Dólar sobe a R$ 4,109 por temor de rebaixamento do país pela Fitch

 

ANA PAULA RIBEIRO

O globo, n. 30003, 29//09/2015. Economia, p. 18

 

O temor de que o país seja novamente rebaixado, agora pela agência Fitch, pressionou o câmbio. E a dívida pública subiu 3,16% em agosto, para R$ 2,686 trilhões. - SÃO PAULO E BRASÍLIA- Em um pregão de mau humor generalizado, o dólar comercial voltou a superar os R$ 4 com o temor de que a curto prazo a Fitch corte a nota de crédito do Brasil. A moeda americana fechou a R$ 4,109, uma valorização de 3,37% ante o real, a maior alta em um único pregão desde novembro de 2008. O dólar subiu com mais força no fim do pregão, após declarações do diretor executivo da Fitch no Brasil, Rafael Guedes, indicando que a agência de classificação de risco poderá rebaixar a nota do país.

Com essa escalada do dólar, o Banco Central decidiu, logo após o fechamento dos negócios, anunciar uma nova intervenção no mercado cambial a ser realizada hoje. Essas operações podem somar até US$ 3 bilhões. Já o Ibovespa recuou 1,95%, aos 43.956 pontos, puxado por Vale e Petrobras em um ambiente de aversão global ao risco. Essa é a sétima queda consecutiva e o menor nível do índice desde 7 de abril de 2009, quando chegou aos 43.824 pontos.

FITCH: “A QUALQUER MOMENTO”

A autoridade monetária anunciou que fará hoje uma oferta de 20 mil contratos de swap cambial, que equivalem a uma venda de moeda ao mercado. Essa operação pode chegar a US$ 1 bilhão. Além disso, o BC fará um um leilão de linha de até até US$ 2 bilhões. Nesse tipo de operação, o BC vende dólares com o compromisso de recompra, sem impacto nas reservas cambiais.

Ontem, o diretor executivo da Fitch afirmou, em evento em São Paulo, que “uma mudança de rating do Brasil pode ocorrer a qualquer momento”.

Na Fitch, o país ainda está com um rating duas notas acima do grau especulativo. O Brasil já perdeu o selo de bom pagador pela Standard & Poor’s.

Segundo Guedes, da Fitch, a agência de classificação de risco não costuma fazer um rebaixamento de duas notas de uma só vez, mas ele lembrou que na crise de 2002 isso ocorreu com o Brasil.

— O governo não sabe como conseguir cooperação do Congresso. As medidas não são difíceis de passar, mas o Congresso dificulta — avaliou Guedes. Se o Brasil perder o investment grade por outra agência de classificação de risco, grandes fundos de investimento globais deixarão de destinar recursos ao país porque são obrigados, em seus estatutos, a aplicarem apenas em países com o selo de bom pagador por pelo menos duas das três grandes classificadoras de rating.

— As declarações do representante da Fitch causaram um estresse maior no final do pregão. Como não vemos capacidade do governo de reagir e mudar o cenário, a perda do grau de investimento deve ocorrer na sequência — avalia Felipe Silva, analista da Saga Capital.

Em entrevista coletiva ontem para detalhar a economia de custeio da máquina pública, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, disse esperar que as medidas de reequilíbrio das contas contenham as agências.

— Esperamos que essas medidas de equilíbrio fiscal vão melhorar gradualmente a posição fiscal do Brasil. Trabalhamos e esperamos que ela seja suficiente para manter uma boa avaliação da nota de crédito do país — disse.

Como fator de pressão adicional, ocorre amanhã, último dia útil do mês, o fechamento do dólar Ptax, que é calculado pelo BC e que serve de referência para uma série de contratos dos mercados financeiros. Os dados da dívida pública também não agradaram.

— O cenário externo não está ajudando. E essa semana é de formação da Ptax — afirmou Hideaki Iha, operador de câmbio da Fair Corretora.

LUCRO DE CHINESAS RECUA 8,8%

Além das questões internas, os investidores estão preocupados com a desaceleração da economia da China, que pode prejudicar ainda mais a retomada da atividade global. O lucro das empresas chinesas recuou 8,8% em agosto, resultado bem abaixo do esperado. Com isso, as ações de empresas ligadas a commodities são as que mais sofreram ontem, levando para baixo os principais índices de ações globais.

Na Europa, o DAX, de Frankfurt, fechou em queda de 2,12% e o CAC 40, da Bolsa de Paris, teve desvalorização de 2,76%. O FTSE 100, de Londres, recuou 2,46%, com a forte queda de mineradoras. Nos EUA, o Dow Jones recuou 1,92% e o S& P 500, 2,57%.

No Brasil, os papéis preferenciais da Vale tiveram desvalorização de 7,37% e os ordinários caíram 7,47%. No caso da Petrobras, as preferenciais registraram desvalorização de 5,57%, cotadas a R$ 6,44, e as ordinárias caíram 5,07%, a R$ 7,67.

 

Focus piora projeções pela 11 ª vez e já espera queda de 1% no PIB de 2016

 

Mais recessão e inflação em 2015 e 2016 é o que esperam os analistas das principais instituições financeiras do país, ouvidos pelo Banco Central. A pesquisa semanal Focus divulgada ontem piorou, pela 11 ª vez seguida, a previsão de queda do Produto Interno Bruto ( PIB) este ano, de 2,7% para 2,8%. E o recuo esperado para 2016 passou de 0,8% para 1%. Já a estimativa para o IPCA em 2015 aumentou de 9,34% para 9,46% e, para o ano que vem, de 5,7% para 5,87%.

A taxa básica de juros ( Selic) prevista para 2015 ficou estável em 14,25% e subiu de 12,25% para 12,5% em 2016. Já a expectativa para o dólar neste ano passou de R$ 3,86 para R$ 3,95.

Para Silvio Campos Neto, da Consultoria Tendências, o pessimismo se deve a três fatores:

— O Brasil vive hoje uma crise fiscal, política e econômica. Difícil dar um peso maior para um ou para outro. Foram feitas escolhas econômicas que se mostraram equivocadas nos últimos anos. E o lado político impede que os ajustes fiscais sejam feitos da forma necessária.

Carlos Eduardo de Freitas, exdiretor do Banco Central, avalia que a situação só vai melhorar com medidas que contribuam para a geração de riqueza.

— São necessárias medidas que facilitem o investimento e a poupança. Não se fala mais na Agenda Brasil. O próprio pacote fiscal é composto, em 70%, por aumento de carga tributária. Se eu fosse empresário, pelo menos por enquanto, tiraria meu time de campo — afirmou Freitas.