Doação de empresa: oposição contra PEC

 

MARIA LIMA E ISABEL BRAGA 

O globo, n. 30003, 29//09/2015. País, p. 6

 

 Será muito difícil aprovar no Senado, até sexta- feira, a Proposta de Emenda Constitucional que autoriza as doações de empresas a partidos e candidatos. A aprovação da PEC é considerada a última alternativa para manter, nas eleições municipais de 2016, o financiamento das campanhas políticas nos moldes atuais. Mas, depois de o Supremo Tribunal Federal ( STF) considerar a doação de empresas inconstitucional, até partidos de oposição, que antes apoiavam a proposta, já indicam que mudaram de ideia.

ANDRÉ COELHO/ 26- 10- 2011Contra. Cássio Cunha Lima: “O PSDB não tem disposição de queimar etapas”

Sem querer pagar pelo desgaste político, PSDB e DEM vão se opor à tentativa do PMDB de aprovar um calendário especial para aprovar, em rito sumário, os dois turnos da PEC ainda esta semana.

— O PSDB não tem disposição de queimar etapas. O financiamento caiu com os surpreendentes votos do Eunício ( Oliveira) e do ( Romero) Jucá. Agora que o Supremo derrubou o financiamento empresarial sem instituir o financiamento público, e ficou um vazio, estão correndo atrás do prejuízo. Não vamos nos submeter a essas práticas do Senado — avisou o líder do PSDB, senador Cássio Cunha Lima ( PB).

MUDANÇA DE POSIÇÃO

Ele se referia ao fato de o líder do PMDB, Eunício Oliveira ( PMDB- CE), e do relator da reforma, Romero Jucá ( PMDBRR), terem mudado de posição em relação ao fim do financiamento privado. Os dois, que tinham votado pelo fim das doações no projeto de lei da reforma política, agora correm contra o tempo para aprovar a PEC.

É que a PEC também abre uma “janela” de um mês para que os parlamentares troquem livremente de partido. Eunício e Jucá adotaram o argumento de que, com a criação da Rede Sustentabilidade, partido de Marina Silva, não se poderia impedir a criação da janela para beneficiar outros partidos com o troca- troca partidário.

Mas os partidos que no início do mês votaram contra a legalização das doações de pessoa jurídica, durante o debate da reforma política — PT, PSB, PDT e PCdoB —, continuam contra a medida, o que complica a aprovação da PEC.

Líder do DEM, Ronaldo Caiado disse que na última reunião de líderes ficou claro que o Senado não votaria de jeito nenhum a PEC antes de sexta- feira. A avaliação unânime, segundo ele, é que o Senado sairia desgastado.

— Como o Jucá vai desdizer a linda entrevista que deu dizendo que ( a rejeição às doações de empresas) foi o momento mais importante para o Senado? — perguntou Caiado: — Agora, eles viram que Eduardo Paes vai ter que receber R$ 800 de pessoa física e cruzar todos os CPFs para ver se está dentro do permitido, de acordo com os rendimentos do doador no ano anterior. Isso não existe! Quem pariu Mateus que o embale, não vamos entrar nessa.

PROJETO SÓ TEVE 31 VOTOS

Na votação do projeto de lei no Senado, a manutenção do financiamento empresarial recebeu apenas 31 votos, e 36 senadores optaram pela derrubada das doações de empresas. Para aprovar a PEC que constitucionaliza a doação privada e pode obrigar o STF a rediscutir o tema, serão necessários 49 votos a favor. Eunício acha que, com a liberação do PMDB e com mais votos na base, a PEC pode ser aprovada.

— Acho que é possível aprovar a PEC com essa nova reflexão sobre a decisão do Supremo. Vou liberar a bancada, e o Jucá também quer. Ele sempre quis a PEC. Só apresentou aquela emenda na reforma política ordinária para esperar a decisão do Supremo — disse Eunício. — A emenda estava adormecida, e acho que, nesta terça- feira ( hoje), ela entra em ebulição. Sou contra mudanças de partido por convicção, mas não posso atrapalhar meu partido e os outros depois que o TSE começou a liberar a criação de novos partidos. Está abrindo janelas a cada dia.

Além dos 13 senadores petistas que votaram em bloco contra as doações de empresas, também votaram “não” os sete senadores do PSB, os seis do PDT, Vanessa Grazziotin ( PCdoBAM) e Randolfe Rodrigues ( Rede- AP). Além deles, Roberto Requião, do PMDB, também deve votar contra.

 

Se proposta for aprovada, debate no STF recomeça

 

CRISTINA TARDÁGUILA

 

Enquanto o Congresso se mobiliza para tentar votar ainda nesta semana a Proposta de Emenda Constitucional ( PEC) que devolve às empresas o direito de fazer doações de campanha, juristas vislumbram fortes embates e muita polêmica no horizonte das eleições de 2016.

Segundo ex- ministros do Tribunal Superior Eleitoral, é bem provável que o tema volte a ser analisado pelo Supremo Tribunal Federal, e que o debate parta do zero.

— Se a PEC passar, o Supremo deve receber uma nova Adin ( Ação Direta de Inconstitucionalidade). Se isso acontecer, será obrigado a avaliar tudo de novo. Será um processo novinho em folha — explica Ayres Britto, exministro do STF e do TSE. — Mas a matéria está madura na Corte. A composição do tribunal não mudou, e os ministros tiveram tempo de formar suas convicções.

Ayres Britto lembra que, se houver novo recurso ao STF, a legislação permite que qualquer ministro faça um pedido de vista, o que torna indefinido o prazo para a conclusão do processo.

— Não vai dar tempo de tomar uma decisão até sextafeira — afirma Gilson Dipp, ex- ministro do Superior Tribunal de Justiça ( STJ) e do TSE. — A PEC tem que ser votada e, se for aprovada, terá que ser publicada. Aí o Supremo recebe uma Adin, designa um relator e pede que o Ministério Público Federal se manifeste. Só depois o tema será levado a plenário e debatido. Mesmo que isso tudo seja feito às pressas, não dá tempo de valer para 2016.

Mas é justamente aí que nasce outro embate. Dipp destaca que, pela legislação vigente, todas as alterações no processo eleitoral devem ocorrer até um ano antes do pleito. No caso das eleições de 2016, o prazo expira na sextafeira. Mas Ayres Britto, assim como outros especialistas, acha que o prazo é maior. Ele lembra que as candidaturas só serão homologadas pelo TSE em meados de julho.

— Então vão ter que debater sobre isso também: mexer no financiamento de campanha é alterar o processo eleitoral? Para mim, não. O processo eleitoral diz respeito aos prazos das convenções, da apresentação das candidaturas, da homologação e assim por diante. Essa questão poderá ser decidida até julho do ano que vem.

Dipp vai no sentido contrário e critica o “preciosismo”:

— Se o financiamento não é importante para o processo eleitoral, o que é?

Os dois também discordam sobre qual regra de financiamento eleitoral acreditam que valerá em 2016.

— Se vier a nova PEC, ela reestabelecerá a lógica que valeu por anos no país. Então, pela segurança jurídica da eleição de 2016, acho que devemos ficar com a norma que muda menos o cenário eleitoral — defende Dipp.

— Quando a dúvida está entre depurar o processo eleitoral ou perpetuar esse cenário que funciona hoje em dia, eu fico com a depuração — disse Ayres Britto.