O globo, n.29.945, 02/08/2015. País p. 3

Vitória incerta

Ameaça de veto a Janot no Senado acirra disputa dos candidatos a procurador-geral pelo 2º lugar

Um capítulo decisivo da Lava-Jato ocorrerá quarta-feira, na eleição para procurador-geral da República, responsável pelos inquéritos de parlamentares. Os três desafiantes de Rodrigo Janot, atual ocupante do cargo e favorito, disputam o segundo lugar na lista a ser enviada à presidente Dilma. Isso porque, se Janot ganhar, há risco de veto no Senado. Procuradores da República vão às urnas na quarta-feira para escolher o nome do procurador-geral, numa disputa acirrada que pode definir o capítulo mais importante da Operação LavaJato até o momento: caberá ao chefe do Ministério Público Federal pedir ou não abertura de processo contra parlamentares envolvidos no escândalo de corrupção na Petrobras. Os subprocuradores Carlos Frederico, Raquel Dodge e Mario Bonsaglia — que concorrerão contra o atual procurador-geral, Rodrigo Janot — adotaram uma estratégia singular. Almejam, no mínimo, o segundo lugar na preferência dos colegas de corporação. Isso porque, mesmo no caso de Janot ser o mais votado, sua recondução pode ser barrada no Senado, onde enfrenta resistências. O mandato do procurador-geral acaba dia 17 de setembro.

Os mais votados entre os quatro integrarão uma lista tríplice a ser enviada à presidente Dilma Rousseff. Caberá a ela indicar o nome a ser sabatinado e votado no Senado, onde estão alguns dos políticos investigados por suposto envolvimento com irregularidades na Petrobras.

JANOT VIROU ALVO PREFERENCIAL

Desde que pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de inquéritos contra deputados e senadores acusados de corrupção na Petrobras, Janot se tornou o alvo preferido dos investigados. Nos corredores do Congresso, circulam informações de que parlamentares atuam para impedir a recondução do procurador-geral. Entre eles, o senador Fernando Collor (PTB-AL), um dos investigados. O Senado nunca barrou a indicação de um procurador-geral, nem mesmo a de Antônio Fernando de Souza, autor da denúncia do mensalão.

No governo, é dado como certo que Dilma indicará o primeiro colocado da lista, como vem ocorrendo desde o primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A campanha entre os procuradores foi aberta informalmente no início do ano. No começo, o cenário indicava que Janot se candidataria à recondução sem adversários. Mas, nos últimos dois meses, a situação mudou. Bonsaglia, Raquel e Frederico decidiram entrar na disputa, que se acirrou depois da movimentação de alguns senadores para barrar uma eventual indicação do atual procurador-geral. Aumentaram as chances do segundo colocado.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Robalinho Cavalcanti, diz que a entidade ainda não discutiu a questão, mas não vê o risco de uma eventual rejeição de Janot ou de outro candidato como uma ofensa à autonomia do Ministério Publico. Isto porque entre as atribuições constitucionais do Senado está a de ratificar ou rejeitar indicações ao cargo de procurador-geral. A lei não exclui da sabatina senadores investigados. Cavalcanti diz ainda que não acredita em reprovação na sabatina, porque os candidatos são qualificados para o cargo de chefe do Ministério Público:

— Se por acaso isso acontecer (a rejeição de Janot), é natural a reação do Senado em fazer seu crivo. Mas nossa expectativa é que isso não aconteça. A carreira tem confiança de que o Senado exercerá sua capacidade de análise no mais alto nível.

Cavalcanti afirma também que o compromisso da ANPR é com a lista tríplice, e não com um nome específico. Nesse caso, Dilma poderia indicar qualquer um dos três primeiros colocados no pleito de quarta-feira, não necessariamente o nome mais votado. O governo acompanha a disputa com preocupação, mas à distância. Cabe ao procurador-geral decidir também sobre eventuais investigações contra a presidente da República. Numa entrevista na última quarta-feira, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que ainda não tratou da sucessão na Procuradoria-Geral com a presidente.

— Ainda não tem o resultado (da eleição interna). Não nos cabe fazer juízo de valor — disse.

Maior risco para recondução de Janot é votação secreta do plenário

 

BRASÍLIA- A oposição deve ser o fiel da balança na aprovação ou não da recondução do procuradorgeral da República, Rodrigo Janot, no Senado. Aliados do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL) — que está na lista dos investigados da Operação Lava-Jato —, dizem, reservadamente, que ele não assumirá o risco público de carimbar uma retaliação ao chefe do Ministério Público Federal, fazendo a “bravata” de engavetar a provável indicação da presidente Dilma Rousseff por sua recondução. Peemedebistas e aliados de Renan e do senador Fernando Collor (PTB-AL), também investigado, calculam que Janot pode até ser aprovado na sabatina da Comissão de Constituição e Justiça, mas dificilmente passará na votação do plenário, onde precisará ter no mínimo 41 votos.

Hoje a recondução de Janot no Senado está na mão de três grupos. O primeiro, a favor, é formado por petistas e senadores mais alinhados ao Planalto. O segundo, contra, é liderado por Collor e aliados de Renan no PMDB, no PTB e em outros partidos da base. O terceiro grupo reúne a oposição, que tende a apoiar a recondução de Janot, apesar de dois senadores do PSDB, Aloysio Nunes Ferreira (SP) e Antonio Anastasia (MG), já terem sido citados por delatores da operação Lava-Jato. .

O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) defende a recondução, argumentando que a atuação de Janot atende às exigências da sociedade. E diz que não há justificativa para “expedientes protelatórios” por parte de Renan. Já os desafetos de Janot apontam como um dos principais entraves à sua recondução uma suposta proximidade de Dilma. Ainda apontam como fator de rejeição no plenário, por parte do PT e do PCdoB, o fato de Janot ter permitido que o MP do Distrito Federal abrisse investigação contra o ex-presidente Lula.

Renan nega que vá fazer qualquer boicote no processo de recondução de Janot. Em nota divulgada antes do recesso, disse ser “totalmente improcedente” notícia de que engavetaria a indicação.