, Edinho Araújo, se animou com as perspectivas abertas. "Eles ficaram de levar as oportunidades para os empresários alemães", disse Edinho, que apresentou os planos de arrendamentos de terminais portuários.

No mesmo estilo direto dos germânicos, a ministra da Agricultura, Kátia Abreu, abordou as dificuldades para um acordo Mercosul-UE e garantiu ao colega alemão que o bloco sul-americano está pronto para fazer sua proposta. Em resposta, o ministro da Alemanha teria dito que "tudo que é bom demora um pouco, mas esse acordo está demorando demais". 

Empresários cobram acordo de bitributação entre os 2 países

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Federação das Indústrias Alemãs (BDI) entregaram ontem à presidente Dilma Rousseff e à chanceler Angela Merkel uma carta conjunta em que pedem o relançamento de negociações para um acordo de bitributação entre os dois países.

O ofício foi assinado pelos presidentes da CNI, Robson Andrade, e da BDI, Ulrich Grillo. Brasil e Alemanha tinham um acordo bilateral para evitar a dupla tributação de empresas que vigorou por 30 anos, mas foi suspenso em 2005 (denunciado, no jargão diplomático) pelo governo social-democrata do ex-chanceler (primeiro-ministro) Gerhard Shroeder. Os socialistas de Berlim argumentavam na época que queriam aplicar um acordo mais moderno, propondo o modelo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).

As duas entidades ressaltam que um novo acordo é prioritário para "suprir a lacuna regulatória" decorrente da suspensão do antigo tratado. Há cerca de 1.500 empresas alemães de pequeno, médio e grande portes instaladas no Brasil. Elas representam 10% de todo o PIB industrial do país.

Tradicionalmente, a Alemanha defende um modelo de acordo pelo qual a tributação se baseia no domicílio do investidor, enquanto a prática brasileira é que a taxação seja feita no local do investimento. As confederações industriais pedem o "rápido relançamento" das negociações.

Um levantamento da CNI com empresários brasileiros demonstra que a Alemanha está na lista de países com maior prioridade para o fechamento de novos acordos de bitributação. A relação inclui Estados Unidos, Reino Unido, Paraguai, Colômbia e Austrália.

Um acordo do gênero normalmente prevê como será feita a distribuição do Imposto de Renda recolhido pelos países signatários. O gerente de comércio exterior da CNI, Diego Bonomo, explica que o governo brasileiro fez uma espécie de "mix" dos três modelos tomados como referência: o da OCDE, o das Nações Unidas e o dos Estados Unidos.

Bonomo reconhece que pode ser difícil retomar as discussões sobre um acordo amplo, como gostariam de ver as duas entidades empresariais, mas faz uma ponderação: "Há passos possíveis que podem ser dados enquanto não se discute a dupla tributação propriamente dita".

Um desses passos é uma troca de informações tributárias - tendo como base o Tax Information Exchange Agreement (TIEA). Outro é um acordo para evitar a cobrança de Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) especificamente no setor aéreo, em que as companhias pagam alíquota de 9%, impacto sobre a Lufthansa.

Na carta conjunta, a CNI e a BDI vão pedir ainda empenho dos dois governos na conclusão de um tratado de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia. Por fim, reivindicam o reconhecimento mútuo entre os programas de "operador econômico autorizado" brasileiro e europeu, que diminuem os entraves burocráticos no processamento de exportações e importações. A facilitação de comércio foi objeto de um acordo global no fim de 2013, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), mas cada país ainda precisa ratificar internamente esse tratado.