Correio braziliense, n. 19068, 10/08/2015. Política, p. 3

 

Propina de Gim em detalhes  

Jorge Macedo

O presidente da construtora UTC, Ricardo Pessoa, deu detalhes na delação premiada que firmou com a Procuradoria-Geral da República sobre o repasse de R$ 5 milhões que fez ao ex-senador Gim Argello durante 2014. Segundo Pessoa, a propina foi paga como doação eleitoral e tinha como objetivo proteger as empreiteiras investigadas na CPI mista da Petrobras à época.

Gim era o vice-presidente da CPI mista da Petrobras e participou de outra comissão exclusiva no Senado. O ex-senador tentou a reeleição no ano passado, mas acabou derrotado nas urnas. Do valor total pago por Pessoa, Gim teria distribuído R$ 3,5 milhões entre seis candidatos no DF, dos quais três foram eleitos: um deputado federal e dois distritais. Chama a atenção que todos os repasses foram declarados à Justiça Eleitoral.

Segundo reportagem da Folha de S.Paulo, divulgada ontem, o ex-governador José Roberto Arruda (PR, ex-DEM), o ex-senador Luiz Estevão (PRTB), o deputado Alberto Fraga (DEM) e a assessoria de um parlamentar, esta sob condição de anonimato, afirmaram que Gim obteve o dinheiro e o repassou às campanhas. As doações da UTC chamam a atenção inclusive dos beneficiados, já que a UTC não executa obras no Distrito Federal. De acordo com a Folha, o ex-governador Arruda afirmou que Gim “buscou ajudar as campanhas” e confirmou que recebeu R$ 1 milhão da construtora. Arruda, no entanto, não soube explicar como Gim conseguiu o dinheiro.

Já o deputado Alberto Fraga comentou com o jornal paulista que a verba foi prometida por Gim em uma reunião da coligação e que tinha como objetivo buscar apoio à reeleição dele ao Senado. “Ele me disse: ‘Fraga, eu preciso de sua ajuda, politicamente, e vou lhe ajudar, viabilizar recursos para sua campanha’”, afirmou. A doação, também no valor de R$ 1 milhão, representou 72% do total arrecadado pelo deputado.

As doações de Gim causaram divergência dentro do PRTB. A deputada distrital Liliane Roriz, que teve 99% da campanha bancada pela UTC, com doação de R$ 1 milhão, alegou que o valor chegou por meio do partido e que a negociação foi feita pelo presidente de honra do PRTB, senador Luiz Estevão. Segundo a defesa da parlamentar, a verba foi devidamente declarada na Justiça Eleitoral e, caso venha a ser chamada pela Polícia Federal, pelo Ministério Público ou pela Justiça Eleitoral, não terá nenhuma dificuldade em esclarecer os fatos. Estevão, no entanto, conta outra versão. Segundo ele, houve um acerto entre Gim e a família Roriz. “A deputada Liliane me procurou informando que receberia uma doação de R$ 1,2 milhão, que teria sido articulada pelo senador Gim Argello, e me perguntou se essa doação poderia ser feita na conta do partido, e então repassada a ela”, revelou à Folha. Procurado para comentar o caso, o ex-senador Gim Argello afirmou que só falará sobre as doações depois que tiver acesso à delação do empreiteiro Ricardo Pessoa.

Investigação

A revelação de Ricardo Pessoa intrigou integrantes da atual CPI da Petrobras na Câmara. O deputado Ivan Valente (PSol-SP) disse que vai esperar o ex-senador Gim Argello ser denunciado pelo Ministério Público para elaborar o requerimento de convocação para depor. “Caso ele seja denunciado, é certo que entraremos com uma representação contra ele. Essa denúncia precisa ser apurada. A CPI não faz nenhuma distinção entre parlamentares e pessoas que não estão mais aqui. Com ou sem mandato, se ele tiver envolvido no escândalo, deverá vir e prestar esclarecimentos”, afirmou.

“Esse caso é claramente grave, podemos notar que essa propina visava impedir as investigações da CPI no ano passado. O Gim recebeu a verba para alavancar a candidatura ao Senado, além de se favorecer em projetos pessoais. O mais interessante nisso tudo é que nenhum dos deputados beneficiados com a verba teve a curiosidade de questionar de onde vinha o dinheiro. Sem a delação, não seria possível saber como ele havia conseguido bancar todas essas campanhas. Era de se imaginar que fosse dinheiro vindo de propina. É claro que todos que receberam as doações vão dizer que a verba era legal, sendo que não era. A verdade é que o Gim pretendia cooptar todo o esquema que envolve a família Roriz para si, já que eles têm grande influência”, argumentou.