É preciso mais compromisso no acordo do clima

 

O globo, n. 30003, 29//09/2015. Opinião, p. 14

 

Arelutância nos últimos 20 anos de alguns países em se comprometerem com os esforços para conter o aquecimento global faz parecer que os atuais compromissos anunciados por potências e grandes emergentes, como o Brasil, soem como um avanço importante. É como se, enfim, esses governos se dessem conta dos efeitos devastadores do desequilíbrio ambiental. E, de fato, não é pouca coisa que, a poucos meses da reunião da ONU para o clima, nações como EUA e China, entre outros países e blocos, tenham apresentado propostas substanciais de corte de emissões de carbono, entre outras medidas desenhadas para evitar que a temperatura avance para patamares catastróficos.

Pressionado por segmentos republicanos, por décadas Washington resistiu a aceitar a tese do efeito estufa, agarrando- se a dados de pesquisas financiadas por lobbies de setores industriais, que apontam as mudanças climáticas como efeito de um ciclo natural do planeta. E, assim, mesmo quando, independentemente do debate acadêmico, a prudência sugeria a adoção de medidas de controle do aquecimento global, os EUA se abstiveram nos fóruns multilaterais em aceitar resoluções nesse sentido. Por outro lado, Pequim, que apostara num modelo industrial com alta incidência de emissões de CO2, também resistiu a rever sua matriz de desenvolvimento. Com isso, a China se tornou um dos principais emissores do planeta. As duas potências agora se comprometeram a reduzir suas emissões.

A proposta apresentada pelo Brasil neste fim de semana, em Assembleia da ONU, um dos primeiros emergentes a fazê- lo, mostra avanços, sobretudo no campo do combate ao desmatamento da Amazônia. Mas, segundo analistas, ela ainda é limitada, dado o potencial que o país possui no campo ambiental e a vocação para liderar a luta contra o aquecimento. O segmento energético é um exemplo, como lembrou ao GLOBO o coordenador de Clima e Energia do Greenpeace, Ricardo Baitelo, ao criticar o fato de que o Plano Decenal de Energia ainda prevê que 71% dos investimentos sejam feitos em combustíveis fósseis, e apenas 14% em fontes renováveis e biocombustíveis.

As medidas anunciadas pela comunidade internacional até agora são mais auspiciosas por mostrar que o assunto entrou de fato na agenda dos governos do que pelo impacto efetivo que terão. Embora elas representem o maior compromisso de redução de emissões já acertado até hoje, cientistas e especialistas alertam que estes esforços não serão suficientes para evitar que a temperatura da Terra avance além da meta de 2 º C em média neste século. Este é o nível considerado tolerável, embora ainda gere efeitos desastrosos para agricultura, nível do mar e o mundo natural.

É preciso, portanto, que as nações alcancem um compromisso ainda maior na conferência da ONU sobre o clima, em dezembro em Paris.