Dólar volta a subir e analistas veem cotação em até R$ 3,70 este ano

 

O globo, n. 29948, 05//08/2015. Economia, p. 24

ANA PAULA RIBEIRO

 

Uma política fiscal mais fraca e o ambiente político conturbado estão fazendo com que bancos e consultorias revisem para cima (e bem para cima) as projeções para o dólar. Essas estimativas, em grande parte, já incluem o maior risco de o Brasil perder o grau de investimento, devido à deterioração das contas públicas. Toda essa aversão fez com que a moeda americana chegasse ontem a R$ 3,465 — uma valorização de 0,31% e uma nova máxima para a divisa em 12 anos, desde os R$ 3,479 de 20 de março de 2003.

— Esperávamos um esforço fiscal mais forte, mas, com a revisão da meta de superávit, aumentou o risco de um rebaixamento de nota ( rating). E temos a questão política, que aumenta a incerteza e traz mais volatilidade — disse Marcelo Kfoury, superintendente do Departamento Econômico do Citi Brasil.

A instituição elevou a sua projeção para o dólar no fim do ano de R$ 3,20 para R$ 3,30, e, em 2016, para R$ 3,60. Mas a depreciação do real pode ser ainda mais forte. O UBS revisou suas estimativas para o dólar em dezembro deste ano de R$ 3 para R$ 3,70. Para Guilherme Loureiro, economista do UBS, a meta fiscal menor, que foi reduzida de 1,1% do PIB para 0,15% no último dia 22, não será suficiente para estabilizar a relação entre dívida pública e PIB.

— A deterioração das contas fiscais e a maior aversão ao risco vão manter o real sob pressão — disse.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou ontem em Brasília que o câmbio é e continuará flutuante. Ele respondia a uma pergunta sobre como via a possibilidade de o dólar se manter em torno de R$ 3,50 pelo menos nos próximos dois anos, como defendem integrantes do próprio governo.

— Nossos principais parceiros se encontram em momento de ajuste. Muito em breve, haverá o ajuste dos juros nos Estados Unidos. As indicações são bem claras. O dólar é flutuante e permanece flutuante — afirmou Levy.

Mas, na visão dos economistas, é o risco interno que está fazendo com que o real tenha o pior desempenho entre as moedas de países emergentes. No ano, o dólar já acumula valorização de 30,2% frente ao real — muito mais do que a apreciação da moeda americana frente ao peso mexicano, em torno de 20%, e em relação à lira turca, um pouco abaixo desse patamar. Para Mauricio Molan, economistachefe do Santander, a pressão sobre a moeda indica que o mercado, de forma geral, já embutiu nas projeções o rebaixamento do país.

— O mercado já precifica a piora no ambiente político e a perda do grau de investimento, mesmo que possa haver um certo exagero nessas projeções — disse Molan, que vê o dólar a R$ 3,60 em 2016.

E a possibilidade de perda do grau de investimento não está presente apenas na pressão sobre o dólar. Os

credit default swaps (CDS), uma espécie de seguro para quem investe em papéis da dívida brasileira, também mostram o aumento desse risco. Esse instrumento com prazo de cinco anos era negociado ontem a 304 pontos, acima dos 200 pontos no fim do ano passado. O valor já se aproxima do que é praticado no CDS da Rússia (350 pontos), país que enfrenta sanções econômicas, e bem acima dos indicadores de Colômbia e México, respectivamente, em torno de 190 e 140 pontos.

Esse cenário fez o banco Fator elevar projeções, sobretudo após a agência Standard & Poor’s ter colocado a nota do Brasil em perspectiva negativa. Para este ano, a estimativa do dólar passou de R$ 3,35 para R$ 3,50 e, para 2016, de R$ 3,45 para R$ 3,60:

— A crise política impede o governo de negociar com o Congresso para aprovar as medidas necessárias ao ajuste, então esse ambiente conturbado acaba ajudando nessa deterioração — disse o economista-chefe do Fator, José Francisco de Lima Gonçalves.

AJUDA NA BALANÇA COMERCIAL

A Tendências Consultoria também revisou suas projeções, de R$ 3,15 para R$ 3,50 este ano, e de R$ 3,60 para R$ 3,70 em 2016.

Mas se a alta do dólar pressiona a inflação e atrapalha quem precisa fazer gastos em dólar, por outro lado, ajuda a equilibrar a conta corrente — que é o balanço das operações que o Brasil faz com o exterior. Essa conta está deficitária, mas espera-se uma reversão nesse quadro, com melhora da balança comercial e um volume menor de remessa de lucros e dividendos e gastos com viagens no exterior.