Cunha garante que ficará na presidência da Câmara

Thiago Resende, Raphael Di Cunto e Andrea Jubé 

21/08/2015

Denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por crimes de lavagem de dinheiro e corrupção passiva, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), disse em nota que é inocente e continuará comandando a Casa "com a mesma lisura e independência que sempre o nortearam".

Refratário a deixar o cargo, o pemedebista já se preveniu caso o Supremo Tribunal Federal (STF) aceite a denúncia e o torne réu. "Em 2013, por outro motivo, fui denunciado pelo Ministério Público Federal. A denúncia foi aceita pelo STF por maioria e, posteriormente, em 2014, fui absolvido por unanimidade."

Cunha estava em seu gabinete quando recebeu a confirmação da denúncia. Enquanto um grupo de deputados pedia sua saída em entrevista a poucos metros da sala da presidência, o pemedebista reunia deputados aliados para elaborar a nota divulgada duas horas depois da acusação.

Antes de responder, Cunha leu todas as 85 páginas encaminhadas pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e rebateu pontos da acusação que, segundo relatos, teria julgado "fraca". "Vimos uma denúncia muito rica em opiniões, mas carente de provas", afirma o deputado Carlos Marun (PMDB-MS). A acusação, disse, não mostra nenhuma conta no nome do presidente.

Aos aliados, Cunha repetiu o que vem dizendo desde o doleiro Alberto Youssef citá-lo no escândalo da Petrobras em fevereiro: é perseguido por sua posição independente no comando da Câmara. "Fui escolhido para ser investigado e, agora, ao que parece, estou também sendo escolhido para ser denunciado, e ainda figurando como o primeiro da lista", disse.

Ele procurou ainda marcar posição em relação ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também investigado, mas, por ora, fora da lista de denunciados e que fechou acordo com o governo. Na nota, Cunha frisou que não participou nem participará de "qualquer acordão" e, com os desdobramentos do caso, "assistiremos a comprovação da atuação do governo" que reconduziu Janot para a PGR "na tentativa de calar e retaliar minha atuação política".

"É muito estranho não ter ainda nenhuma denúncia contra membro do PT ou do governo detentor de foro privilegiado. À evidência de que essa série de escândalos foi patrocinada pelo PT e seu governo, não seria possível retirar do colo deles e tampouco colocar no colo de que sempre contestou o PT, os inúmeros ilícitos praticados na Petrobras", escreveu.

Em resposta, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República divulgou nota oficial em que diz que não comentará as acusações. "O governo da presidenta Dilma acredita na isenção das instituições que apuram as denuncias."

Nos bastidores, aliados veem nos ataques a Janot um dos motivos para Cunha ser o primeiro da lista de indiciados e, por isso, o pemedebista foi aconselhado por alguns a "aliviar" no tom para não "bater de frente" com o PGR, mas ignorou. "Respeito o Ministério Público Federal, como a todas as instituições, mas não se pode confundir trabalho sério com o trabalho de exceção, no meu caso, feito pelo procurador-geral."

Declarou ainda estar aliviado agora, após a apresentação da denúncia, pois as "ilações" da PGR passarão a ser analisadas pelos ministros do STF, em quem confia "plenamente na isenção e na imparcialidade [...] para conter essa tentativa de injustiça".

Após a denúncia, Cunha evitou a imprensa, mas pela manhã afirmou que recebeu várias manifestações de apoio de parlamentares. "[A acusação não muda] Nem na minha agenda, nem na minha vida, nem em absolutamente nada", disse.

Manifesto de 40 deputados defende renúncia

Thiago Resende, Raphael Di Cunto, Vandson Lima e Raquel Ulhôa 

Um grupo entre 30 e 40 deputados, os líderes do movimento não dão o número exato nem quantos de cada partido, divulgou manifesto em que classificam a acusação a Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, como gravíssima, e "torna insustentável a permanência dele no comando da Casa". A Câmara é formada por 513 deputados.

"Em defesa do Parlamento, dizem os signatários, "clamamos pelo afastamento imediato de Eduardo Cunha da Presidência da Câmara dos Deputados.

O texto foi lido pelo líder do PSOL na Câmara, Chico Alencar (RJ), enquanto parlamentares e líderes partidários aliados a Cunha se reuniam em seu gabinete para discutir a denúncia.

Aliado do presidente da Câmara, o líder do PMDB na Casa, Leonardo Picciani (RJ), achou "fraca" a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o correligionário. "Não tem fato irrefutável", disse. Segundo ele, Cunha também teve a mesma percepção. Picciani afirmou ainda que não se pode condenar uma pessoa com ilações. O líder do PMDB classificou como equivocada a atitude de deputados que assinaram o manifesto pedindo o afastamento imediato de Cunha da presidência da Câmara. Tem que ser garantido o direito de defesa e presunção de inocência, advertiu.

Picciani esperava publicar uma nota ainda ontem em que a bancada do partido na Câmara manifestaria apoio ao presidente da Casa.

A nota de ontem foi assinada por integrantes de dez partidos políticos, mas os líderes do movimento não informaram quantos de cada partido. Teria um deputado do PMDB, o partido de Cunha. Presentes no manifesto o PSOL, PSB, PT, PPS, PDT, PMDB, PR, PSC, Pros e PTB.

Para o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), a denúncia apresentada contra o presidente da Câmara é o início de um processo de apuração e, dessa forma, é preciso aguardar antes de se fazer qualquer julgamento. "Sempre defendemos o aprofundamento das investigações e o instituto da delação premiada, independente de quem esteja envolvido. Caberá a ele, agora, apresentar a sua defesa e depois disso, o STF irá definir se aceitará ou não a denúncia".

O líder do DEM na Casa, Mendonça Filho (PE), disse que se confirmada a denúncia esse é uma fato grave, mas não fará "pré julgamento nem vai blindar" ninguém. Ele defendeu que seja garantido o direito de defesa a Cunha e que a investigação busque a verdade. Questionado se Cunha teria condições de permanecer no cargo mesmo como réu, Mendonça Filho, um dos aliados do presidente da Câmara, respondeu: "Vamos aguardar os próximos passos".

O presidente do DEM, senador José Agripino (RN), afirmou que a PGR "cumpriu sua obrigação" ao apresentar ao Supremo denúncia contra Cunha e o senador Fernando Collor (PT-AL). Para Agripino, a denúncia "cria inquietação" nas duas Casas, "mas não exaspera". A denúncia contra Cunha também não é motivo para seu afastamento da presidência da Câmara, diz. "Denúncia não é condenação".

O senador Romero Jucá (PMDB-RR) defendeu uma postura cuidadosa em relação à denúncia contra o presidente da Câmara: "Todas as denúncias devem ser averiguadas. É preciso ter muita tranquilidade e muito equilíbrio neste momento. Estamos em um regime democrático, não há nenhum demérito em ser investigado. O demérito é ser condenado."

Jucá disse que o PMDB não fez qualquer discussão sobre a situação de Cunha na sigla e que sua permanência à frente da Câmara é algo a ser avaliado pelos deputados. "Se há um tipo de denúncia há também o direito de defesa. Não podemos prejulgar". Entre os parlamentares que tiveram pedido de abertura de inquérito - fase anterior à denúncia - por Janot, está o próprio Jucá.

O procurador será sabatinado na quarta-feira na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Dos 13 senadores investigados, oito são titulares da CCJ.

Para Wagner, há 'ruído' na relação com o Congresso

Bruno Peres, Lucas Marchesini e Cristiane Agostine 

Integrante da coordenação política do governo, o ministro da Defesa, Jaques Wagner, disse ontem que a denúncia à Justiça, por acusação de corrupção e lavagem de dinheiro, do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), "evidentemente" cria um "ruído" na relação política do Palácio do Planalto com o Congresso e um clima de suspeição que paralisa o país. Já a presidente Dilma Rousseff recusou-se a comentar a denúncia contra Cunha, porque, segundo ela, "a Presidência da República não faz análise a respeito de investigações, de maneira alguma, nem de outros Poderes". Dilma respondeu a perguntas da imprensa após se despedir da chanceler alemã Angela Merkel, com quem almoçou no Palácio do Itamaraty.

Próximo à presidente e ao seu antecessor Luiz Inácio Lula da Silva, Wagner defendeu o esforço em diversas frentes para combater a corrupção, enfatizando a necessidade de preservar o funcionamento do país. Questionado sobre reflexos na relação do governo com os parlamentares do avanço de investigações contra políticos aliados, o ministro disse que o governo vai "continuar respeitando a institucionalidade e negociando com quem representa o povo" no Congresso.

"A Lava-Jato é muito bem-vinda, mas o sensacionalismo em torno dela é ruim, porque acaba que há respingos na economia, que são preocupantes, e na política também, mas isso não quer dizer que a gente não queira que a investigação avance", disse Wagner, durante entrevista na sede do ministério em Brasília. O ministro esteve reunido com seu contraparte alemão, Ralf Brauksiepe, para tratar de entendimentos entre Brasil e Alemanha na área de defesa.

Em São Paulo, o presidente nacional do PT, Rui Falcão, classificou como gravíssima a denúncia contra o presidente da Câmara. Falcão evitou falar sobre o afastamento de Cunha do cargo, mas afirmou que juristas entendem que o pemedebista precisa sair do comando da Câmara durante a investigação pelo STF.

"Caso o Supremo acate a denúncia, os juristas dizem que a Constituição exige o afastamento imediato no prazo de 180 dias para julgar. Se não houver comprovação da denúncia, ele volta ao cargo", afirmou Falcão, ao participar de um ato organizado por movimentos sociais contra o ajuste fiscal e em favor da democracia, em São Paulo.

O presidente do PT afirmou que vai reunir a bancada federal petista na segunda-feira, em Brasília, para definir se o partido pedirá o afastamento de Cunha da presidência da Câmara.